Segunda-feira, 8 de Outubro de 2001 -------Noticia em Jornal-------

Acordo diplomático pode ser revisto

Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados vai enviar ofício ao Ministério das Relações Exteriores para pedir que cobre explicações aos Estados Unidos sobre a atuação de agentes da CIA (serviço secreto americano) no Brasil, nos anos 70.

Segundo depoimento do ex-agente da CIA Robert Hayes ao Jornal do Brasil, colaboradores da agência americana praticavam seqüestros e assassinatos no país, durante o regime militar. Hayes, que era dono de uma empresa de engenharia em São Paulo, contou que eliminou militantes de esquerda e chegou a ser convidado por outro agente da CIA - John Hull -, em 1976, para promover um atentado a bomba em São Paulo e culpar comunistas. Um dos possíveis alvos era o consulado dos EUA; os outros eram um teatro e a catedral. Hayes admitiu ter operado para a CIA no Brasil e em outros países da América do Sul, de 1972 a 1976.

O ex-presidente e atual integrante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, deputado federal Marcos Rolim (PT-RS), afirmou ontem que as revelações mostram que o Brasil deve rever a possibilidade da implantação de um escritório do serviço secreto americano em território nacional.

Constrangimento - Para Rolim, se for comprovada a atuação de agentes da CIA no país, cria-se ''uma situação de grande constrangimento'' entre o Brasil e os EUA. ''Em um momento em que os Estados Unidos querem propor uma coalizão para combater o terrorismo, é constrangedora a acusação de que sua própria agência teria participado desse tipo de ação aqui'', disse.

De acordo com o deputado, a Comissão dos Direitos Humanos vai protocolar um ofício ao Ministério das Relações Exteriores para que cobre explicações oficiais junto ao governo americano sobre o assunto. Outra medida será cruzar dados com outras entidades na América Latina que estudam o problema de pessoas desaparecidas, durante os anos 70, período de regimes autoritários na região.

Na opinião do presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos de Porto Alegre (RS), Jair Krischke, ''não há dúvidas de que o depoimento de Robert Hayes é verdadeiro'', tendo em vista que os estudos da instituição em que trabalha confirmam a presença de agentes internacionais no país no período em questão.

Segundo Krischke, em suas viagens pelo continente, teve contato com famílias de pessoas que vieram para o Brasil nos anos 70 e desapareceram. Um dos casos é o de um chileno que veio trabalhar em uma firma de engenharia e sumiu pouco tempo depois. Krischke afirmou que o Brasil deveria pressionar os Estados Unidos a abrir o mais rapidamente possível os arquivos confidenciais relativos aos anos 70, para tentar esclarecer a atuação da agência no país.

Sem surpresa-Para deputados que atuaram como militantes de esquerda no Brasil, a informação de que agentes da CIA atuaram no Brasil durante a década de 70 não chegou a ser uma surpresa. Guerrilheiro na década de 70, José Genoíno (PT-SP) lembra que, na época, as ações desses americanos eram comentadas em encontros de militantes de esquerda que se opunham ao regime vigente. ''Eu não sei de nenhum fato concreto, mas essa forte ligação com o Brasil já era conhecida'', disse.

Genoíno defende a mobilização imediata do Congresso Nacional na tentativa de se descobrir mais detalhes sobre a influência da CIA no Brasil há 30 anos. Segundo ele, decisões diplomáticas tomadas recentemente precisam ser revistas. ''O país não pode escancarar suas portas como fez naquele período'', afirmou o petista, referindo-se à permissão dada pelo presidente Fernando Henrique para que os Estados Unidos abrissem um escritório da Inteligência Americana em São Paulo.

Quem também se recorda das conversa sobre a presença de agentes da CIA no Brasil é do ex-militante do PCB Nilmário Miranda (PT-MG). ''Não era visível, mas a gente sabia que existia''. Miranda conta que, além de vasculhar a vida de políticos e sindicalistas classificados de ''suspeitos'', ouvia falar que a agência americana tinha ligações com representações militares brasileiras. ''Falava-se em uma relação qualquer com o Serviço de Informação da Marinha'', recorda-se Nilmário Miranda.

Voltar - Verdades escondidas