A ADESG A SERVIÇO DO BRASIL

V. Alte (RRm) Sergio Tasso Vásquez de Aquino

         Este é, antes de tudo, um convite para todos os brasileiros que amam nosso país e estão dispostos a sacrificar-se, doar-se , lutar para que o Brasil continue dos brasileiros, senhor dos seus destinos, pátria livre dos livre irmãos, berço esplêndido das esperanças e porto seguro para todos os patriotas que a ele se dediquem com fé e amor. Unam-se conosco na ADESG !

         ADESG é a sigla da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, benemérita instituição que completará 50 anos de existência no próximo dia 7 de dezembro de 2001. Conforme reza o seu Estatuto, é uma sociedade civil, sem fins lucrativos, considerada legalmente de utilidade pública federal, havendo sido idealizada para congregar os diplomados da Escola Superior de Guerra - ESG, e também os formados pelos cursos regulares da própria ADESG, vinculados às respectivas Delegacias, em número de 27 e localizadas nas capitais de todas as unidades da Federação, mais 97 Representações em cidades importantes, um universo possível de 70.000 brasileiros.

         Tem por objetivo preservar e projetar os valores morais e espirituais da nacionalidade; incentivar, cada vez mais, a amizade e a solidariedade entre seus membros; difundir conceitos doutrinários e estudos conjunturais relacionados com a Segurança e o Desenvolvimento Nacionais, observados os métodos de trabalho e de pesquisas da ESG; desenvolver outras atividades de natureza cultural e educacional.

         A Doutrina da ESG configura um verdadeiro “Projeto Brasil”, autenticamente cristão, humanista, nacional, democrático. Sua Metodologia de Planejamento da Ação Política é uma ferramenta eficaz, eficiente, insubstituível para assegurar a grandeza da Nação brasileira e a felicidade do povo. A base de tudo é o ardor patriótico, a crença de que o talento e a dedicação dos brasileiros serão capazes de transformar o fabuloso potencial do Brasil - um dos países mais ricos e pujantes do mundo pela própria natureza e graças à bravura e ao valor dos nossos ancestrais - em poder para construir-se uma sociedade próspera e feliz, modelo e exemplo para o mundo, sem hegemonismos de qualquer espécie, devido à maneira de ser, ao coração aberto dos brasileiros.

         São 7.000 os diplomados pela ESG e cerca de 63.000 os egressos dos Ciclos de Estudos de Política e Estratégia da ADESG, em todo o Brasil, civis e militares, homens e mulheres, de todas as origens e atividades, que se beneficiaram dos ensinamentos esguianos e dos estudos e contatos com a realidade da Pátria, pois, como se afirma na ESG, “aqui se estuda o destino do Brasil”. Constituem a autêntica elite nacional, porque comprometida visceralmente com a conquista e a manutenção dos Objetivos Nacionais Brasileiros, os interesses e aspirações vitais da nossa gente, que se cristalizaram ao longo da História e nos caracterizam como brasileiros e patriotas, uma individualidade própria e profunda. Não são egoístas, nem desinteressados ou insensíveis; são moral e eticamente sadios, intelectualmente bem dotados; capazes de doar os talentos recebidos de Deus para a realização do Bem Comum, em proveito dos concidadãos mais fracos, pobres, desassistidos...

         Uma nova Diretoria Executiva assumiu o comando da ADESG em 14 de janeiro último. Tomou, como lema de sua chapa, “Segurança e Desenvolvimento”, confirmando o compromisso solene com a Pátria e com a Doutrina cinqüentenária, de salvação nacional, da Escola Superior de Guerra. Dele faço parte como 1º Vice-Presidente e Coordenador-Geral dos Trabalhos de Planejamento; aceitei esses encargos e participar de toda a labuta de preparação, desde o início e durante mais de oito meses, apenas porque senti que, assim teria ampliadas as oportunidades de lutar pelo Brasil e de difundir, com mais eficácia, o “toque de reunir” dos brasileiros de verdade em defesa da Pátria !

         Sintetizo assim o nosso pensamento: somos, na ADESG, um “tanque de pensamento”, com a tarefa de difundir e fazer aplicar a Doutrina da ESG; promover o patriotismo, a cidadania, os valores e tradições brasileiros, a moral, a ética e os bons costumes: defender a conquista e a manutenção dos objetivos nacionais. O grande problema é propagar, para o maior público possível - idealmente, toda a Nação - nossas crença e boas idéias, com fidelidade, já que não dispomos do apoio da mídia, nem de abundância de recursos. São opções visualizadas a elaboração de textos de orientação e apoio, para divulgação na imprensa “possível” no Rio de Janeiro; o envio dos mesmos textos, sistematicamente, para as Delegacias/Representações, para emprego em ciclos de estudos, ciclos reduzidos, seminários, palestras e divulgação pela imprensa local e nos contatos com a sociedade e as entidades públicas e privadas de suas áreas de atuação; a utilização de meios audio-visuais e computacionais para comunicação à distância. Devemos aderir ao emprego permanente dos princípios de ação - propagar o que é bom, justo, moral, sempre positivo - e de reação - combate ao erro, ao vício, à mentira, ao engodo, que se tornaram tônica da calamitosa situação nacional, onde quer que se encontrem, buscando sempre motivações e exemplos na realidade corrente.

         Pretendemos mobilizar todos os esguianos e adesguianos, para unir os dons em defesa da Pátria ameaçada, para catalisar a reação nacional contra a tragédia que se abate sobre o Brasil, vendido, traído, espoliado, junto com seu povo, nos últimos dez anos, a “década perversa” iniciada em 1990, pela fúria destruidora da onda neoliberal globalista, sem-pátria e sem entranhas, preocupada só com a usura e a dominação do mundo, cujos tentáculos demoníacos se estendem por toda a parte e que assumiu o poder entre nós, encastelando seguidores e agentes seus nos postos de mando e decisão. Queremos convidar todos os patriotas dignos desse nome , sejam o que forem e estejam onde estiverem, para cerrar fileiras conosco em torno do Brasil e dos compatriotas mais desvalidos, excluídos e abandonados, para devolver a Pátria ao seu radioso destino e assegurar a dignidade de filhos muito amados de Deus a cada um e a todos os brasileiros. Para tanto, para balizar nosso caminho, para colocar efetivamente a ADESG a serviço do Brasil e da Salvação Nacional, elaboramos um Plano Diretor, com 6 Programas e 38 Projetos, dos quais destaco os três seguintes, que mais têm a ver com a afirmação dos gloriosos destinos da Pátria brasileira, cuja caracterização só depende de nós, da nossa coragem, do nosso valor, da nossa disposição de servir, sem nada esperar em troca, a não ser a tranqüila satisfação do dever cumprido para com a amada terra que nos viu nascer e os concidadãos.

PROJETO “BRASIL SOBERANO"

         Gênese: O mundo pós-1989, a “Nova Ordem Mundial”, o “Movimento Capitalista Internacional” (5ª Internacional), a imposição neoliberal globalista, o congelamento do poder, o predomínio das finanças e dos centros financeiros, a soberania relativizada dos países periféricos e as ações contra as Forças Armadas; o egoísmo dos poderosos, a exploração dos países e povos fracos e pobres, a manipulação dos meios de comunicação.
         O Brasil pós-1990: a mentira como arma política, a destruição do Estado e o isolamento, a neutralização e o enfraquecimento das Forças Armadas (revanchismo e entreguismo); a subordinação às idéias político-econômicas forâneas, a abertura do mercado nacional, a alienação do patrimônio nacional ao estrangeiro (“privatização”); o predomínio do capital transnacional (FMI) e a crescente restrição consentida à soberania; o agravamento das condições sociais (educação, saúde, saneamento, previdência, emprego, habitação, segurança, salário); o desmantelamento da indústria e os prejuízos à agricultura; o crescimento da violência urbana e rural; a generalização da corrupção e da impunidade.
         A diminuição progressiva da participação da ADESG e da própria ESG como atores principais na vida nacional e o sensível arrefecimento do interesse pelos cursos da ESG e ciclos da ADESG, desde o fim do regime militar, e como conseqüência direta do revanchismo e das campanhas de difamação e descrédito desatadas contra as Forças Armadas, com o apoio governamental, inclusive.

         Objetivo:Conscientizar a sociedade nacional sobre as ameaças correntes à independência, à soberania e à integridade do patrimônio nacional e mobilizar a opinião pública contra os agravos a esses pilares básicos da nacionalidade.
         O efeito desejado é o da reversão do atual estado de submissão da política governamental a orientação provida do Exterior, num quadro de crescentes aceitação de limitações à soberania do Brasil, alienação, a preços degradados, de parcelas importantes do patrimônio nacional a centros externos de poder, pauperização do povo, exploração do trabalho dos mais humildes e mais fracos em proveito dos mais ricos e fortes, nacionais e estrangeiros, que têm sido características perversas da chamada “globalização”.

         Orientação Básica:Através dos Ciclos de Estudos, em sua fase conjuntural, por simpósios, seminários, palestras, suas publicações oficiais, aberturas que obtiver na imprensa, pronunciamentos públicos dos seus integrantes, contatos com entidades públicas e privadas de qualquer natureza, a ADESG realizará esforço permanente para catalisar a reação nacional contra o injusto e espoliador processo posto em marcha a partir do advento da “Nova Ordem Mundial”.
         O esforço deverá ser feito pelo Órgão Central, pelas Delegacias e Representações, procurando, inclusive, obter apoio e espaço nos órgãos de comunicação social, para alcançar o maior público possível - o ideal seria toda a Nação - já que o assunto tem a ver com a própria sobrevivência nacional brasileira.

PROJETO “ALMA BRASILEIRA”

         Gênese:A grave crise moral que se abate sobre a sociedade brasileira, na qual se generalizam, sem encontrar freios e limites, a violência, a corrupção e a impunidade. Os maus exemplos correntes de governantes, legisladores, juízes e tribunais, empresários, poderosos de todos os matizes e atividades, que não se pejam de fazer como se sua fosse a Coisa Pública, nem se importam com a triste sorte da maioria esmagadora da população.
         O emprego da mídia para corromper os valores da sociedade e os costumes, atingindo, principalmente, a família, a juventude e a infância, e para anestesiar a frágil opinião pública, com técnicas semelhantes às da psicologia soviética, da propaganda de Goebbels, de “1984”, de Orwell, com o “Big Brother” da televisão. O resultado tem sido o predomínio da versão muito difundida sobre o fato, da realidade virtual, mentirosa, sobre a verdade. O aliciamento de agentes influentes e a compra de consciências para impedir reações (dinheiro, cargos, funções, benesses, privilégios e a corrupção do dia-a-dia do “é dando que se recebe”); a insensibilidade dos formuladores das políticas governamentais perante os sofrimentos do povo (taxação, aumento dos custos de vida, congelamento salarial, flagelo do desemprego).

         Objetivo: Preservar os valores espirituais e morais da nacionalidade da desagregação provocada pela intensa ação dos meios de comunicação a serviço de interesses espúrios, antinacionais e atentatórios à própria dignidade do ser humano, e por modismos que contribuem para a acelerada decomposição de costumes, o esmagamento do espírito de cidadania consciente e de patriotismo.
         O efeito desejado é o de restabelecer a moral e o moral nacionais, para aperfeiçoar o convívio social, estimular o altruísmo e o patriotismo, de acordo com os lineamentos fundamentais da nossa herança nacional, de tal sorte a desenvolver a cidadania consciente, dedicada à defesa da Pátria e a seu serviço e dos concidadãos mais desassistidos, em ambiente ética e moralmente sadio.

         Orientação Básica:Utilizar todos os recursos institucionais da ADESG, e todas as oportunidades de ação, inclusive informais, para denunciar e combater o vício e promover a virtude.
         Exercer esforço principal sobre a juventude e a infância, a família e as escolas. Disseminar a hábito do respeito necessário ao semelhante, e seus direitos, e ao ambiente (começando pela higiene pessoal e coletiva). Estimular o amor à responsabilidade e ao cumprimento dos deveres, as práticas associativa, cooperativa e comunitária, de modo a desenvolver a cidadania consciente, com ativa participação política, inclusive para cobrar, sempre, trabalho, dignidade, honradez, seriedade, espírito público dos governantes e representantes eleitos.

PROJETO “FIDELIDADE À DOUTRINA”

          Gênese: Os descaminhos, as distorções e as limitações das duas “soluções” comumente apresentadas para os problemas político-econômico-sociais e, até mesmo, militares: o neoliberalismo globalista e o socialismo marxista, e a necessidade de devolver a Nação brasileira aos rumos do seu grandioso destino, com um Projeto autenticamente nacional a orientar a ação governamental e a vida em sociedade. Doutrina da ESG configura verdadeiro “Projeto Brasil”, e sua Metodologia de Planejamento representa inestimável instrumento para a busca da afirmação nacional e da realização do Bem Comum, com respeito aos Objetivos Nacionais Permanentes, à dignidade intrínseca do ser humano, "feito à imagem e semelhança de Deus”, em ambiente em que se harmonizem Segurança e Desenvolvimento.

          Objetivo: Difundir amplamente na sociedade, motivando-a a utilizar-se dela, a Doutrina de Ação Política da ESG, como instrumento eficaz para promover o Bem Comum, em ambiente propício ao Desenvolvimento nacional com Segurança.

          Orientação Básica: Lançar mão de todas as oportunidades propiciadas pelo Sistema ADESG - ciclos de estudos, seminários, palestras, solenidades, publicações, contactos formais e informais com entidades públicas e privadas, pessoas influentes, escolas, órgãos de classe - para apresentar, tornar conhecida e difundir a Doutrina da ESG.
         Buscar espaço nos meios de comunicação social com idênticas finalidades. Elaborar textos pedagógicos, de fácil entendimento, absolutamente fiéis à Doutrina, para ampla disseminação.
         Aproveitar quaisquer pronunciamentos e textos para falar da Doutrina e promover seus valores e características marcantes, e do papel fundamental que lhe foi antevisto pelos pioneiros da ESG, e lhe está, de fato, reservado na afirmação soberana da Pátria brasileira e na construção da felicidade do seu povo.


REPRESENTAÇÃO

João Fares Netto

         Jean Jacques Russeau dizia que democracia, somente a direta, porém Montesquieu, analisando os tempos modernos, com estados de enormes dimensões e grandes populações, garantia que a democracia representativa também é válida, pois o povo, embora não entenda dos problemas de Estado, sabe escolher aqueles que melhor entendem para representá-lo. Assim, seguindo as idéias de Montesquieu, a totalidade das democracias no mundo atual aceitam esse postulado.

         Representativa, esta é a chave da questão. A Constituição Brasileira de 1988, em seu artigo 45, diz que: "A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo,..". 0 Dicionário Aurélio, quanto ao seu verbete "representativo", diz: "A democracia pressupõe um congresso verdadeiramente representativo". Como vemos, devemos pressupor um Congresso verdadeiramente representativo.

         0 Estado é a nação politicamente organizada, logo o Congresso, sendo uma parte do Estado, justo aquela que representa toda a nação, pois lá estão representantes de todas as regiões, e onde serão feitas todas as diretrizes que passarão a ser obedecidas pelos demais poderes, tem que ser aquele que mais esteja afinado com o conceito de representação. Este conceito implica numa estreita ligação entre o eleito e o eleitor, onde o eleitor é o primário no processo, sendo o eleito aquele que tem por obrigação prestar contas diuturnamente de seus atos àqueles que o elegeram, pois se não bastassem todos os valores ou conceitos politicos para justificar essa postura, mais vale a realidade de que é o eleitor quem paga seus salários. 0 Congresso tem de ser por natureza o espelho da nação, pois lá estão os representantes de todas as regiões.

         Segundo Rui Barbosa, aos eleitores cabe o direito de "tomar contas aos seus mandatários" e a estes o "dever de as prestarem" ou ainda de "responder ao mandante (eleitor), pela maneira como cumprir o mandato" ou "à nação pelo modo como exercem as funções legislativas".

         Quando o comportamento do Congresso deixa de espelhar a realidade da nação, alguma coisa está errada no processo democrático desse Estado. A representação deixou de existir, sendo que invariavelmente, nesses casos, os representantes, ao se investirem em suas funções, assumem a atitude dos antigos reis, que se diziam representantes de Deus, julgando-se dotados de poderes absolutos. Passam a agir mais na defesa dos seus interesses do que daqueles para os quais são pagos. Corre-se a risco da nação ter de viver uma ditadura dos agentes do Estado.

         O Congresso não pode se subjugar ao interesse de grupos minoritários, muitas das vezes defendendo direitos escusos. Esses grupos normalmente contam com forte poder de pressão, embora representem apenas minorias. Sujeitando-se o Congresso a essas minorias, deixa de atender às maiorias, ficando descaracterizado o maior valor da democracia, que é o respeito pela vontade das maiorias. A saúde democrática está intimamente ligada à qualidade da representação, quando ela é de boa qualidade os grupos minoritários perderão seu poder de pressão, passando a valer realmente a vontade das maiorias.

         Não confundir grupos minoritários, aqueles que só visam tirar proveitos materiais e pessoais, com minorias, sejam elas religiosas, raciais ou outras, que buscam espaço politico e têm seus direitos garantidos na Constituição.

         Invariavelmente a solução dessas situações está na mecânica das eleições, que não proporcionam à nação um sistema tal que permita um vínculo estreito entre o eleito e o eleitor. A correção dessa situação é muito dificil, pois só pode ser feita através dos "representantes" do povo, e será que é do seu interesse? Caso os "representantes" quisessem, poderiam fazer qualquer alteração para aperfeiçoar o sistema, porém caso não queiram tudo fazem para bloquear qualquer tentativa de mudança.

         Analisando os sistemas eleitorais usados em diversas nações democráticas pelo mundo, vemos que existem muitos deles, sendo alguns até exóticos, porém alguma coisa é comum à maioria deles, é o voto majoritário ou o voto distrital. Cada um desses sistemas vai acarretar um tipo de representação, e terá profundas consequencias no comportamento e no funcionamento do Congresso. Falaremos sobre esses dois sistemas de eleição, suas vantagens e desvantagens, em uma próxima oportunidade.


EM DEFESA DA ESG, PELO BRASIL!

VAlte(RRm) Sergio Tasso Vásquez de Aquino.

         Os brasileiros que fundaram a Escola Superior de Guerra -ESG, há quase 51 anos, eram patriotas que amavam o Brasil e acreditavam nos nossos talentos para levar o idolatrado País aos destinos de felicidade e grandeza compatíveis com suas incomparáveis riquezas e extensão continental, heranças dos bravos ancestrais que tudo nos legaram com sua luta, seu sangue, seu sacrifício e seu trabalho honrado. Eram militares que haviam combatido na segunda Guerra Mundial, em defesa da democracia e dos mais altos valores e destinação do ser humano, "feito à imagem e semelhança de Deus", a que logo se somaram civis impulsionados e iluminados pelas mesmas crenças e convicções.

         Fundaram a Escola de Altos Estudos modelar - ali "se estudam os destinos do Brasil" -, com a intenção de preparar, por todas as gerações, uma elite consciente, comprometida com a Pátria, capaz de engajar-se sem tréguas na conquista e manutenção dos Objetivos Nacionais. O propósito era e é de transformar o formidável potencial da Nação em poder, para assegurar bem-estar e felicidade ao povo, e garantia do respeito à busca da realização dos seus destinos em paz, num mundo marcado de disputas, conflitos e guerras. Desenvolvimento e Segurança, pois, transformados em pilares básicos e orientadores de rumos da notável Doutrina de salvação nacional elaborada e aperfeiçoada pela ESG desde o nascedouro, em 1949, até os dias atuais e sempre.

         Em ambiente de efetivo e permanente congraçamento entre militares e civis, estes provindos de todas as origens, atividades, longitudes e latitudes do Brasil, homens e mulheres, que dela faz instituição única na realidade nacional, vem a ESG contribuindo decisivamente para o desenvolvimento do pensamento político-estratégico brasileiro, em absoluta sintonia com os lídimos valores, aspirações, heranças, tradições, costumes e alma nacionais.

         Tudo isso estatuído na admirável Doutrina de Ação Política por ela criada, original, cristã, humanista, democrática, brasileira, que a todos que a conhecem encanta - já que configura o autêntico, verdadeiro, e tão necessário e reclamado "Projeto Brasil"- e tem servido de modelo e guia para todas as Escolas congêneres do continente, que a adaptaram às suas realidades nacionais.

         Agora, essa Escola, "celula-mater" do pensamento e da formulação político-estratégicos brasileiros, berço da Doutrina de Ação Política exemplar e imprescindível para a realização do projeto inexorável, se os brasileiros tivermos caráter, disposição e vergonha, do "Brasil Potência, pois que "gigante pela própria natureza", na qual se insere a Metodologia de Planejamento necessária e suficiente, instrumento eficaz e eficiente, ferramenta adequada para o atingimento dos objetivos colimados, está sob ataque e ameaçada.

         O mesmo ataque e as mesmas ameaças que amesquinharam a expressão das Forças Armadas e neutralizaram sua participação na vida nacional, como verdadeiro Poder Moderador na República, e vêm limitando a soberania do Brasil, a sua capacidade de autodeterminar-se, ser senhor dos seus destinos, nos últimos anos, a década perversa...

         O mesmo ataque e as mesmas ameaças responsáveis pela esdrúxula criação do Ministério da Defesa, corpo estranho na Estrutura Militar Brasileira, que nada acrescentou de positivo e muito trouxe de negativo para a operacionalidade das Forças e a própria vida nacional; pelas campanhas de agravo, calúnias, revanchismo, achincalhe aos militares; pelas correntes e opiniões pela gendarmerização das Forças Armadas, cujos porta-vozes advogam que venham a ser empregadas no combate ao tráfico de drogas, ao contrabando, ao crime comum, retirando-as da sua precípua destinação constitucional e histórica de defesa da Pátria contra as ameaças externas e internas à sua sobrevivência independente, soberana, íntegra no patrimônio nacional, conquistado com bravura e determinação ao longo já de cinco séculos!

         As dificuldades financeiras e as restrições orçamentárias impostas `as Forças, o estrangulamento salarial que amarga as fileiras e desincentiva vocações entre a melhor juventude, o desmantelamento da indústria nacional de material bélico e o fechamento dos projetos militares dissuasores, de tecnologia de ponta, tudo isso é de propósito. Obedece a comandos vindos do Exterior, executados fielmente por delegados, áulicos e agentes que assumiram o poder e o governo há um decênio, na onda neoliberal globalizante engajada no complô para manter congelado o poder mundial, ricos e fortes para sempre os de agora, enquanto os demais, entre eles o Brasil e os brasileiros, condenados à estagnação, ao atraso, à miséria, a papel caudatário e subserviente na arena internacional.

         Daí a grande obra de destruição que varre o País, a demolição de tudo o que é bom e positivo, valores, tradições, costumes, instituições e pessoas .O ataque à ESG, para torná-la mera Escola de Defesa Nacional, de alcance e atuação muito mais restritos e limitados, é para castrar o espírito estratégico nacional, restringir o pensamento político centralizado no fortalecimento do Poder Nacional para garantir a conquista e a manutenção dos Objetivos Nacionais, desabituar a elite brasileira a pensar grande e a pensar Brasil!

         Querem fazer de nós parvos repetidores de conceitos elaborados alhures, em proveito de interesses que não são os nossos. E manter-nos abúlicos, anestesiados, inertes, indefesos, manipulados pela mensagem diuturna e deletéria da mídia vendida e castradora da cultura, da inteligência; promotora da violência, da pornografia, dos maus costumes, da alienação, do nihilismo, da perversão... Prossegue, pois, a robotização da opinião pública, o emprego maciço da mentira como arma política, com o propósito de neutralizar resistências, para mais dominar e espoliar o Brasil!

         Temos de defender a ESG, todo o seu patrimônio na íntegra. Não aceitar, por amor ao Brasil, as mudanças que nos querem enfiar pela garganta, para acostumar-nos a pensar pequeno, como querem que pensemos, e não como o País tanto, e cada vez mais, precisa!

         Para nós, patriotas, defender a ESG é defender o Brasil! E defender também toda a América Latina, tão ameaçada quanto nós e cujo pensamento estratégico nela buscou inspiração. É tarefa para brasileiros de verdade, sem medo e sem mácula, só comprometidos com a Pátria, os concidadãos e seu radioso futuro! Quantos somos, os ainda não abatidos pelo medo, pela indiferença, pelo comodismo, pelo aliciamento das benesses do poder?

         Quem se habilita, agora e sempre, ao "bom combate" pela Pátria e pela gente brasileira, em nome de Deus?

Rio de Janeiro, 01 de junho de 2000.


E A ELITE ESGUIANA, ONDE ESTÁ?

Gen. Div. Eduardo Domingues

         A ESG, desde sua fundação, esmerou-se em preparar os elementos que frequentavam seus Cursos para o desempenho de funções nas áreas de planejamento do Desenvolvimento e da Segurança Nacionais.

         Assim foram matriculados no Curso Superior de Guerra os elementos mais representativos da sociedade brasileira e militares da maior expressão das Forças Armadas. Formavam, então, uma Elite, que poderíamos chamar Elite Esguiana.

         Estes elementos foram diplomados, ostentaram com entusiasmo o galardão de seus diplomas, associaram-se à ADESG para não perderem o vínculo de amizade que os unia a todos, e poderem, assim, acompanhar a atualização da doutrina que lhes havia sido ministrada.

         Mas esse entusiasmo não durou todo o tempo. Com o passar dos anos, a aposentadoria vindo com a idade que também crescia, esse entusiasmo foi decrescendo, ajudado pelo comodismo que a nova situação provocava. Abandonaram as Reuniões de Turma, deixaram de comparecer à ADESG.

         E aquela Elite Esguiana foi esmorecendo, desarticulando-se, e hoje dela resta muito pouco. Apenas o eco surdo da voz ativa que tiveram um dia, e que praticamente desapareceu. Exatamente agora que a situação do país está a exigir essa ação, ela se cala.

         É hora, pois, de renovarmos nossas forças, nos unirmos como antes, nos congregarmos na ADESG, para lutar pela preservação das tradições da ESG, que relembram um pouco de nossa vida e de nossa História.

         Não nos esqueçamos de nosso lema: "Cor unum et anima una pro Brasilia." Todos unidos, de corpo e alma, pelo Brasil!!


NOVA ORDEM MUNDIAL - GLOBALIZAÇÃO

Gen.Bda. Gualter Veras Junior

I - INTRODUÇÃO

         Em verdade, nos últimos anos, o cenário mundial mudou de maneira radical e com rapidez nunca vista. Estas transformações vêm acontecendo de forma tão profunda e rápida, que a maioria das nações, em particular as em desenvolvimento e as subdesenvolvidas, estão perplexas e de certa forma desorientadas quanto ao momento adequado e tipos de ações políticas e estratégicas, que deverão adotar na defesa de seus legítimos interesses, a fim de garantir a sua soberania e a proteção do seus patrimônios nacionais.

         Dentro deste quadro de transformações citamos: a queda do "muro de Berlim" e com ele toda a importância política, social, econômica do "império" soviético; o reaparecimento do processo de "balcanização", através da fragmentação da URSS, dando origem a guerras como a da antiga Iugoslávia, fazendo reaparecer nações julgadas, definitivamente, desaparecidas e estudadas como temas de história ( Bósnia, Servia, Eslováquia e etc ); a reunificação da Alemanha; o reaparecimento do nazismo; o descrédito da teoria econômica marxista; o ressurgimento do neoliberalismo e do neocapitalismo; o reaparecimento do nacionalismo, de maneira universal, sendo que em alguns países aflorando de maneira violenta, em outros manifestando-se de forma velada, usando processos sub-reptícios sob a forma de proteções alfandegárias, ou revelando-se de maneira clara, através da colocação de entraves à imigração, ou, ainda, dificultando a concessão de "vistos de entrada" em passaporte de turista; a guerra do golfo; o fanatismo religioso; a crise e as transformações econômicas do mundo; o distanciamento tecnológico, cada vez maior, dos países desenvolvidos dos subdesenvolvidos e/ou em desenvolvimento; a existência de uma única superpotência militar: o EUA; o processo de unificação econômica da Europa; o fortalecimento econômico e militar, progressivo, silencioso e contínuo, do bloco asiático liderado pelo Japão; os indícios do aparecimento de dificuldades econômicas, bem como do surgimento de fatores que poderão propiciar o início de um processo de disfunção socioeconomica dos Estados Unidos; a crescente importância estratégica da China, Brasil e Índia; o surgimento do processo de globalização em contraposição ao de regionalização, sem que este tenha desaparecido; a existência de conflitos regionais; a existência da pobreza, miséria e fome, em alto grau, em várias regiões periféricas; o processamento e difusão, quase instantânea, das informações e fatos e etc.

         Este é o cenário em que se processa o relacionamento internacional atual. Em função de tudo que foi citado acima e dos interesses em jogo, algumas falácias têm sido apregoadas por personalidades e instituições, notadamente dos países do hemisfério norte, as quais são proclamadas e aclamadas por indivíduos, organizações e parte da imprensa dos países do chamado "Terceiro Mundo", após uma análise em que nem todas as variáveis e condicionantes, normalmente, são apreciadas ou pelo menos conhecidas, dando origem ao ressurgimento de uma antiga forma de dominação, bem ao estilo de Mão Tse Tung, o domínio pelo controle da mente, da aculturação, em substituição ao domínio pela força.

II. APRECIAÇÃO

1 - Considerações Preliminares

         Muito se tem falado e escrito sobre uma "Nova Ordem" internacional, em evolução, mais comumente chamada de "Globalização". Em realidade reina muita controvérsia e confusão sobre o assunto. 0 afrouxamento dos laços de controle sobre os atores da cena internacional, produzido pelo desaparecimento momentâneo da possibilidade de confronto militar entre o Leste e o Oeste, vem propiciando a produção de um enganoso cenário de paz e de uma aparente justiça socioeconômica nas relações internacionais. Porém há que se perceber, que o confronto leste-oeste foi substituído pelos choques decorrentes do confronto dos objetivos nacionais dos estados-nação interagentes na cena internacional, agravados e permeados pela necessidade de preservação dos interesses do capital internacional e/ou transnacional. Este quadro produz algumas dúvidas. Será que existe uma nova ordem mundial? Se concluirmos por uma resposta positiva, qual seria a sua arquitetura? Unipolar, bipolar, tripolar? No caso de concluirmos por uma resposta negativa, seria o mesmo um relacionamento multifacetado e sem uma polaridade perfeitamente definida?

         Na verdade se observarmos, somente, o aspecto político-militar estamos passando de uma fase bipolar para unipolar, porém se o campo de análise abarcar todas as expressoes do poder nacional dos diversos atores do cenário internacional, poderemos concluir que estamos no bojo de um processo de mudança para uma fase multipolar.

         Podemos verificar, no início do século, onde encontramos as raízes da doutrina trilateralista e ao longo de toda a história da humanidade, a influência importante que o aspecto econômico representa na competição pela conquista e manutenção da hegemonia do poder mundial. Dessa forma os demais fatores foram, e são, influenciados pelo aspecto econômico na consecução da conquista e manutenção do poder mundial. No cenário mundial atual constatamos que a associação do aspecto econômico com o científico-tecnológico marca todas as ações estratégicas dos países interagentes no cenário mundial. Sabemos que a contenda Leste-Oeste foi em sua essência uma guerra vencida pela aplicação de uma estratégia indireta, eminentemente econômica, associada a uma acirrada disputa científica e tecnológica. A corrida armamentista; as intervenções políticas, subversivas e militares; a corrida tecnológica (conquista do espaço e guerra nas estrelas), entre outros aspectos., representaram vários papéis - dissuasão, pressão, desgaste e etc. - mas, fundamentalmente, foram instrumentos eficazes de um guerra econômica, cuja finalidade principal era acelerar o desgaste e a derrocada da desequilibrada, desorganizada e frágil economia soviética e o conseqüente desmoronamento do seu regime político.

         0 processo evolutivo da conjuntura mundial, não é tão simples, de tal forma que possamos equacioná-lo utilizando-se os arquétipos de comportamento que algumas teorias políticas, pelo menos as mais utilizadas no momento, usam para explicá-lo.

         Algumas condicionantes, freqüentemente, têm sido omitidas nos estudos que vêm sendo realizados a respeito da construção, em andamento, de uma nova ordem mundial. As mais importantes, a nosso ver, são:
- as nações têm a sua base comportamental determinada pelo seu povo e como tal, não se pode esquecer o seu processo de evolução hístórico-cultural, bem como as demais características psicossociaís e políticas do mesmo;
- que é através da conjugação dos aspectos citados, anteriormente, que é formada a identidade e interesses de cada país e, em conseqüência, a definição de grande parte do seu comportamento no cenário mundial.

         Barry Buzan, em New Pattems of Global Security in Twenty First Century, nas Leituras Selecionadas do Colégio Interamericano de Defesa, em novembro de 1991, desconsiderou os aspectos acima citados ao divulgar o novo sistema mundial com um núcleo central e países periféricos - instrumentos da vontade e dos interesses dos países desse núcleo. Este núcleo multipolar é constituído pelos EUA, Japão e Europa Ocidental (países mais ricos) e as demais nações pertencentes ao G-7. A periferia é composta pelos países em desenvolvimento, pertencentes ao "limbo periférico", e os subdesenvolvidos formando o grupo dos periféricos.

         Ficou patente, ainda, que três são as condições para que o modelo possa funcionar, de acordo com que foi planejado:

- interdependência internacional;
- cooperação internacional;
- manutenção do status quo da divisão do trabalho mundial.

         Buzan em sua visão sistêmica, procura fazer crer que é o sistema quem estabelece o conjunto de regras e práticas que são necessárias e suficientes para regular o jogo político-econômico, no espaço internacional. Esqueceu-se, ou melhor, omitiu, duas constatações fundamentais:

a) que as regras estabelecidas podem ser quebradas;
b) quem estabelece as mesmas não é o sistema em si, mas os seus componentes hegemônicos.

         Raymond Aron afirma: "são os atores (estados) que estabelecem, como também podem mudar, as regras que regulam o sistema. A configuração do mesmo pode permitir maior ou menor facilidade para transgredir essas regras ou mesmo mudá-las, entretanto essa margem de manobra é sempre maior para os atores (estados) dotados de maior poder." Ordem Internacional, Interdependência Assímetria e Recursos do Poder - Luciano Martins - Fórum Internacional, 1992.

         0 que em realidade existe na cena internacional é a disputa, em maior ou menor grau, pela conquista e manutenção da capacidade da aplicação do poder mundial, por cada país que tenha poder nacional para tal.

         De volta ao modelo proposto por Buzan, que nos parece estar sendo praticado, constatamos que o crescimento econômico do Japão, associado aos NICs ( New Industrialized Couritries, ) e os da Europa Ocidental, liderado pela Alemanha, agora reunificada, pode, e já está produzindo uma certa turbulência no funcionamento do modelo, pois está em curso um processo de competição e concorrência, dentro do núcleo central, bem como na periferia, dando origem ao aparecimento de um núcleo multipolar. Assim em função do pluralismo desses contatos competitivos e da distribuição geográficas das potências pertencentes ao núcleo central, por todas as regiões do Globo Terrestre, estas podem projetar sobre as regiões da periferia os seus próprios conflitos, a exemplo da Guerra Fria e mais recentemente da Guerra do Golfo, o que pode propiciar, pela dificuldade de controle das ações dos atores, o surgimento de conflitos regionais com o aumento da influência das potências regionais, ( limbo periférico ) que seriam: China Comunista, Brasil e Índia. De acordo com o pensamento de Buzan, isto poderia provocar o aparecimento de crises regionais que, dependendo da área geoestratégica e dos interesses internacionais em jogo, poderiam colocar em risco a "nova ordem internacional", bem como a segurança e os interesses dos países hegemônicos.

         Por outro lado, o equilíbrio de poder dentro do núcleo central é bastante instável, em função da forte competição política, econômica e tecnológica, bem como pelo freqüente choque de interesses, que podem e serão assegurados, sempre que for necessário e conveniente, até pela força. Como exemplo podemos citar alguns objetivos estratégicos das forças armadas americanas para a década de 90, retirado do National Militray Strategy - 1992 - documento do Departamento de Defesa do governo dos EUA:

a) assegurar o crescimento sadio da economia americana para garantir as oportunidades necessárias a existência da prosperidade individual e os recursos necessários ao poder nacional, no país e no exterior. Para isso devemos garantir o acesso aos mercados estrangeiros, às fontes energéticas, aos recursos minerais, aos oceanos e ao espaço;
b) a "nova ordem internacional" deverá ser caracterizada pelo consenso de que a força não deve ser usada para resolver crises e quando o consenso for quebrado, as obrigações e responsabilidades deverão ser partilhadas por muitas nações. Devemos, entretanto, manter a capacidade de operar independentemente, quando os nossos interesses assim o exigirem;
c) nós nos engajamos no processo de controle de armas, não como um fim, mas como um meio de aumentar a nossa segurança nacional;
d) a capacidade de responder às crises, dá-nos a possibilidade de projetar poder e usar a nossa força militar, decisivamente, quando e onde a nossa liderança nacional determinar que isto seja necessário.

         Do documento Budget of the United States Government, Fiscal Year 1998 tiramos os seguintes dados, com relação ao orçamento das suas Forças Armadas:

National Defense - (In millions of dollars)

 

Function 050

1996

1997

1998

1999

Real

Estimado

Recursos Orçamentários

265.007

263.072

265.974

269.834

         Os objetivos estratégicos estabelecidos para as forças armadas americanas, para a década de 90, suscitam-nos algumas indagações importantes:

a) em que situações os EUA pensam empregar as suas forças armadas para garantir o acesso aos mercados estrangeiros, às fontes energéticas, aos recursos minerais, aos oceanos e ao espaço?
b) já que admitem o uso da força para conseguir tal desiderato, o que nos parece uma ameaça tácita aos demais países, porque não devemos ter a capacidade de defesa adequada para fazer frente a tal posicionamento, caso venhamos a sofrer qualquer tipo de pressão ou mesmo agressão?
c) dentro deste quadro qual o significado para os EUA das expressões: acesso aos mercados estrangeiros, aos recursos minerais e fontes energéticas?
d) qual o valor, para os EUA, dos tratados econômicos vigentes, dos tratados de paz da ONU, OEA e Corte de Haia, das leis do livre mercado e etc?
e) por que a previsão do uso da força para resolver problemas puramente econômicos, quando existem em vigor vários mecanismos e organismos internacionais, em pleno funcionamento, destinados a resolver qualquer contencioso de maneira pacífica?

         É óbvio que estes objetivos estratégicos respondem aos interesses e ONP da nação americana e, evidentemente, estão contidos no bojo da atual postura estratégica dos EUA que é a de buscar, obter e manter a hegemonia do poder mundial.

         Controlar o comércio de armas dos demais países, quando o orçamento das suas forças armadas corresponde à 3,8% do seu PNB ( US$ 272,2 bilhões - 1995 - CIA), como meio de garantir a sua segurança, embora às custas da insegurança dos outros, é uma atitude pragmática dos EUA para manter a sua soberania e os seus interesses, mas também é uma ameaça e uma forma de pressão insuportável, já que é negado aos demais países a capacidade de defesa adequada dos seus interesses e dos seus ONP - Objetivos Nacionais Permanentes: soberania e autodeterminação.

         Outro aspecto que é freqüentemente olvidado, nos diversos estudos ou teorias a respeito das "novas" regras do relacionamento internacional, bem como dos seus reflexos sobre os diversos campos do poder nacional de cada país, no cenário mundial atual, é a influência e o poder de intervenção representado pelo capital internacional, ou transnacional, que não raras vezes sobrepõe-se aos interesses dos estados-nação, condicionando e direcionando as ações dos atores da cena internacional, nos campos interno e externo.

         A grande maioria das análises atuais, sobre a atuação dos centros-de-poder mundial, dedica-se a estudar, ou condiciona o seu raciocínio, às vantagens e desvantagens da concentração ou dispersão do poder internacional, outras, entretanto, direcionam os seus estudos para o relacionamento existente entre os atores internacionais. Vale ressaltar que, em qualquer situação, todo o relacionamento Internacional está marcado pela existência de ações de cooperação e conflito.

         A cooperação internacional é um dos vocábulos usados, freqüentemente, pelos adeptos da Globalização das relações internacionais e como vimos, anteriormente, é um dos pressupostos básicos ao bom funcionamento do sistema núcleo-periferia.

         O que podemos entender por ações de cooperação internacional? Elas podem ser de dois tipos: cooperação real e a cooperação aparente. A primeira existe quando os interesses de dois ou mais países coincidem, havendo, assim, a adesão voluntária e sem constrangimento. A última representa, na maioria dos casos, a aplicação de estratégias índiretas para vencer as resistências aos interesses conflitantes, de toda ordem, existentes entre as nações que se relacionam, como veremos posteriormente.

         Podemos afirmar que dos três tipos de ações - cooperação real, cooperação aparente e de conflito - as duas últimas são as mais freqüentes e de alguma forma tendem a gerar algum tipo de concorrência, competição e/ou choque. Dessa forma falar em um mundo cooperativo, sem restrições, dentro de uma "nova ordem internacional" , sem considerar a existência real de relações do tipo das que, normalmente, geram crises e conflitos, nas suas diversas formas e gradações, como o fazem os pensadores trilaterafistas, os neoliberais e outros, é uma omissão proposital ou o desconhecimento da realidade, sendo que esta última hipótese não nos parece aceitável, particularmente se considerarmos o nível intelectual e de informação dessas pessoas. Se tal ação for praticada por nacionais de um país, com responsabilidade na formação da opinião pública, é, no mínimo, um comportamento danoso aos interesses e objetivos da sua nação. É o que estamos assistindo nos países periféricos e, em particular, no Brasil, no presente momento.

         0 relacionamento internacional, entre estados-nação, permeado e "potencializado" pelos interesses do capital transnacional, faz o problema da paz ou da guerra, da pobreza, miséria e da prosperidade, depender, principalmente, do tipo de relações estabelecidas por aqueles estados dotados de poder nacional suficiente para fazer prevalecer as suas decisões, ou para provocar conflitos armados, a fim de proteger os seus interesses, sob os mais variados disfarces.

2. Espaço Internacional Atual

         Para continuarmos a nossa análise, vamos identificar, com mais precisão, o espaço internacional do sistema de relações, que, no momento, está sendo praticado. A visão de Stanley Hoffman parece ser a mais adequada para a conjuntura atual. Segundo esse estudo há duas realidades diferentes, porém intimamente relacionadas:

a) as relações entre estados nacionais;
b) as relações transnacionais.

         A primeira tem como escopo a preservação da existência, da segurança e dos objetivos nacionais de cada estado; a segunda tem ( ou deveria ter ) por propósito o atendimento das necessidades comuns da humanidade, sendo estas objeto de discussão na medida em que essas necessidades se impõem por si mesmas, pelo seu valor global ou consensual, ou são definidas ( impostas ) pelos estados dominantes.

         Na prática é isso o que encontramos na conjuntural mundial atual - ONU, OEA, OTAN; FMI; Clube de Paris, G-7, Banco Mundial e etc. - definindo duas realidades: a relacionada com os estados-nação e a segunda, realidade das relações transnacionais, que de alguma forma os estados dominantes tentam sobrepor à primeira, deixando em aberto, e até mesmo argüindo a validade de questões básicas e fundamentais para a sobrevivência dos povos, como: soberania, direito e dever de ingerência; identidade nacional; sobrevivência política; subjugação econômica, cultural e etc.

         Esse enfoque transnacional é apresentado aos países em desenvolvimento, como uma boa solução para os seus problemas socioeconômicos, ou, às vezes, como a única solução, economicamente viável, em função da falta de competitividade do seu aparelho produtivo, para resolução dos seus problemas econômicos e sociais. Em outras situações é apresentado como a única saída para a convivência internacional num mundo sem conflitos, ou guerras, isto é, um mundo de paz. A aceitação desta realidade vem sendo tentada através da ação de organismos internacionais- da ação de alguns mecanismos internacionais - controle e registro de armas; não difusão de tecnologias sensíveis; registro e controle de patentes; controle total da utilização da energia nuclear e etc. - e através da ação de várias organizações não governamentais(ONG).

         A defesa da idéia da sociedade transnacional é um dos recursos empregados pelas nações e grupos hegemônicos, pela percepção da necessidade da criação de relações internacionais que facilitem, ou conduzam a realização dos seus objetivos nacionais. A postura estratégica que os atores internacionais acima citados adotam, compreende as seguintes ações estratégicas:

- universalizar a crença de que a globalização é inevitável no relacionamento internacional. Apresentam de maneira subliminar a Teoria do Fatalismo: o processo econômico de globalização é irreversível; nada poderá detê-lo, ou diminuir a sua abrangêncía, bem como nada pode ser feito, pelos países periféricos, para evitar, ou mesmo diminuir os seus efeitos colaterais indesejáveis, como por exemplo: a tendência de substituir a adoção dos conceitos de soberania pelo de soberania relativa, de autodeterminação pelo direito e dever de ingerência;
- fazer do intercâmbio e da cooperação (interdependência) internacionais, em especial a "cooperação" econômica o marco do relacionamento internacional;
- fazer crer que o único sistema econômico que, realmente, pode libertar os países em desenvolvimento da pobreza e da miséria é o neoliberal, para isso usam, intensivamente, palavras corno: competência, competitividade, como fosse possível haver competência e competitividade, entre realidades socioeconômicas tão díspares quanto as existentes entre as nações integrantes do núcleo central e as que compõem a periferia, quer pelo porte e diversificação dos seus respectivos aparelhos produtivos, quer pelo cerceamento científico e tecnológico imposto pelos países do núcleo central aos países periféricos, quer ainda pelo atraso cultural existente na maioria dos países da periferia;
- aumentar o "gap" tecnológico entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento, repassando, quando necessário, "Know How" de processos produtivos ultrapassados, quando julguem que estes não pertençam a alguma área estratégica do conhecimento, porém, em todos os casos, nunca permítir o acesso ao conhecimento pertencente à área do "Know Why";
- quando necessário intervir militarmente para impor as suas decisões e fazer prevalecer os seus interesses. Esse tipo ação estratégica pressupõe duas idéias básicas:

- é necessária uma cobertura legal, que deverá ser dada por uma organização internacional reconhecida pelo concerto das nações ( ONU, OEA etc.);
- deverá ter sempre um motivo justo aparente: a preservação da paz, garantia dos direitos fundamentais do homem; preservação ambiental etc.

         Neste ponto devemos verificar o real significado de algumas palavras muito utilizadas pelos pensadores e propagadores dessa "nova ordem internacional", segundo a ótica dos mesmos:

- Interdependência Internacional - Luciano Martins sustenta que interdependência envolve tanto benefícios quanto custos recíprocos, o que nos parece óbvio, mas a distribuição entre as partes envolvidas, tanto de benefícios quanto de custos, não tem, necessariamente, eqüidade. Toda relação de interdependência, na área internacional, tende, também, vir a ser uma relação assimétrica, porque, uma das partes, normalmente, conduz e condiciona o "modus operandi", de forma direta ou indireta, do relacionamento entre as partes, ocasionando, sempre, um certo grau de constrangimento;
- Interação Internacional - quando não há constrangimento, nem riscos, no relacionamento entre nações, pode-se dizer que estamos em presença de um relacionamento do tipo interação;
- Cooperação - Não há possibilidade de haver cooperação sem que haja interação ou interdependência, pois ambas são atributos da primeira. Dessa forma, a cooperação abarca todas as características da interdependência internacional descrita acima, o que nos leva a concluir que algumas restrições importantes acontecem, no momento, neste tipo de relacionamento: tendência a se tentar limitar a soberania dos estados-nação, em especial daqueles que não têm poder nacional para se opor a tal comportamento; marcante tendência da manutenção do "Status Quo" da divisão-de-trabalho internacional face as condições de poder - político, econômico, psicossocial, militar e tecnológico - extremamente desfavoráveis, dos países periféricos em relação aos países do núcleo central;
- Hegemonia - 0 conceito atualmente aceito foi formulado por Gramsci, hoje enriquecido por outros pensadores dos campos dos estudos sociais e estratégicos, e pode ser enunciado como sendo: uma forma de dominação de uma classe, organização ou nação, sobre as demais classes, organização ou nações, exercitada através da combinação do consentimento e/ou coerção.

         Comportamento semelhante vem sendo praticado há muitos séculos, no plano internacional, onde um ou mais atores, dotados de poder para tal, tomam-se os "garantes" de uma ordem internacional, que os demais aceitam porque é da conveniência de todos mantê-la, quer porque a mesma atenda também aos seus interesses, integral ou parcialmente, quer porque não tenham poder suficiente para contestá-la, ou pelo menos torná-la adequada aos seus interesses.

         Dessa forma a estabilidade das relações internacionais, obtida através do exercício da ação hegemônica de uma superpotência, implica na aceitação da idéia do consentimento e de um certo grau de cooperação. Nesse sentido, cooperação, normalmente, signífica comportar-se de acordo com as regras estabelecidas, direta ou indiretamente, pela(s) potência(s) hegemôniíca(s). A ordem internacional é estruturada de tal forma que os interesses fundamentais da (s) nação (ões) hegemônica (s) são, de alguma forma, observados.

         Os exemplos históricos demonstram, desde os primórdios da civilização - império romano, com a sua pax; dominação dos bárbaros, o império britânico; a França de Napoleão; o império soviético; as diversas intervenções americanas no Caribe (as mais recentes: Granada e Panamá), sendo que, nesta última, o seu Presidente, antigo colaborador dos EUA, foi praticamente seqüestrado, e levado para território americano, julgado e condenado.

         A conquista e manutenção de territórios, sob as mais diversas formas (Panamá, Porto Rico Azerbaijão, Cazaquistão, Chechenía e etc.), sua defesa contra outros pretendentes; garantias de fornecimento de matéria-prima (Guerra do Golfo), acesso privilegiado a mercados, proteção de rotas marítimas, manutenção de termos de intercâmbios desiguais; prevenção de rebeldias, aquisição de lealdade e etc., sempre foram e são as ações estratégicas normais do modelo de estabilidade das relações internacionais, produzida pela ação internacional, de forma hegemônica.

         Os pretextos para a utilização da força militar, na defesa de tudo que possa afetar os seus interesses vitais são os mais variados e contraditórios. Tomemos como exemplo o Oriente Médio. Na Guerra do Golfo os EUA, com a ajuda internacional, invadiu o Iraque sob o pretexto de libertar o Kuwait, porque este fora invadido pelas Forças Armadas comandadas por Sadam Hussein. Depois atacou o mesmo Iraque com mísseis e limitou a sua soberania sobre o seu espaço aéreo, porque Sadam empregou o seu exército, dentro de suas fronteiras, para sufocar uma rebelião interna. Sadam, neste caso, não invadiu qualquer país.

         Dentro desse quadro, a cooperação necessária a implantação e manutenção de uma ordem que tem como base a ação hegemônica, implica na aceitação de um certo grau dependência, em todos os campos do poder nacional, dos países periféricos em relação aos países do núcleo central. Esta relação de dependência é denominada, com freqüência, pelos teóricos trilateralistas, de interdependência.

         A supremacia acontece quando não há qualquer grau de consentimento, o que existe e a adesão às regras de comportamento internacional, impostas pelas potência(s) hegemônica(s). É o caso típico do colonialismo.

3 - Cenário Mundial Atual

         A guerra do Golfo Pérsico demonstrou que o desrespeito às regras de convivência internacional, impostas pela(s) potência(s) hegemônica(s), pode custar caro, em particular quando está em jogo os interesses estratégicos dessa(s) mesma(s) potência(s).

         A Europa continua perseguindo a sua integração econômica, embora haja, ainda uma grande quantidade de problemas que deverão ser resolvidos. Muitos acreditam em sua integração política, mas esta deverá vencer vários óbices, como o forte sentimento de nacionalidade, soberania e autodeterminação existentes, mesmos nos menores países da região. Isto tudo é permeado por manifestações nacionalistas em todos os campos do poder, na maioria dos países europeus, a saber:

- Conflitos na ex-lugosiávía - Sérvios, Croatas, Bósnios e etc.;
- 0 problema dos bascos na Espanha;
- 0 problema da Irlanda do Norte, que a primeira vista parece ser puramente religioso, mas que no fundo é, em realidade, uma manifestação do sentimento nativista irlandês;
- As manifestações contra os Imigrantes na França, Alemanha, Itália, Inglaterra e etc.;
- As proteções aduaneiras e as diversas formas de subsídios dadas a diversos produtos europeus, em particular os da agricultura, utilizando-se, para isso, critérios nacionais inerentes a cada região.

         Além disso continuam latentes, na Europa algumas desconfianças históricas: velhas alianças políticas, antagonismos históricos e aspirações hegemônicas, tais como:

- Alemanha, agora unificada, pode vislumbrar, dentro do novo cenário internacional, pós guerra-fria, suas possibilidades de obter, no mínimo a hegemonia regional, à médio prazo;
- antagonismo França versus Alemanha;
- antagonismo França versus Rússia;
- antagonismo Inglaterra versus França;
- Inglaterra como instrumento dos interesses do EUA, na Europa;
- antagonismo Alemanha versus Rússia.

         Dentro do quadro europeu, há, ainda, outro problema dos mais complexos: a CEI, cujo processo evolutivo global é de difícil prognóstico. Não devemos esquecer, neste cenário, que a Rússia tem a maioria dos seus indicadores socioeconômicos apontando para o nível dos países periféricos, entretanto tem avançado sistema de pesquisa, em particular militar e aeroespacial, bem como continua sendo a segunda potência mundial no campo militar, quer em forças convencionais, quer em forças nucleares - táticas e estratégicas.

         0 processo de desintegração da antiga URSS deu, e continuará dando, origem ao surgimento e ressurgimento de diversas nações. Não devemos esquecer, ainda, a possibilidade do reaparecimento do pan-eslavismo, em função do peso estratégico da Rússia e de ser o mesmo um objetivo nacional permanente da nação russa.

         A Rússia ainda considera a OTAN como uma ameaça à sua soberania, aos seus interesses e aos seus objetivos nacionais, que podem estar reprimidos ou mesmo, provisoriamente, congelados, em compasso de espera, porém nunca suprimidos. A pergunta que ela parece estar sempre fazendo sobre o assunto é: a OTAN foi criada no tempo da "guerra fria" para se opor às forças do Pacto de Varsóvia, se este foi extinto, por que a OTAN também não o foi? Esta seria uma boa pergunta que deveria ser respondida pelos EUA e seus aliados da OTAN. Se o mundo está em paz, se não há perigo ou ameaças de guerras, como os adeptos da Globalização afirmam, quando sugerem e tentam forçar os países em desenvolvimento a transformar as suas Forças Armadas em milícias, para que manter uma aliança militar poderosa e do porte da OTAN? Qual o papel das forças da OTAN dentro do cenário mundial atual? Lembremos da Guerra das Malvinas e da Guerra do Golfo e meditemos sobre o papel representado por esta organização nesses conflitos. Cremos que poderemos ter as informações que desejávamos para justificar a manutenção desta aliança.

         0 bloco asiático formado pelo Japão e pelos NICs, apresenta, sob o aspecto econômico, uma novidade: o início do aparecimento de uma crise econômica, que embora até o presente momento seja tênue, obrigará, certamente o Japão a reavaliar a sua política econômica. É uma crise gerada, com certeza, pelo modelo econômico japonês , que é voltado, demasiadamente, para a exportação, aliado a recessão econômica do resto do mundo. Este quadro já vem provocando crises econômicas entre os EUA e Japão.

         No campo estratégico-militar, o Japão vem adotando um perfil de comportamento muito discreto. Faz crer não ter força armada, mas, sim, uma força de autodefesa. Em realidade ele vem empregando, nos últimos dez anos, pelo menos, 1% do seu PNB no orçamento de suas forças armadas, o que corresponde, em média, a US$ 50 bilhões de dólares anuais. Esta quantia representa, aproximadamente, trinta ou mais vezes o orçamento anual das Forças Armadas Brasileiras.

         Algumas incertezas permanecem no ar nessa área geoestratégica:

- a instabilidade política em países como Tailândia, Filipinas, Vietnã, Síngapura e do Camboja;
- unificação da Coréia, que poderia proporcionar à mesma potencial nacional necessário para que ela possa dificultar as aspirações hegemônica do Japão;
- a já latente e futura disputa da hegemonia regional entre China e Japão, eivada de ressentimentos históricos, desconfianças mútuas e um antagonismo quase que atávico.

         Tudo parece indicar que a política externa japonesa persegue um objetivo: alcançar e manter a hegemonia mundial, conseqüentemente a disputa da mesma com os EUA parece-nos inevitável.

         0 Japão parece estar empregando uma estratégia indireta bem urdida e ardilosa. Há indícios que a mesma baseia-se numa nova divisão internacional do trabalho entre os EUA, Japão e Alemanha, como está claramente proposto em "Global Partnership For Peace and Prosperity Emerging Division Of Labor"- Dr. Kazuo Takahashi, Diretor do Sasakwa Peace Foundation, Japão 1992. Esta estratégia poderia ser assim conceituada:

- aos EUA caberia o papel de "polícia do mundo", papel ajustado ao seu "status" de maior potência militar, com os ônus dos desgastes político, econômico e psicossocial decorrentes do desempenho de tal papel;
- à Alemanha deveria empenhar-se na recuperação econômica dos países do Leste europeu e, se possível, da Rússia, arcando também com todo o peso do desgaste econômico de corrente de tal ação;
- ao Japão caberia a tarefa de promover o desenvolvimento dos países subdesenvolvidos. Fica claro que, dessa forma, ele ganharia a simpatia e a adesão política da grande maioria das nações , bem como conquistaria e manteria mercados quer para a colocação dos seus produtos, como para aquisição de matéria-prima e material energético, dos quaís depende,fundamentalmente, a manutenção do crescimento contínuo do seu aparelho produtivo;
- a ONU deveria sofrer uma reformulação, em particular o seu Conselho de Segurança, órgão detentor do poder de polícia da referida organização. Deveriam ser acrescidos ao mesmo, novos membros permanentes, que, em princípio, deveriam ser: Alemanha, Japão, Índia e Brasil. Estas duas últimas nações deveriam, como potências regionais que inspiram confiança aos países em desenvolvimento, representar os interesses dos Estados pertencentes às suas respectivas áreas de influências. Esta seria uma outra forma de neutralizar o grande poder de influência que os EUA têm no Conselho de Segurança da ONU, visando a criação de obstáculos à legalização pelo referido Conselho, de ações de polícia que deveriam ser exercidas pelos EUA, à revelia da ONU.

         Voltando ao sistema mundial, hoje em funcionamento, podemos observar que o equilíbrio de forças estratégicas do núcleo central, constituído pelos países componentes do G-7, é bastante instável. Também é verdade que nem todos os países do núcleo estão no centro do poder. Existe uma hierarquia entre eles. Uma análise mais cuidadosa nos leva a concluir que os EUA, como super potência hegemônica, fazem valer, no campo militar e parcialmente no de ciência e tecnologia, a prevalêncía de seus interesses, porém no campo Político e econômico, esta hegemonia é partilhada com pelo menos outras duas outras nações - Japão e Alemanha, tendo como coadjuvantes os demais componentes do G-7.

         A enorme quantidade de mudanças nas relações de poder, dentro do núcleo central, certamente produzirá conseqüências diretas e indiretas no trato dos assuntos do relacionamento entre nações, pelos países integrantes da periferia.

         Cremos que o relacionamento, centro-periferia, deverá ser analisado observando-se, também, os seguintes aspectos:

- diminuição da importância estratégico-militar dos países da periferia, em virtude do desaparecimento do segundo polo de poder (comunista);
- dificuldades na manutenção de fronteiras, em particular na África e no Oriente Médio, na medida que os atuais países não consigam provar e comprovar a sua viabilidade como Estado. Entretanto estas pressões de modificações de fronteiras poderão ocorrer em outra regiões do Globo(Europa Ocidental, Ásia e América Latina), umas pelo afloramento do nacionalismo reprimido por longo tempo, porém não suprimido, outros apoiados pelas potências hegemônicas, através do estímulo de fatores adversos internos, quando julgarem que seus interesses vitais estejam ameaçados (amazônia brasileira);
- esforço intenso dos países do núcleo central na direção da redução drástica da influência do poder militar, nos países periféricos;
- as grandes potências tudo farão para limitar a venda de armas para os para os países da periferia. Esta restrição deve ser verdadeira para os equipamentos que utilizam tecnología de ponta, porque a posse deste tipo de armamento poderia causar um desequilíbrio regional, o que poderia colocar em risco os interesses das potências pertencentes ao núcleo;
- sem abandonar o controle do comércio de armas convencionais, as mesmas deverão continuar sendo comercializadas pelos países centrais para a periferia, num volume adequado para que propicie aos mesmos, a sensação da posse de sua soberania na defesa de seus interesses e viabilize, econômica e tecnologicamente, a indústria bélica pertencente aos países do núcleo central;
- tendência da atuação firme na contenção da proliferação nuclear. Esta ação é direcionada, principalmente, aos países que têm condições de concretizar o domínio da tecnologia nuclear e do ciclo completo da obtenção e utilização do combustível nuclear. 0 quadro, dentro do cenário nuclear, é agravado porque permanece existindo a disputa entre os países que possuem tal tipo de tecnologia e dela não abrem mão, e os que não a têm e que vêm a possibilidade de se verem ameaçados pelos que a têm, caso os seus interesses vitais se entrechoquem. Essa ameaça poderia se manifestar na forma de restrição ao acesso ao combustível nuclear necessário a geração de energia, como também pela utilização de arma nuclear, como elemento de dissuasão e de conquista de lealdade. Dentro deste quadro, devemos refletir sobre alguns aspectos importantes: fica difícil separar a tecnologia nuclear civil da militar; a necessidade de se manter uma indústria civil nuclear, apesar das alegações dos supostos problemas ambientais; esta necessidade, citada anteriormente, existe porque este é um tipo de indústria vital, na busca da diversificação e da independência energética e tecnológica e como também um ato de soberania.

4. Repercussões para o Brasil

         A nova ordem internacional, como se pode facilmente concluir, não é tão nova como se está apregoando; é, sim, muito semelhante, desde o início do século, guardada as adaptações decorrentes das mudanças conjunturais e tecnológicas que vêm ocorrendo com incrível rapidez.

         Outra conclusão a que se pode chegar com facilidade é que ela nunca foi espontânea, natural, ética e inteiramente resultante da livre e justa interação entre as nações e tudo nos faz crer que assim continuará a ser.

         No contexto da estruturação do poder mundial atual, o papel das organizações transnacionais (ONG) é tão importante, que, com muita freqüência, elas têm feito parte de governos de vários países do núcleo central, através, evidentemente, de seus representantes, sendo que muitas vezes os interesses nacionais desses países, têm sido confundidos com os interesses dessas organizações.

         Como já vimos, a base atual de toda a disputa mundial tem sido a busca e a manutenção da hegemonia econômica e tecnológica de um grupo de nações sobre as demais. 0 objetivo desse grupo é impor a cooperação - no sentido neoliberal - como parâmetro básico no relacionamento entre nações do núcleo e as periféricas.

         A cooperação deverá continuar a ser implementada através da linha de atuação clássíca: importar insumos básicos, dos países periféricos, para manter o seu aparelho produtivo em funcionamento, mantendo o nível de emprego do sua força de trabalho, bem como mantendo os seus sistemas econômicos em constante ascensão, formando, conseqüentemente, um grande mercado comprador dos seus produtos que utilizem alto grau de tecnologia na sua produção.

         0 poder militar deverá servir para dissuadir a intenção de rebeldia contra o sistema de divisão-de-trabalho Internacional vigente, bem como reconduzir à "nova ordem" os países periféricos que se colocarem frontalmente contra a mesma.

         0 poder econômico deverá ser usado como forma de pressão sobre os países periféricos, fazendo-os respeitar a "nova ordem", ou então, como alternativa, haverá o caos econômico, com graves conseqüências para a sua estabilidade como nação.

         0 "gap" - distanciamento - tecnológico entre países do núcleo central e periféricos deverá ser mantido e se possível aumentado, em particular em áreas eminentemente vitais como a física nuclear; fisica dos supercondutores; microeletrônica; energia; engenharia genética; informática; pesquisa destinada a aplicações bélicas etc. Para implementação das ações estratégicas destinadas e obter o efeito desejado neste campo do poder, deverão ser usados vários tipos de meios:

- controle de transferência de tecnologia sensível;
- importação de cérebros dos países periféricos;
- repasse de Know How de tecnologia já ultrapassadas ou em vias de o serem;controle de equipamentos que possam servir para pesquisa de tecnologia de ponta;
- impedir a montagem de uma indústria bélica nos países periféricos;
- dificultar o acesso aos conhecimentos e equipamentos necessários ao desenvolvimento de conhecimento na área espacial;
- impor a adoção, por parte dos países periféricos, de leis rígidas e restritivas de propriedade industrial e intelectual - neste caso fazer um grande esforço no setor da biodiversidade e etc.

         Dentro deste cenário o Brasil, país pertencente ao limbo periférico, representando a sétima ou oitava economia do mundo, com um PNB estimado em mais de US$ 1,035 trilhões (1998/CIA), dotado de extenso território, de grandes reservas de recursos naturais e de expressivo contingente populacional, como potência regional emergente, é um forte candidato a ascender ao grupo que constitui o núcleo central.

         A reação natural dos países que constituem o chamado mundo desenvolvido é o da defesa do grupo, procurando colocar todos os obstáculos possíveis para impedir o Brasil de galgar a posição de país do núcleo central. Por observação, constatamos que o comportamento do núcleo na administração de casos semelhantes, ao longo deste século, nos indica que na medida que um país, ou grupo de países, tenha poder nacional, suficiente para dificultar a implantação e/ou manutenção dessa "ordem", e possua "Vontade Nacional" para fazê-lo, é admitido como membro integrante do triângulo do poder, como aconteceu com o Canadá, com a Europa Ocidental(França, Inglaterra, Alemanha) e o Japão e os NICs.

         0s estudos do comportamento do núcleo ao longo deste século apontam no sentido de que a utilização da expressão militar contra uma potência regional, far-se-á, somente, na medida em que as suas aspirações e ideologia representem uma ameaça aos interesses vitais das potências hegemônicas.

         0 poder político deverá proporcionar a base legal para todas as políticas empreendidas pelas demais expressões do poder, bem como uma aparência ética e moral, dentro do concerto das nações, que respalde as ações estratégicas levadas a efeito na implantação e manutenção da "nova ordem".

         Dentro desta linha de idéias enquadra-se a extinta União Soviética, que desejava obter e manter a hegemonia mundial impondo uma ideologia utópica, materialista e supressora da liberdade e dos direitos humanos. Foi derrotada pela adoção da estratégia da guerra econômica. 0 Iraque porque pretendia assumir o controle das fontes de suprimento de material energétíco do Oriente Médio, do qual as economias das potências trilateralistas da Europa Ocidental e Japão dependem, fundamentalmente, além de ínviabílizar grande parte das reservas estratégicas de petróleo dos EUA. A intenção de Sadam Husseín de possuir um artefato nuclear, também pesou na decisão de atacá-lo militarmente, pelo desequilíbrio que isto poderia acarretar na correlação de forças estratégicas da região, o que viria agravar o perigo a que estariam submetidas as fontes de petróleo da região.

         A operação do Panamá - os americanos chamam-na de operação "Just Cause"- foi realizada porque, na opinião dos americanos, estava contribuindo significativamente para desestabilizar o campo psicossocial do poder nacional americano, através da proteção e do incentivo ao tráfico de drogas para o mercado dos EUA, o que acentuava os alarmantes sinais de deterioração do "Way of Life" da sociedade americana, cujos principais sintomas, começam a aparecer.

         É compreensível que neste cenário o Brasil esteja sofrendo, e continuará a sofrer, pressões econômicas, políticas e rnilitares direta e indiretamente das nações do núcleo central, das organizações não governamentais (ONG) e de organizações internacionais - FMI, Clube de Paris e etc, para que reestruture a sua economia dentro dos conceitos e dos princípios do neoliberalismo econômico puro, ou melhor o modelo econômico trilateralista para os países periféricos.

         À priori não se deve condenar o neoliberalismo econômico, desde que o mesmo possua o significado que o Papa João Paulo II enunciou em sua Encíclica Centesimus Annus: "Sistema econômico que reconhece o papel fundamental e positivo da empresa, do mercado, da propriedade privada e da conseqüente responsabilidade pelos meios de produção, da livre criatividade humana no setor da economia".

         É certo que os mecanismos de mercado oferecem vantagens reais desde que sejam respeitados certos preceitos básicos e fundamentais: concorrência perfeita; favorecer o livre intercâmbio de bens; colocar a mola propulsora da economia na direção da liberdade, da vontade, das preferências e dos interesses das pessoas e nações que, no livre contato, se encontram com as de outrem.

         0 que observamos, no entanto, no relacionamento econômico mundial é o que o Papa João Paulo II define como: "sistema econômico onde a liberdade não está enquadrada num sólido contexto jurídico que o ponha a serviço da liberdade humana integral e que se considere como uma particular dimensão dessa liberdade, cujo centro seja ético."

         A pressão econômica sobre o Brasil tem se manifestado ao longo do tempo de várias maneiras: pressões relativas à dívida externa; cancelamento e adiamento de financiamentos para projetos de infra-estrutura; entraves e restrições ao fornecimento de tecnologia; sobretaxa ou imposição de cotas de importação aos produtos brasileiros; alegações sobre problemas ambientais; ativação da chamada cláusula social e etc.

         Esta ação externa é potencializada pela ação de algumas organizações multinacionais, acompanhadas por alguns grupos empresariais nacionais, que adotam um comportamento totalmente diverso daquele que deve existir numa verdadeira economia de livre mercado, onde haja um mínimo de competitividade e concorrência perfeita. Querer que a indústria nacional compita, em pé de igualdade, com indústrias multinacionais ou transnacionais, sem ter as condições tecnológicas, de capital e de produtividade para tal, é querer que a mesma seja absorvida pelo aparelho produtivo internacional e o centro-de-decisões do país, neste setor, desloque-se para o exterior, e que a médio e longo prazo volte, o Brasil, a ser um mero exportador de matéria-prima e um grande importador de produtos manufacturados. Esta é uma posição em muito semelhante, guardada as dúvidas proporções, a que existia entre a Inglaterra e Portugal na época do descobrimento do Brasil.

         Parece lógico dentro deste quadro, esperar que as Forças Armadas continuem a sofrer pressões diretas e indiretas, por parte dos países do núcleo central, por serem estruturadas e organizadas de forma permanente, ligadas, em primeiro plano à Nação, em segundo plano, por sempre terem desempenhado papel importante na vida brasileira, como guardiãs da democracia, do patrimônio nacional, da unidade e da soberania brasileira e ainda por estarem habilitadas e habituadas ao estudo do relacionamento entre os países, por via de conseqüência constituirem-se num dos grandes empecilhos a imposição ao Brasil de um papel, realmente periférico, dentro da chamada "nova ordem internacional".

         Essas pressões sobre as FA Brasileiras são feitas de fora para dentro, através de acordos diplomáticos com os seguintes objetivos:

- eliminar a possibilidade das FA brasileiras de possuírem e equipamentos e artefatos nucleares, impossibilitando-as de defender a Nação em caso de ameaça nuclear;
- reduzir a capacidade da indústria nacional de produzir, de tal forma que impossibilite às FA Brasileiras de utilizá-los como instrumento de defesa e de dissuasão;
- demolir a indústria bélica brasileira, que chegou a ser a sexta do mundo.

         Esta ação atende a dois objetivos específicos:

- tomar as FA dependentes do exterior, retirando do país o seu centro decisório e, conseqüentemente, a possibilidade de se reequipar e se modernizar constantemente, de acordo com as suas necessidades e disponibilidades de recursos e os interesses da Nação, desta forma impondo-lhe equipamentos e doutrina alienígenas, caracterizando, assim, um estado de profunda dependência, eliminando, também, um concorrente que começava a preocupar, não só pela quantidade de equipamentos produzidos, mas também pela qualidade e tecnologia que eles utilizavam;
- dar à FA Brasileiras um papel de milícia ou segurança interna, tentendo convence-las a direcionar as suas ações para o combate ao narcotráfico, estimulando-as a prestar serviços como construção de estradas, assistência médica à população desassistida, campanhas de vacinação e etc.

         As pressões têm sido feitas de forma clara, formal e explícita. Entre as várias existentes vamos citar os pontos principais do projeto que o Sr. Robert MeNamara - ex-Secretário de Defesa dos EUA, ex-Presidente do Banco Mundial - apresentou ao FMI e ao Banco Mundial, no dia 25 de abril de 1991, e que o Executíve Intelígence Review, de 1-15 de junho de 1991, publicou. Neste plano ele apresenta uma proposta da virtual extinção da FA dos países periféricos. Vejamos a seguir os pontos básicos e fundamentais deste plano:

- os conflitos regionais devem ser conduzidos e solucionados pelo Conselho de Segurança da ONU, utilizando, se necessário, forças multinacionais;
- o Conselho deverá acordar a proibição de produção, ou a aquisição de armas químicas, biológicas e nucleares, bem como de mísseis para os países que não os possuam;
- os países que não aceitarem as decisões do Conselho seriam submetidos a sanções econômicas e se insistissem em manter a sua capacidade militar, sofreriam uma intervenção militar internacional;
- os organismos de segurança regionais - OEA, OUA e etc - seriam os braços do Conselho de Segurança para os referidos assuntos;
- as grandes potências e as instituições financeiras internacionais deveriam condicionar qualquer tipo de ajuda financeira aos países periféricos, a limitação e redução drástica, pelos referidos países, dos gastos com as suas Forças Armadas.

         Poderíamos citar várias outras tentativas iguais à esta, realizadas por personalidades importantes e até mesmo por Chefes-de-Estado de nações Latino Americanas, mas creio que o exemplo acima já é bastante elucidativo.

III. CONCLUSÃO

         A simples observação e uma análise superficial dos elementos constitutívos da nacionalidade brasileira, mesmo levando em conta as dificuldades que o País atravessa, indicam as elevadas possibilidades de vir o Brasil, em futuro próximo, a disputar espaço com as nações ditas desenvolvidas.

         Os EUA buscam colocar o sistema internacional regido por uma nova ordem internacional, que atenda aos seus interesses globais, na certeza de que à medida que o tempo passa menor será o seu grau de controle sobre o sistema de relações internacionais.

         É, incontestavelmente, a superpotência militar dominante, porém já não basta ter poder militar, há que existir a capacidade financeira e política, para poder aplicá-lo, em qualquer circunstância e em qualquer lugar, que os seus interesses, a seu único e exclusivo critério, julgue oportuno. Vários observadores internacionais como Arbatovi, Luciano Martins, Takahashi e outros, julgam que os EUA, no momento, já não possui esta liberdade total de ação. De acordo com Georgi Arbatovi, Academia de Ciências da Rússia, em "Some Comments on New International Order - A Russian View", o mundo pós-Guerra Fria não é um mundo de relações unipolar dominado por uma única potência hegemônica, mas dotado de multipolaridade, onde interagem forças antagônicas como globalização; regionalismo econômico- integração regional; crescente sentimento nacionalista; surgimento de centros de poder regionais, que certamente vão procurar o seu papel dentro dessa "nova ordem internacional"; competição política, tecnológica e econômica aguçada entre a tríade atual do poder mundial - EUA, Europa e Japão. Luciano Martíns em "Ordem Internacional, Interdependência Assimétrica e Recursos do Poder" diz: "Há margem para se pensar que a implosão da União Soviética ocorre sem que os EUA, a despeito de sua posição de superpoder militar remanescente, disponha de condições para estabelecer, de forma singular e duradoura, sua hegemonia sobre o sistema internacional". De fato, apesar dos discursos patrióticos, parece existir hoje o início de um consenso sinalizando para o início do declínio do poder nacional americano, não obstante a controvérsia sobre se esse declínio é recuperável ou irreversível. A evidência disponível é no sentido do declínio, particularmente se considerarmos alguns fatores psicossociais - uso intensivo de drogas pela sociedade americana; aumento vertiginoso da população americana que adota a religião católica, cuja filosofia de vida contraria em grande parte a base religiosa da sociedade americana; a deterioração do conceito de família; a grande corrente migratória hispânica; o aparecimento do espanhol como a segunda língua de uma grande parcela da população americana a qual aumenta a cada dia; o aumento da criminalidade infantil e juvenil e etc - e o poderio militar americano de nada lhe servirá para reverter essa tendência. Entretanto o mesmo pode ser utilizado para impedir a formação de centros de poder-regionais, mesmo assim de forma limitada. Isso, entretanto, não é suficiente para o estabelecimento de uma hegemonia mundial, particularmente dentro do cenário internacional que estamos vivenciando.

         Países como o Brasil devem ver com suspeitas as propostas de desarmamento unilateral e redução de efetivos militares, de mudança de missão das Forças Armadas, de constituição de Força Armada Internacional controlada pela ONU. Essas e outras medidas, proposta pelos países do núcleo central resultariam, para o Brasil, na perda da capacidade da própria defesa de seus interesses, da sua soberania, da integridade do seu patrimônio nacional.

         Estas propostas, entretanto têm recebido a maior acolhida da parte de alguns setores, grupos e pessoas, que constituem focos irradiadores de teorias, conceitos e doutrinas que não atendem aos valores, interesses e aspirações da comunidade nacional, mas que, nem por isso, deixam de ter sua carga "potencializadora". Paralelamente à insistência em torno desses pontos, coincidentemente ou não, desenvolve-se uma campanha para cercear, desmoralizar e reduzir a vontade de lutar das Forças Armadas, através da extrema limitação do seu orçamento, impossibilitando a aquisição de equipamento adequado ao seu adestramento, bem como tornando difícil para os seus integrantes, viverem de maneira simples, mas condigna, com os vencimentos percebidos.

         Essa tentativa de neutralização das Forças Armadas Brasileiras favorece a imposição de outras medidas que ameaçam o nosso desenvolvimento, a nossa soberania e a nossa integridade territorial. Para citar uma, lembramos as que se referem a proteção ao meio ambiente, que em especial se concentram em torno da Amazônia Brasileira. Preservação da Amazônia ( significa mantê-la intocável) e a neutralização de extensas áreas de território ( áreas indígenas, florestas e parques nacionais, reservas biológicas, etc. ), onde, sabídamente, estão localizadas grandes províncias de minerais estratégicos como o nióbio, titânio e etc.

         Esse fatos , portanto, todos concorrentes, apontam no sentido de tornar frágil a segurança e criar dificuldades ao desenvolvimento nacional. Não sendo conveniente o aparecimento de um novo centro de poder com capacidade de influir no sistema internacional e produzir mais turbulência, no já tumultuado relacionamento internacional atual.


O BRASIL E O TERCEIRO MILÊNIO

V. Alte. (RRm) Sergio Tasso Vásquez de Aquino.

         O tema que me foi proposto para abordar - "O Brasil e o Terceiro Milênio" - é fascinante, rico em desafios e amplitude, e pode ser visto em duas perspectivas: a situação na virada do milênio que se aproxima, as possibilidades e as ameaças com que se defronta nossa Pátria, e a prospecção sobre qual seria o destino do Brasil pelos mil anos que se iniciam em 1º de janeiro de 2001.

         Quanto a essa segunda interpretação, podemos desejar que o nosso talento, a nossa dedicação ao Bem Comum e a nossa entrega em defesa da Pátria, por todas as gerações que hão de vir, assegurem a permanência da nação brasileira, tão jovem ainda nos seus 178 anos de vida independente e nascida para o mundo justamente em meados do Segundo Milênio, graças à saga Civilizadora dos Grandes Descobrimentos Marítimos portugueses. É preciso lembrar que a totalidade dos Estados Nacionais do Ocidente, como os conhecemos, formaram-se neste milênio, sendo dos mais antigos o bravo, intimorato dilatador da "Fé e do Império" Reino de Portugal, do qual somos orgulhosos herdeiros, surgido que foi no século XII. Desejamos, para o amado Brasil, a permanência, o prestígio, o respeito e a influência de antigas nações, a exemplo da China, cuja existência importante vara milênios. Só depende de nós, do nosso valor, do nosso trabalho, da nossa competência, do nosso espírito de luta, da nossa coragem e da nossa fibra, do nosso amor a esta Terra abençoada, de nós todos que nos honramos hoje e sejamos capazes de nos honrar sempre de ser chamados e conhecidos como brasileiros!

         Quanto aos desafios e ameaças desta virada de milênio, poderia começar dizendo que, na minha juventude, era muito comum ouvir que o "Brasil era o país do futuro", que "Brasília era a capital da esperança" e que "Deus era brasileiro" e, neste País, "Ninguém morria de fome". Onde estão hoje os ecos dessas expressões da sabedoria popular, que retratavam um quadro esperançoso para o futuro e de satisfação com a vida corrente?

         Ainda agora, um estrangeiro que, pela primeira vez, chegue ao Brasil e percorra suas múltiplas e variadas regiões, quedar-se-á absolutamente surpreendido com a riqueza, com a pujança dos recursos naturais do País, na sua extensão continental. Assim, um japonês ficará admirado com a fertilidade do solo; um europeu, com a presença quase permanente do sol; um americano, com o incrível potencial de recursos de toda a natureza, comparável ao de sua terra natal; um israelense ou um árabe do deserto, com o majestoso caudal dos rios e a abundância de água; um russo ou um chinês, ou um australiano ou um canadense, com a imensidão da base física do País, que lhes trará presente o torrão distante. E todos, sem exceção, após um razoável período de estada entre nós, render-se-ão à afabilidade, à simpatia, à cordialidade espontânea e aberta do nosso povo bom e hospitaleiro.

         Por outro lado, defrontando-se em seguida com a cruel realidade dos "dois Brasis", tomando conhecimento de tanta pobreza, tanta miséria, num quadro inaceitável de agudas e dramáticas diferenças sociais e regionais, perguntar-se-ão perplexos, em face da riqueza física e humana do Brasil: "Por que?" Tal pergunta fazemo-nos também, desolados e insatisfeitos, todos os brasileiros de bem, conscientes e que amamos nossa Pátria, e que desejamos um futuro justo e uma vida digna, com plena realização de sua admirável condição humana, "à imagem e semelhança de Deus", para todos os concidadãos!

         A resposta simples e direta a tão crucial indagação é: o egoísmo, a insensibilidade dos segmentos que detêm poder na sociedade, mas que se fecham no seu círculo de privilégios, esquecendo-se do restante da cidadania.

         Quando era Guarda-Marinha, em 1957, e, graças à maravilhosa oportunidade que me foi propiciada pela Marinha de ampliar tão expressivamente os horizontes culturais e afetivos, percorria boa parte do mundo em Viagem de Instrução, ao conhecer novas civilizações, sentia-me cada vez mais feliz e orgulhoso de ser brasileiro. Era filho de uma grande nação, "gigante pela própria natureza" e graças à bravura e à clarividência dos ancestrais, e que seria fatalmente uma das potências do mundo, mas que, ao contrário de tantas outras através da História, não teria projetos de hegemonia ou de imposição de sua vontade pela força e ao arrepio do Direito, graças às características únicas do seu povo, cadinho de todas as raças e de tantas culturas e nascido sob o sinal da Cruz de Cristo.

         Hoje, num quadro de desolação que se agravou sensivelmente nos últimos vinte anos, com acentuada aceleração nos dez vividos mais recentemente, nossa nobre nação, ofendida, humilhada, ultrajada, exibe claros sinais de decadência sem ter jamais atingido o apogeu. Tudo decorrente da grave crise moral provocada pelo egoísmo e alienação dos homens e mulheres que teriam os dons de conduzir o processo nacional pelos caminhos de justiça, paz social, desenvolvimento, ou em "Ordem e Progresso".

         A adoração do "Bezerro de Ouro", o ter dinheiro, a qualquer custo e a qualquer preço, mesmo que atropelando o direito dos demais, de acesso aos bens e serviços propiciados pela sociedade, tem sido a tônica estimulada por meios de comunicação social que tiveram pervertidas suas finalidades. As redes de televisão, principalmente, cuja técnica as coloca entre as mais eficazes do mundo, e cujos elencos de artistas e comunicadores difundem com muita espontaneidade e eficiência suas mensagens, em vez de ser fontes de informação, sadio entretenimento e de cultura e educação de massa, vêm, há cinqüenta anos, sendo as propagadoras da contracultura, da violência, da pornografia, da contestação de valores, princípios e tradições. Diabolicamente, pela sua ação diuturna, permanente, sem qualquer controle, - embora sejam concessões do Estado, e que, por isso, deveriam estar a serviço da elevação da Nação -, são as maiores responsáveis pela disseminação do inaceitável retrocesso moral que experimentamos, e da difusão da mentalidade atroz de "vencer a qualquer preço, levar vantagem sempre e em tudo", de desrespeito ao semelhante e ao código ético-moral que serviu de base à construção de nossa nacionalidade. Aí se inicia o processo de destruição...

         No mesmo diapasão, os nacionais que dominam as finanças, em estreita vinculação com seus êmulos internacionais, que desejam manter o Brasil subjugado, manipulam um mercado improdutivo, a ciranda financeira, que os faz cada vez mais ricos, enquanto a Nação empobrece pela adesão de tantos ao incentivo maior de "ganhar" em papéis que nada acrescentam ao processo produtivo. Empresários há, também, que vão preferindo "investir" nos títulos de renda certa e sem qualquer risco inerente à ação empresarial, e muitos se esquecem da função social da empresa e, apenas com visão no lucro, remarcando rotineiramente os preços, negam igualmente aos empregados, seus sócios legítimos na empreitada, os frutos que lhes seriam próprios e que lhes melhorariam a condição de vida, contribuindo para o bem-estar nacional.

         Os políticos, que hoje, infelizmente e por sua própria ação e omissão, constituem o segmento mais desacreditado na sociedade, porque tantíssimos mentem para seus eleitores, a maioria dos quais mantida propositadamente na ignorância, tudo prometem sem qualquer vínculo com a realidade possível, apenas para elegerem-se. Uma vez eleitos, para funções legislativas ou executivas, uma expressiva parcela deles só age em benefício próprio e de seus familiares e amigos, usando despudoradamente os recursos do Erário - que são da Nação - em proveito pessoal e grupal. Na próxima eleição, mentem uma vez mais, tudo prometem, enganam o povo simples e inculto, e elegem-se novamente. Não funcionam, assim, a censura e o processo seletivo e aperfeiçoador de uma opinião pública consciente e esclarecida, e o resultado trágico têm sido o esboroamento do nosso sonho por Democracia, aqui transformada em caricatura pelos maus hábitos e mais propriamente constituindo oligarquia nepótica e plutocrática, ainda que de personagens cambiantes eventualmente.

         A maior pena, de conseqüências indescritíveis para a Nação, foi a desfiguração da Justiça. O equilíbrio da sociedade repousa na aplicação pronta, equânime, "justa" da lei, perante a qual todos deveriam ser iguais. Aos problemas antigos de atraso e iniqüidade na distribuição da justiça, que através dos tempos gerava a impunidade que, na maioria dos casos, poupava os ricos e os poderosos delinqüentes, somou-se a característica recente de juízes que prevaricam e legislam em causa própria, buscando privilégios cada vez maiores, que os afastam, como aos legisladores, da vida dura que martiriza a maioria esmagadora do povo.

         No Executivo, também, nas suas camadas dominantes, instalou-se o apego aos cargos, às vantagens das funções gratificadas, que a maioria transforma em "yes-men", mais preocupados em agradar aos que detêm poder, para não perder suas posições e mordomias associadas, do que em cumprir o dever funcional em compromisso com a verdade e com a busca do Bem-Comum.

         O cenário, assim, é de egoísmo generalizado e alienação daqueles que teriam os talentos de conduzir a nação, enquanto que grandes números dos deserdados da sorte, influenciados pelas mensagens deletérias da televisão e pela situação de injustiça em que vivem, manifestam crescentemente condutas anti-sociais e desrespeito às pessoas e aos bens alheios, como tragicamente demonstrado pelo que vem ocorrendo nas grandes cidades, como São Paulo e a antes "mui leal e valorosa cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro", hoje sitiadas pela marginalidade e cuja triste realidade poderá espraiar-se prontamente pelo País, se nenhuma reação eficaz for tomada.

         O que fazer? Os homens e as mulheres de bem têm de identificar-se, dar-se às mãos e, com os exemplos e as ações de suas vidas honradas, lutar pela volta de um padrão ético e moral adequado para a sociedade. Num País em que a esmagadora maioria se diz cristã, há que praticar as virtudes do Evangelho, em nome do Senhor Jesus, e que utilizar os talentos confiados por Deus, em benefício da comunidade e dos irmãos menos dotados. E as demais pessoas de boa-vontade, na multivariedade de suas confissões religiosas, haverão de congregar-se no esforço de redimir o País.

         O doloroso episódio Collor provou que não será um "homem do destino" que salvará o Brasil, mais sim o esforço leal, dedicado e contínuo de todo o seu povo, dentro de mentalidade patriótica, altruísta. Líderes serão sempre necessários para guiar o povo, retirados dentre aqueles mais bem dotados de espírito, intelecto, cultura, vigor. Para tanto, terá de ser vencido também o "complot da mediocridade" de que tanto falava o grande tribuno Carlos Lacerda e hoje tão presente na vida nacional, e que vem bloqueando o acesso dos mais talentosos às suas naturais posições de destaque e comando, pela ação dos medíocres que são maioria e se encastelaram nos níveis de decisão, e que se movem pelo oportunismo e pela inveja, uma outra triste forma de egoísmo.

         Nosso Brasil tem tudo para ser uma grande Nação, próspera e feliz, sob as bênçãos de Deus: basta a correta alavancagem do trabalho honrado dos homens, sob a inspiração de valores de acordo com a melhor tradição de nosso Povo. O farisaísmo, a impostura, o fingimento que há tanto tempo nos escravizam, os maus brasileiros têm de ser denunciados e afastados pela ação decidida dos patriotas de talento, desprovidos de ambições e pequenos apetites pessoais, mas que visam somente à grandeza da Pátria e à vida digna e feliz para todos os seus filhos.

         Parece evidente, para as pessoas de reta intenção e de bom senso, que é muito grave a situação do país, podendo chegar à inaceitável convulsão social, se alterações drásticas de rumos não forem tomadas já a curto-prazo. As razões determinantes dessa infeliz situação são o egoísmo, o corporativismo, a falta de visão e de sensibilidade dos segmentos que detêm poder. Este é buscado para satisfazer apetites grupais e pessoais, para acesso a glória e dinheiro, para alimentar vaidades, sem qualquer compromisso com o Bem-Comum.

         Vivemos uma pretensa democracia, decorrente da forma deturpada pela qual é praticada entre nós, que entroniza situações de privilégio e de injustiça. Não se trata da democracia cujo sustentáculo seria a virtude e cuja destinação seria a felicidade do povo. Igualmente, a maioria dos homens públicos não tem pautado suas ações pela competência e pela vocação de servir, mas sim pelo comportamento reprovável, muitas vezes desonesto, conforme a cada passo se está verificando.

         Os políticos, que se desejavam sábios, puros e dedicados, seriam os líderes naturais, mas teriam de ser aquelas pessoas dotadas de talentos, que se entregassem de corpo e alma à tarefa de conduzir o povo e de promovê-lo, na busca do aperfeiçoamento constante da sociedade. Ao contrário, têm-se relevado, em maioria, apenas movidos pela ambição, oportunistas e demagógicos: assumem, externamente, posições favoráveis ao povo, que, em seu sofrimento, tem sido apenas instrumento, meros degraus da escada de acesso ao poder. Adotam um "discurso" aparentemente adequado à realização das aspirações da maioria, cujos votos tentam apreender, mas, malfadadamente, continuam geralmente caudatários das benesses que o poder oferece, negando, por seus atos e omissões, as belas palavras que proferem.

         As grandes transformações políticas da humanidade, o desenvolvimento científico e tecnológico que revolucionou a ação do homem sobre a Terra, que poderiam conceder, a cada criatura, condições de viver com um mínimo de dignidade, infelizmente vêm sendo acompanhados de involução moral. Todas as conquistas experimentadas, pela perda dos referenciais éticos e morais, do espírito de fraternidade, traduzido pela doação sincera dos talentos em favor dos cidadãos menos favorecidos, acabaram por cristalizar o "modus operandi" das classes dominantes, as falsas elites que se crêem donas de tudo e que, por isso, não se têm mostrado propensas a abrir mão de prazeres, bem-estar e privilégios em benefício da melhoria geral da situação do povo.

         A clássica divisão entre os poderes, nascida do pensamento que dominou a Revolução Francesa, até hoje influente na vida política dos povos, visava à harmonia e à independência entre eles, como forma de obterem-se equilíbrio e controle e de evitar comprometimento e conluio espúrios. A realidade revelou-se bem diferente: nossa República acabou por experimentar autêntica distorção, e Legislativo, Executivo e Judiciário, por ação e omissão, descumprem suas funções, não atendendo ao povo nos seus mais legítimos e essenciais anseios. Assim, está comprometido o Estado no seu papel mandatário de servir à Nação!

         Numa realidade dantesca e cruel, o poder econômico, representado pelos grandes conglomerados internacionais que já dominam a economia pelo tortuoso processo de "privatização" em marcha, e pela parcela do empresariado local interessado apenas no lucro máximo, a qualquer preço e a qualquer custo, faz o que quer.

         Assim, além da escalada constante nos valores cobrados por bens e serviços, que se abatem sobre desempregados em números crescentes e chefes de família com salários congelados há 05 (cinco) anos, manifestam-se indesejáveis e determinantes influências econômicas nos processos eleitorais e político-administrativos, pela eleição de políticos caudatários e comprometidos a peso de muito dinheiro, ou pela "compra" de suas pessoas e de suas consciências, usadas as mais variadas formas de corrupção, depois de eleitos.

         As pessoas sérias, ocupantes de posições das quais poderiam influenciar uma mudança positiva da situação, têm preferido silenciar, omitir-se, "lavar as mãos" como Pilatos, muitas por medo de se exporem e de, assim, perderem seus atuais privilégios.

         A triste realidade deste querido Brasil nos leva a concluir que imperativa se torna alteração radical do quadro político-econômico-social. Não ocorrendo, estarão vivendo graves riscos a nacionalidade, a paz e as próprias integridade do patrimônio nacional e soberania.

         Em conseqüência, faz-se mister incentivar, de novo e de novo, os homens e as mulheres de bem, "de mãos limpas e corações puros", aqueles que são animados da vocação de servir e que são a maioria esmagadora do povo, cuja voz não tem sido ouvida e cujos anseios não têm sido levados em conta, a se darem às mãos, a se organizarem numa frente irresistível, buscando soluções que redimam e salvem a Pátria. É preciso dar desenvolvimento a idéias e ações que redundem em que o Poder possa vir a ser exercido, de fato, sempre em benefício de toda a Nação, do seu progresso e da promoção dos cidadãos, e apenas pelos melhores, os mais bem dotados de espírito, intelecto, cultura, vigor, altruísmo, senso de justiça e desambição pessoal. Desses autênticos e legítimos líderes do povo, o único móvel deve ser a vocação de servir, com os talentos concedidos por Deus, sem nada visar em troca, senão a felicidade das gentes, a realização da justiça e a grandeza da Pátria.

         Há que discutir, estudar e implementar novas idéias. Usar da criatividade que caracteriza os brasileiros e abandonar modelos e mitos que nos têm sido impostos culturalmente, de fora. Estabelecer uma Constituição simples e efetiva, que declare, em poucos artigos, os lineamentos básicos da sociedade e a estrutura do Estado erigido para servir à Nação, com respeito à lei de Deus e à dignidade das suas criaturas.

         Ou até mesmo pensar numa nova Teoria do Estado, num "novo sistema de governo" que acabe com o injusto e desorientado esquema de poder que nos vem afligindo, e reformule profundamente Legislativo, Judiciário e Executivo, conforme tantos vêm preconizando.

         Tudo visando a dar nova consistência ao Estado, para cumprir sua destinação de bem servir à Nação, numa volta ao mais puro ideal democrático, com total respeito ao ser humano, "feito à imagem e semelhança de Deus".

         Com idéias e ações, renunciando ao egoísmo pessoal, grupal e corporativo, e pelo bom exemplo, a união, a fé e o entranhado amor pelo Brasil, todos os brasileiros de bem poderemos devolver dignidade e esperança ao nosso povo, para que se realize a construção da Pátria altaneira, ditosa e feliz! E a hora de iniciar a caminhada cívica redentora não pode mais ser adiada: é agora!

         Temos de reagir. Em verdade, a nossa época é do mais abjeto materialismo; assim, a maioria esmagadora das pessoas que chegam aos primeiros papéis do teatro da vida fica presa, cativa, da tentação do poder. Muitos são siderados pelo apelo do dinheiro que, em nossos dias, é a alma-irmã do poder... Daí o espetáculo tão triste e repetido do "apego aos cargos", a qualquer custo, que tanto tem prejudicado, tolhido e envilecido a boa ação administrativa!

         O que se tem visto é que quem experimenta as pompas e as glórias de ser poderoso não mais se conforma em voltar a ser espectador, em não mais ser capaz de manipular pessoas e situações. Talvez fosse útil e salutar a lembrança do exemplo das ordens religiosas, em que o Provincial, a quem se devem honra e obediência, num dado dia, findo o seu período de gestão, volta a ser um humilde irmão, igual aos outros, apenas mais sábio, perante si mesmo, pelas experiências administrativas e responsabilidades que viveu, e pelo despojamento tranqüilo, espontaneamente assumido, das honrarias devidas à antiga função.

         Antes de mais nada, é preciso ter honestidade em tudo, a começar pela de propósitos. Todos devem entender que, não importa qual o seu nível, são servidores do povo. "O Rei é o primeiro servidor do seu povo!" Assim, deixar de pensar em si, de cuidar de tirar vantagens pessoais, familiares e grupais do cargo ocupado, e só se dedicar ao bem-estar do povo, ao progresso da nação deve ser a linha de conduta geral.

         Não ter a preocupação de agradar, principalmente aos mais poderosos, para manter-se no cargo obtido por nomeação e para garantir um bom e bem remunerado emprego no futuro. O compromisso deve ser com a gente do Brasil, com o próprio espaço físico nacional, tão maltratado, e com as instituições - Homem, Terra e Instituições. Que merecem, e têm de ser aprimorados e aperfeiçoados pela ação desprendida e competente de quem foi escolhido para liderar, conduzir, comandar, decidir.

         Na arte de governar, não deve haver paternalismo, benesses a uns e a outros, ou a todos até, sem a contrapartida do trabalho e do esforço. Uma nação só se constrói, afirma e solidifica pelo trabalho honrado de todos os seus filhos. Governantes e dirigentes têm é que dar bom exemplo, serem os paradigmas, em tudo e por tudo, os espelhos em que a nação se deverá mirar para ver sua face verdadeira e altiva.

         A independência e a soberania do Brasil, a integridade do patrimônio que nos foi legado pela luta, pela coragem, pelo sacrifício dos nossos valorosos ancestrais devem orientar toda a ação do governo. "Esta terra tem dono! E o dono é o povo Brasileiro!"

         É preciso enfrentar, e debelar, a gigantesca corrupção que saqueia o Erário em bilhões de reais ao ano, e se faz responsável pelo frio assassinato de milhões de pessoas nas estradas sem manutenção, nos hospitais destruídos e inoperantes, nos cortiços e favelas sem água tratada e sem saneamento básico, nos alimentos desviados ou apodrecidos nos silos e armazéns de estocagem mal-feita, na violência assustadora que atinge campos e cidades. E que embrutece grande parte da população, pela falta dos meios necessários à educação e ao desenvolvimento.

         A alarmante sonegação fiscal tem de ter um fim. Os que muito têm, e muito devem, pouco ou nada pagam de impostos, enquanto que as pessoas honestas, os assalariados em geral sucumbem sob uma das mais pesadas cargas tributárias conhecidas.

         Não mais é possível tolerar a existência de sinecuras no Legislativo, no Judiciário, nas empresas estatais e em alguns setores do Executivo, que desigualam da forma mais aviltante os servidores da Nação, pagos pelos mesmos cofres do Estado!

         Quanta injustiça necessita ser reparada, quantos grilhões que escravizam nosso povo aflito e sedento de justiça precisam ser quebrados!

         O juiz moral do governante, do chefe, é sua consciência, que se espera cristalina e reta. Mas, não esquecer que, acima de tudo, está Deus Todo-Poderoso, que tudo vê e tudo sabe. Pode-se enganar o semelhante, calar a própria consciência, às vezes - mas subtrair-se ao julgamento justo do Senhor é impossível. Por que vaidade, hipocrisia, empáfia, soberba, falta de exação, ambição desmedida, então? Ao morrermos, nada levamos do que amealhamos em vida, outros companheiros não temos além do bem e do mal que fizemos. São esses os parâmetros finais com que nos devemos preocupar!

         O país é belo e riquíssimo em recursos naturais, o povo é bom e fácil de ser conduzido pelos caminhos da paz, da justiça e do amor.

         Só têm faltado dirigentes que façam de suas vidas públicas uma oração a Deus, na vocação de servir na plenitude: "A quem tiver mais talento, mais será cobrado!"

         Os caminhos do Brasil estão diante de nós. O progresso, o bem-estar, o Bem Comum dependem da nossa vontade e da nossa capacidade. Temos as respostas ao alcance da mão: bastam-nos o coração, a alma e a mente fortes e generosos.

         Nos aspectos político-administrativos, adotar e seguir o verdadeiro "Projeto Brasil", representado pela Doutrina da Escola Superior de Guerra e sua Metodologia de Planejamento da Ação Política, difundidas por todos os rincões da Pátria pela Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, e concebidas para fortalecer o Poder Nacional, garantir Segurança e Desenvolvimento à Nação.

         No campo moral e espiritual, separar o joio do trigo, escoimar os falsos valores, afastar os falsos profetas, vencer as tentações da mentira, da maldade, do vício... Entregarem-se, povo e dirigentes, à Divina Providência - "Ensinai-nos, Senhor, a vivermos de acordo com os Vossos preceitos!"

         Renunciar à falsa civilização do ódio e da morte, e entregar-nos ao amor, de Deus e aos nossos semelhantes, para construir nossa pátria justa, próspera, feliz! Doar , sem medo, os talentos - cada um de nós os tem, próprios e diferenciados - em benefício de todos. Não ser egoístas, mas compartilhar! Não ter medo, mas "combater o Bom Combate" pelo Bem! Não nos omitir, mas dar testemunho da verdade, do amor!

         Assim fazendo, estaremos reconstruindo o Brasil, sendo dignos da herança, das lutas e da bravura dos nossos ancestrais, e dos filhos e netos que hão de vir, por todas as gerações. E poderemos olhar com fé, esperança e confiança o futuro, pelos anos, pelos séculos, que se vão seguir!

         Que Deus abençoe o Brasil e os brasileiros, conceda-nos força, coragem e vontade, e a travessia do milênio será por mares bonançosos, iluminados por paz, progresso, justiça, abundância e felicidade! E o Brasil e os brasileiros seremos modelos, exemplos para o mundo, e artífices do entendimento e da fraternidade entre os povos. Exatamente cumprindo a missão iniciada quando as caravelas aqui chegaram, trazendo o símbolo da Ordem de Cristo em seus panos, e uma Cruz foi fincada profundamente no solo e no coração daquela que seria, para todo o sempre, a bendita Terra de Santa Cruz.

         Brasil, herdeiro maior da saga civilizadora de Portugal, afirmadora da dignidade intrínseca de todo ser humano, detentor da condição de filho de Deus, porque feito à sua imagem e semelhança! Brasil, terra abençoada, motivo maior de todos os nossos feitos, relicário dos nossos amores, destino das nossas devoções! Brasil que nos inspira o brado do fundo d’alma, repetindo a inscrição encontrada em todos os navios da Marinha: Tudo pela Pátria!


A IMPRENSA E A NAÇÃO

Jornalista Marcos Costa de Oliveira

          Os meios de comunicação no Brasil pautam sua atuação pela manutenção dos privilégios das elites e por interesses dos grandes grupos empresariais, especialmente o setor financeiro internacional. A atuação da grande imprensa não difere muito da experiência no resto do mundo, mas encontra em nosso País espaço para concentração de poder nas mãos de poucos grupos empresariais sem paralelo nos países ditos democráticos.

          Alguns exemplos:

Estados Unidos - Um jornal não pode ter um meio eletrônico (rádio ou televisão) na zona de distribuição principal de suas edições.

França - Quem detém mais de 50% do controle de uma cadeia de televisão de alcance nacional só pode participar em 15% de uma segunda e de 5% de uma terceira.

Itália - Nenhum titular de meio eletrônico pode ter mais de 25% das freqüências disponíveis para cada serviço. Se uma pessoas controla mais de 16% da circulação de jornais, não pode ter mais que uma cadeia de televisão. O ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi teve que vender participação em alguns jornais - onde detinha quase 20% da atividade nacional - para poder comprar três cadeias de televisão; quando a Justiça italiana descobriu que ele usou testas-de-ferro, obrigou-o a vender os canais de TV e se desfazer efetivamente dos jornais onde colocara "laranjas".

Espanha - Nenhum titular de serviço de televisão pode ter mais de 25% de um só canal de alcance nacional.

         Essas legislações estão sofrendo pressão para serem alteradas e já se observa flexibilização em países como Estados Unidos. Porém nada é tão "liberal" quanto no Brasil, onde um grande grupo de comunicação pode ter sem restrições rede de televisão nacional, rádios, jornais, revistas, televisão a cabo, meios de transmissão de dados e, agora, Internet.

         Uma alteração na lei de telecomunicações é, fundamentalmente, uma mudança na estrutura de poder. Ao se abrir espaço para legítima concorrência, para acesso a novos conteúdos, em suma, quando o cidadão tiver opções reais de informação, o Brasil se transformará politicamente. Não é à toa que as concessões de canais de rádio e televisão foram - e voltaram a ser - moeda corrente na política.

         O advogado Henoch Aguiar, professor de Direito à Informação da Universidade de Buenos Aires e diretor da Comissão Nacional de Telecomunicações - equivalente argentina à nossa Anatel - afirmou que concorrência e pluralismo são duas caras de uma mesma moeda; a concorrência no lado econômico e o pluralismo no político. Quando um dos dois é fraco, no nosso caso, as comunicações, o País perde a capacidade de dispor politicamente sobre seu destino sem que alguém possa influenciar a opinião pública devido ao excesso de poder.

         No Brasil nós temos um grande grupo de comunicações, que atua em todas as áreas, historicamente ligado ao capital estrangeiro e desde a época militar aos governantes em exercício. A Rede Globo é líder na televisão e utiliza essa liderança para se firmar em outros meios. Alcançou assim a maior tiragem entre os jornais do Rio de Janeiro, lançou um jornal popular, bem sucedido em grande parte por causa do suporte financeiro, o mesmo que aconteceu com a revista de circulação nacional que, sustentada por promoções e divulgação na TV, já ultrapassou o número de 800 mil assinantes.

         A Globo é líder também em TV a cabo - curiosamente não liberando nem vendendo o sinal de sua emissora aberta para os concorrentes - e já se fala que assumirá o primeiro posto na Internet. Pesquisa feita recentemente em São Paulo colocou a Globo como empresa mais lembrada na rede, com 6,8% de citações (o segundo colocado, o Grupo UOL, também de comunicações, ficou com 5,4%).

         Isso significa que a posição de hegemonia que obteve na televisão aberta (56% da audiência total) permite uma competição desleal em outras mídias. Mesmo perdendo audiência para concorrentes, a propriedade de vários meios de comunicação nas mãos de um só grupo dá uma vantagem extraordinária sobre a concorrência. No caso da televisão, como é um meio que exige grande aplicação de recursos, acaba que os competidores oferecem "mais do mesmo".Como dependem dos anunciantes, em sua maioria empresas multinacionais ou ligadas ao setor financeiro com interesses estrangeiros, tem-se pouco espaço para o novo, para o nacional, para contestação. Diferentemente de outros meios como jornais e revistas que têm fontes de recursos mais diversificadas, como preço de capa, classificados, pequenos anunciantes, lojas de varejo - ainda em mãos de empresários brasileiros - etc.

         A televisão fica com cerca de 45% do mercado publicitário brasileiro. Entre os 20 maiores anunciantes, 10 são estrangeiros e dois são de setor financeiro. Os dados são de 98; em 99 e 2000 a participação estrangeira deve ter crescido, com a privatização das empresas de telefonia - a maioria vendida a empresas de outros países -, que aumentaram suas verbas de publicidade.

         Disse acima que as barganhas políticas em torno de concessões de rádio e televisão voltaram. E de forma impressionante. A concessão está concentrada na Presidência da República, beneficiando aliados políticos. No caso das televisões, um agravante. Concessões de televisão educativa - teoricamente uma opção de se divulgar cultura nacional de qualidade - estão sendo distribuídas segundo critérios políticos. Pior: vêm sendo utilizadas para captar propaganda, o que é proibido por lei, com desculpa de "patrocínio cultural". Na prática, estão virando emissoras comerciais, com programação que nada tem de educativa. Na Anatel, quem deveria controlar essas emissoras é - pasmem - dono de concessões de TV educativa no interior de Minas Gerais (alega ter passado o controle para o filho).

         Do ponto de vista de conteúdo, os grandes grupos de comunicação oferecem padrão estético e cultural estrangeiro ou fazem um pastiche da cultura nacional, sob o disfarce de "programação popular".

         Segundo o professor Darc Costa, "temos uma estupidez que se dissemina no nosso dia a dia pelas revistas, pelos jornais, pelo rádio e pela TV, que é o discurso da dominação externa, que ora é globalização, ora é modernidade, ora é ajuste fiscal." Esse discurso único já se encontra em franco declínio, mas busca formas de mudar para se perpetuar. O resultado é queda das audiências, especialmente dos telejornais.

         Historicamente, as elites brasileiras são confusas em relação aos valores nacionais e freqüentemente se aliam ao interesse do capital estrangeiro. No plano cultural, adotam discurso e valores dos centros do exterior e menosprezam a cultura nacional. Ainda segundo o professor Darc Costa, nos últimos anos "o Brasil vem sendo tomado pela baixa estima. Não nos achamos mais capazes. E isto é o aspecto mais grave da crise que nos assola. Uma condição fundamental para o desenvolvimento é um positivo atributo psicológico da população, ou seja, sentir-se capaz. O sentimento de incapacidade presente na vida nacional resulta, não de condições objetivas, mas, sim, de uma insistente e planejada campanha, conduzida por parcela representativa das elites nacionais." Os meios de comunicação, em especial televisão, são pontas de lança desse processo.

         Não se pode nem dizer que o resultado é lucrativo. Dentro de sua miopia, grupos brasileiros estão perdendo dinheiro mas insistem em não mudar de caminho. Matéria da Folha de São Paulo do ano passado mostrava que os dois maiores grupos de comunicações, Globo e Abril, tiveram resultados preocupantes. O endividamento do primeiro, pelo balanço de junho de 1998, era de 269%, sobre o patrimônio líquido, e do segundo, em setembro do mesmo ano, de 374%. Em 1998, a Globopar, holding do sistema Globo, sofreu prejuízo de US$ 293 milhões.

         Quais poderiam ser os caminhos para sair desse sistema? Com certeza não seria através do projeto, que está em discussão no Congresso, de abrir 30% do capital das empresas de comunicação para grupos estrangeiros. Todos os países limitam a presença estrangeira no setor de telecomunicação - inclusive de telefonia, coisa de que o Brasil abriu mão. O projeto representaria somente uma injeção de dinheiro em empresas endividadas ou sem condições de investir, com crescente transferência do centro de decisão para o exterior.

         Curiosamente, um dos opositores ao projeto, embora não assumido, é o Grupo Globo. O interesse dele é evitar que concorrentes ganhem fôlego financeiro. Ao mesmo tempo, reforça seu caixa no exterior através da Globo Cabo - com ações negociadas na Bolsa de Nova York e na Latibex (bolsa européia que negocia papéis latino-americanos) e com participação acionária da norte-americana Microsoft - e Globo.com, que vendeu 30% da participação acionária para a Telecom Itália, por US$ 810 milhões. Deputados e Senadores que negociam o projeto avisam que a Globo já cedeu, mas até agora a proposta não avançou - felizmente.

         Para se mudar a situação atual, algumas providências seriam necessárias:

  • Impor, via Lei, limites à participação em diferentes meios de comunicação.

  • Criar um órgão governamental que efetivamente controle o cumprimento da Lei, combatendo "laranjas" e testas-de-ferro de grupos estrangeiros.

  • Controlar o abuso do poder econômico, para garantir a livre competição.

  • Reforçar o orçamento e a atuação das televisões educativas, com maior controle da sociedade sobre sua programação (a TVE do Rio, por exemplo, tem um programa chamado "Caderno Teen", algo que seria inconcebível a uma TV pública francesa, que defende a língua nacional).

  • Reforçar a atuação de rádios estatais, com música 100%nacional.

  • Limitar o abuso de programas e propagandas com cultura anglo-saxônica, valorizando a cultura, a língua e a população brasileiras.


A NOVA ERA DAS INCERTEZAS

Prof Reinaldo Gonçalves

  • Exuberância irracional, EUA
  • Financiamento externo, EUA
  • Estagnação japonesa
  • Lenta recuperação européia
  • Viés anti-crescimento, Maastricht
  • Locomotivas enferrujadas e hipertrofia financeira
  • Sistema monetário e financeiro: reforma dos organismos multilaterais (FMI, BIRD)
  • Comércio mundial: impasses na OMC (agricultura, meio ambiente)
  • Centralização do capital
  • Crescente desigualdade inter-países e intra-países
  • Exclusão social, pobreza e retrocesso social
  • Crescente descontentamento com a "tirania do mercado" (Seattle, Washington)
  • Degradação política-institucional: perda da legitimidade do Estado
  • África, Crise sistêmica: conflitos étnicos, tribais e religiosos
  • Europa Central e Oriental, vulnerabilidade externa, crise políticas e institucionais; Balcãs "sobre o fio da navalha"
  • Ásia, heterogeneidade nas estruturas, estratégias e políticas; sensível aos fluxos financeiros internacionais, crises políticas e institucionais
  • América Latina: abertura, vulnerabilidade externa - crises cambiais recorrentes - problemas econômicos e sociais - crise política e institucional
  • Brasil: processo de "africanização"


DESNACIONALIZAÇÃO ECONÔMICA

Professor Reinaldo Gonçalves

         A evidência empírica a respeito da desnacionalização da economia brasileira é conclusiva (ver tabela abaixo). A relação entre o fluxo de investimento externo direto e a formação bruta de capital fixo aumentou de 2,5% em 1995 para 24,6% em 1999. Como resultado, as empresas estrangeiras, que controlaram 6,8% do estoque de capital fixo total no País em 1995, passaram a controlar 12,4% em 1999. A participação estrangeira no estoque líquido de riqueza total aumentou de 5,7% em 1995 para 9,7% em 1999. O aumento da participação estrangeira no valor bruto da produção não foi menos significativo: 13,5% em 1995 e 24,6% em 1999. Vale ainda mencionar que a participação estrangeira no valor das vendas das 550 maiores empresas aumentou de 33,3% em 1995 para 43,5% em 1998. No que se refere a um setor-chave da economia - o setor bancário - a desnacionalização dobrou em quatro anos. A participação dos grandes bancos estrangeiros no total dos ativos do sistema bancário brasileiro aumentou de 11,9% em 1995, para 22,5% em 1998 e cerca de 24% em janeiro de 2000. Ainda que as estimativas acima estejam sujeitas a revisão, o fato incontestável é que houve um "salto quântico" da desnacionalização da economia brasileira a partir de 1995.

         O debate atual sobre a desnacionalização da economia brasileira tem se centrado em dois efeitos conhecidos: o "efeito balanço de pagamentos" e o "efeito soberania nacional". O primeiro refere-se ao fato de que cerca de metade do valor total do ingresso de capital estrangeiro no Brasil tem sido no setor de serviços, principalmente nos serviços de utilidade pública (luz, telefone, metrô) que exploram, invariavelmente, monopólios. Este tipo de investimento deve gerar pressões crescentes sobre as contas externas. Estes serviços não geram receitas em moeda estrangeira e, por outro lado, pressionam perpetuamente a conta de remessa de lucros para o exterior. Este é o conhecido "efeito balanço de pagamentos".

         O efeito balanço de pagamentos pode ser ilustrado de uma forma simples. No âmbito do processo de privatização, um grupo estrangeiro compra uma empresa estatal por um preço abaixo do valor efetivo do seu patrimônio. O grupo estrangeiro dá uma entrada e amortiza a dívida ao longo de anos de forma que a amortização será paga com lucros correntes. Além disto, o grupo é financiado pelo BNDES (e.g.: Embratel, leia-se MCI). Há remessas anuais de lucros para o exterior em um setor que não exporta bens ou serviços (exemplo, energia, bancos, telefonia). O resultado é que a ingresso de investimento externo é uma fração do valor atual da remessa perpétua de lucros.

         O segundo efeito manisfesta-se na esfera política e diz respeito à entrada de empresas estrangeiras, com efetivas fontes de poder, às quais o capital nacional, geralmente, não tem acesso. Para ilustrar, os governos dos países de origem das empresas estrangeiras intercedem em favor delas e pressionam o governo brasileiro. É difícil acreditar que empresas como General Motors, Nestlé e Toyota, não possuam "nacionalidade". Há, ainda, outras fontes externas de poder, como o grau de integração do sistema matriz-subsidiárias, a capacidade de mobilização de recursos das empresas transnacionais, a assimetria de informação, e a interdependência de mercados. Esta dimensão política refere-se tanto ao plano externo, quanto ao interno. Trata-se, aqui, do conhecido e, não por isto, menos importante, "efeito soberania nacional".

         A situação atual do Brasil é tão peculiar quanto dramática. De fato, a desnacionalização da economia brasileira é ainda mais grave quando se leva em conta dois novos efeitos que surgem no âmbito de processos específicos, que não têm sido mencionados ou destacados no debate atual. O primeiro pode ser chamado de "efeito multiplicador da vulnerabilidade externa", e o segundo de "efeito desnacionalização com africanização".

         O primeiro processo específico é que a desnacionalização econômica no Brasil aumenta ainda mais a já elevada vulnerabilidade externa do país, que é o principal determinante da trajetória de instabilidade e crise do País. A economia brasileira tem uma baixa capacidade de resistência a pressões, fatores desestabilizadores e choque externos nas esferas comercial, financeira, monetária, tecnológica e produtiva-real. A desnacionalização dos últimos anos representou um "salto quântico" de vulnerabilidade externa na esfera produtiva-real por meio do crescente controle do aparelho produtivo no País pelo capital estrangeiro. A este fenômeno chama-se de "efeito multiplicador da vulnerabilidade externa".

         Desnacionalização e vulnerabilidade externa envolvem movimentos na correlação de forças internas de poder na medida em que são processos que podem afetar e ser afetados por políticas e ações governamentais. A desnacionalização é uma fonte interna de poder específica ao capital estrangeiro, visto que não beneficia diretamente os grupos privados nacionais e altera a correlação de forças em detrimento destes últimos. A crescente presença do capital estrangeiro gera uma força econômica e política em defesa dos interesses específicos deste capital. E mais, esta força atua no sentido de manter e aprofundar um modelo de abertura econômica que implica em aguda vulnerabilidade externa.

         Na esfera financeira deve-se mencionar o comportamento errático dos fluxos de investimento externo direto. A questão central, aqui, é que os fluxos de investimento externo direto em escala global apresenta ciclos marcantes, com flutuações que dependem da situação econômica dos países desenvolvidos, da política macroeconômica desses países e das estratégias das empresas internacionais. A volatilidade destes fluxos é ainda mais evidente quando consideramos que os processos de fusão e aquisição também se manifestam de forma marcadamente cíclica. Assim, houve uma onda de fusões e aquisições transnacionais na segunda metade dos anos 80, que foi interrompida no final dessa década, e cuja origem foi, principalmente, a revitalização do projeto de integração européia e o ajuste estrutural da economia norte-americana frente aos desafios da competitividade asiática. Somente em 1994 surgiram sinais de uma nova onda de fusões e aquisições, cuja amplitude é incerta.

         O segundo processo específico refere-se ao fato que a desnacionalização ocorre no contexto de um fenômeno mais amplo que é de "africanização" do Brasil. Este fenômeno resulta da ocorrência simultânea de quatro processos: desestabilização macroeconômica, desmantelamento do aparelho produtivo nacional, esgarçamento do tecido social e deterioração política e institucional. Há, desta forma, um impacto político específico e importante, na medida em que avança o processo de fragilização do aparelho do Estado. Este fenômeno pode ser denominado de "efeito desnacionalização com africanização".

         A africanização do Brasil dificulta ainda mais as suas relações com o capital estrangeiro. O fenômeno da africanização implica na deterioração das instituições do Estado e da sociedade. O fato a destacar é que o País não tem uma política regulatória de capital, ao mesmo tempo em que as instituições públicas e privadas, que poderiam funcionar como contrapeso, se fragilizam.

         Pode-se tomar dois exemplos concretos. No CADE o seu próprio diretor reconhece, eufemisticamente, o subinvestimento institucional na mesma proporção em que crescem os casos de práticas comerciais restritivas (e.g.: indústria farmacêutica, na qual as empresas estrangeiras respondem por 80% das vendas das maiores empresas do setor). Por outro lado, as entidades representativas do setor privado também se fragilizam (por exemplo: FIESP) na medida em que o capital estrangeiro controla os sindicatos patronais e exerce crescente influência na entidade. Na medida em que o processo de africanização do Brasil avança, maior tende a ser a relação custo-benefício do capital estrangeiro.

         Os processos de concentração econômica e de desnacionalização tendem a reduzir cada vez mais a capacidade da sociedade brasileira de maximizar a relação beneficio/custo econômico associada à presença de capital estrangeiro no país. A fragilização institucional do Estado e a abertura externa nas esferas comercial, financeira-monetária, tecnológica e produtiva-real durante o governo FHC provocam incertezas críticas e riscos elevados quanto ao futuro do Estado-nacional e, portanto, da democracia e da sociedade brasileira. A trajetória de instabilidade e crise no Brasil significa que problemas cambiais provocam graves efeitos econômicos e sociais, que se transformam em crises políticas e institucionais. Neste sentido, deve aumentar a importância relativa da questão nacional na agenda política brasileira.

         A criação de uma Agência Reguladora do Capital Estrangeiro (ARCE) pode ser uma iniciativa política importante no sentido do País obter o maior benefício possível, com o menor custo. A ARCE teria tanto funções consultivas como deliberativas.

         A ARCE seria responsável pelo exame e aprovação de novos investimentos externos (superior, por, exemplo, a US$ 10 milhões), com base em análise de custo-benefício. Neste sentido, a ARCE poderia ser agência federal que inibiria a guerra fiscal baseada no sistema de incentivos e subsídios dados por estados e municípios. A ARCE também seria responsável pelo monitoramento da conduta e do desempenho das empresas estrangeiras. Este monitoramento forneceria subsídios para políticas públicas em diversas áreas. A análise de desempenho das empresas estrangeiras já instaladas no País teria uma abordagem abrangente e incluiria os efeitos sobre, por exemplo, balanço de pagamento, arrecadação tributária, nível de emprego, condições de trabalho, transferência de tecnologia, práticas comerciais (concorrência), e meio ambiente. Este monitoramento poderia ser usado como instrumento para políticas nas áreas de comércio exterior, contas externas, tecnologia, propriedade industrial, tributação, desenvolvimento regional, investimento, emprego e concorrência.

DESNACIONALIZAÇÃO DA ECONOMIA BRASILEIRA

 

Participação do capital

Estrangeiro (em %)

1995

1996

1997

1998

1999

Fluxo de Investimento bruto

2,5

6,1

10,2

15,4

24,6

Estoque de capital fixo

6,8

7,8

9,2

10,5

12,4

Estoque líquido de riqueza

5,7

6,3

7,0

8,0

9,7

Valor bruto da produção

13,5

15,5

18,3

20,8

24,6

Vendas das grandes empresas

33,3

34,1

36,3

43,5

nd

Ativos do sistema bancário

11,9

13,6

21,1

22,5

24,0

Fonte: Elaboração de Reinaldo Gonçalves.

Notas:(nd)= não disponível.

Fluxo de investimento bruto = Investimento externo direto (excluindo conversão e descontando a repatriação) / formação bruta de capital fixo, em valores correntes.

Estoque de capital fixo = Imobilizado das empresas estrangeiras / estoque líquido de capital fixo produtivo(estruturas não - residenciais e máquinas e equipamentos), em valores constantes de 1995.

Estoque líquido de riqueza = patrimônio líquido das empresas estrangeiras / estoque líquido de riqueza total (estruturas residenciais; estruturas não-residenciais; máquinas e equipamentos, automóveis e eletrodomésticos; deduzindo depreciação e a dívida externa) em valores constantes de 1995.

Valor bruto da produção = faturamento das empresas estrangeiras / faturamento total das empresas, em valores correntes.

Vendas das grandes empresas = vendas das empresas estrangeiras / vendas das 55 maiores empresas do País, em valores correntes.

Ativos do sistema bancário = ativos dos bancos estrangeiros / ativos totais do sistema bancário brasileiro, em valores correntes.

O dado para o setor bancário em 1999 é uma estimativa preliminar


INTEGRIDADE DO PATRIMÔNIO NACIONAL

CMG Luíz Carlos de Albuquerque Santos

         Este é um objetivo perseguido pela nação ao longo de sua história, cuja compreensão, tal como ocorre com a Soberania, mais exige de nosso equilíbrio e de nossa racionalidade. O apelo emocional de que se reveste é o motivo pelo qual, muitas vezes, o significado essencial de sua busca veja-se comprometido por radicalizações conjunturais que desunem muito mais que alertam.

         Trata-se de fato semelhante ao ocorrido por ocasião do despertar da consciência nacional para a necessidade de preservar o meio ambiente, sobretudo os recursos naturais, quando o espírito do conservacionismo traduzia-se equivocadamente por uma idéia irrealista e antinatural de intocabilidade.

         Não cabe uma visão estática do patrimônio nacional, como se fosse algo a ser mantido dentro de redoma, desprovido de uma dinâmica de uso que faz dele, aí sim, um traço de riqueza capaz de beneficiar indistintamente a todos os brasileiros.

         É certo haver partes do patrimônio nacional cuja integridade é necessário manter a qualquer custo, como acontece, por exemplo, com o território, um dos pilares da política externa do país que recusa qualquer retomada de discussão sobre definição de fronteiras.

         Mas no campo da cultura e da tecnologia, para enfatizar os mais dinâmicos, recusar-se a incorporar certos estrangeirismos expressivos a pretexto de não comprometer o patrimônio lingüístico herdado de nossos antepassados contraria a velocidade inerente à comunicação dos dias atuais e dificulta o entendimento.

         No entanto, há que se considerar a atitude oposta para evitar o açodamento na incorparação de palavras, idéias, políticas, nascidas em diferentes latitudes para atender aos interesses de outras nações, apenas porque o poder da mídia eletrônica, posta a serviço de tais interesses, massifica a sua difusão, conferindo foros de verdades indiscutíveis a posições e afirmativas que nem sempre coincidem com nossos próprios objetivos.

         A idéia de integridade do patrimônio num país em crescimento demográfico e econômico não pode servir de biombo para atitudes líricas concernente à integridade dos recursos naturais, como se o avanço da fronteira agrícola, a produção de energia elétrica ou o aproveitamento das riquezas minerais não fossem do interesse da nação como um todo. Desnecessário enfatizar que todas essas formas de utilização do patrimônio devem ocorrer com absoluto respeito pela integridade do meio ambiente, o que não se traduz por intocabilidade, senão por equilíbrio e racionalidade.

         A principal preocupação é a de evitar perda ou alienação irresponsável, ao arrepio de uma política que tenha em mente o bem-estar geral dos brasileiros. O patrimônio econômico não pode ser encarado como o dinheiro que o avarento acumula para gratificar-se apenas com a certeza de sua posse, mas como algo que pode ser movimentando, trocado, substituído, desde que tal dinâmica responda a uma aspiração natural de melhoria de qualidade de vida equanimemente considerada em relação a todos.

         Do ponto de vista cultural, manter íntegro o acervo construído pelos que nos antecederam, aí incluídos os valores da vida e da história, corresponde à preservação de nossa própria identidade e, portanto, ao nosso propósito de continuar como nação una e irrepetível.

INTEGRIDADE DO PATRIMÔNIO NACIONAL

(Resumo simplificado)

  • Preservar a integridade do patrimônio nacional não significa assumir a postura irrealista de imaginá-lo intocável.

  • Há uma dinâmica no uso desse patrimônio capaz de colocá-lo a serviço de todos os brasileiros.

  • Um dos aspectos do patrimônio que, este sim, não admite flexibilidades é o concernente ao próprio território.

  • No campo da cultura, é inevitável uma postura mais aberta decorrente da inserção do país no contexto internacional.

  • É preciso ter atenção para que tal abertura não signifique submissão a idéias e políticas engendradas para servir a interesses outros que não os nossos.

  • A preservação do patrimônio não deve impedir o uso dos recursos existentes em benefício da população, aí incluído o cuidado com o equilíbrio do meio ambiente.

  • Do ponto de vista cultural, manter a integridade do patrimônio confunde-se com a preservação da própria identidade nacional.


POLÍTICAS E ESTRATÉGIAS

Professor Marcos Coimbra

DE MÉDIO E LONGO PRAZOS

         

  • A) Retomar a taxa histórica de crescimento de 7% ao ano, objetivando gerar novos empregos e redistribuir dinamicamente a renda, fazendo o Brasil atingir novo patamar econômico (a partir de US$ 1 trilhão no ano 2010), consolidando uma estrutura produtiva de expressão moderna, competitiva, alicerçada no mercado interno e inserida no cenário mundial:

             A1 - obter estágio mais avançado de industrialização;

             A2 - consolidar a vocação brasileira de grande produtor e exportador de alimentos e matérias-primas agrícolas;

             A3 - recuperar, ampliar e modernizar a infra-estrutura de energia, transportes e comunicações, fazendo retornar o controle das estatais privatizadas ao setor público, dentro da lei;

             A4 - criar novos empregos, capazes de absorver o crescimento da população economicamente ativa (PEA) e reduzir o subemprego;

             A5 - melhorar a distribuição de renda;

             A6 - combater a pobreza crítica.

             

  • B) Organizar a vida econômica nacional;

             B1 - conceber política de investimento que, assegurando o crescimento, contribua para a correção dos seguintes desequilíbrios:

             I - insuficiência e obsolescência da infra-estrutura econômica;

             II - inadequação e pouco dinamismo da indústria;

             III - justaposição da agricultura eficiente, voltada para as exportações e práticas agrícolas rotineiras e de baixa produtividade;

             B2 - definir, com clareza, as regras do jogo da Economia, quanto a:

             I - funcionamento do mercado;

             II - papel do Estado na ordem econômica;

             III - relações entre o capital e o trabalho;

             IV - estrutura empresarial (papel das empresas estrangeiras, em especial).

             B3 - estabelecer programações viáveis de investimentos prioritários de curto, médio e longo prazo, públicos e privados, garantindo fontes seguras de financiamentos, em especial os de caráter indicativo, com:

             I - definição dos papéis e das responsabilidades dos diversos agentes econômicos:

             I1 - iniciativa privada - deve caber a maior parte dos investimentos diretamente produtivos;

             I2 - capital estrangeiro - estímulo à retomada de seus níveis de investimento de risco, nessas atividades, complementarmente, em associações com capitais nacionais, de preferência;

             I3 - setor público - deve procurar limitar-se aos casos anteriormente previstos na Constituição (petróleo, controle da mineração, telecomunicações, minerais nucleares e outros).

             Quanto aos demais, somente em função de razões de segurança nacional ou de relevante interesse coletivo ou estratégico;

             I4 - serviços públicos - a empresa privada deve aumentar sua participação inclusive em transportes, portos, ferrovias, terminais rodoviários e rodo-ferroviários, transportes aquaviários e aéreo e outros;

             II - fazer com que os mecanismos de mercado balizem as decisões de investir, com exceção dos investimentos prioritários, de produzir e consumir, com exceção naquilo que se refere aos abusos do poder econômico, a defesa do consumidor e a garantia da livre-concorrência.

             

  • C) Buscar a integração nacional;

             C1 - ampliar e modernizar as grandes vias de transporte, com visão intermodal nos sentidos norte-sul e leste-oeste, de forma a que atuem como instrumentos de integração econômica e social, ocupando espaços vazios no Centro-Oeste e na Amazônia;

             C2 - reduzir os grandes desníveis econômico-sociais, que secionam o espaço nacional em um núcleo organizado e duas regiões marginalizadas, minimizando o hiato de desenvolvimento existente e viabilizando complexos industriais integrados, voltados para maximizar as vantagens comparativas regionais;

             C3 - reorganizar a estrutura fundiária e criar programas de desenvolvimento rural integrado e de orientação das migrações do campo para novas fronteiras de ocupação;

             C4 - gerir, com inteligência, equilíbrio e visão de futuro, o patrimônio nacional legado pelos nossos antepassados.

    DE CURTO PRAZO

             

  • A) Eleger como variável-meta o pleno emprego dos fatores de produção (trabalho), com digna remuneração:

             A1 - Estimular o "agribusiness", eliminando a capacidade ociosa da economia e procurando fortalecer o setor terciário;

             I - Criar incentivos para acoplar o setor secundário ao setor primário;

             II - Investir em Ciência e Tecnologia, produtividade e qualidade;

             III - Aplicar recursos vultosos em educação básica e no ensino profissionalizante;

             A2) Colocar o Brasil num patamar mais avançado de sua industrialização, com relativo domínio das tecnologias de ponta, capacidade de exportação de manufaturados, assegurada por sua inserção competitiva no mercado internacional e garantia de atendimento, com produção nacional, da maior parte da demanda interna por manufaturas:

             I - Empreender programas setoriais integrados prioritários não só no que concerne a segmentos industriais, que permitem crescente domínio das tecnologias industriais avançadas, como também os voltados para o consumo interno, em larga escala;

             II - Dar ênfase para as indústrias extrativas minerais onde o país tenha vantagens comparativas ou das quais depender a autonomia energética nacional;

             III - Executar ações que mantenham a indústria como atividade mais dinâmica da economia;

             A3) Priorizar as atividades dos setores secundários e terciários capazes de criar emprego, com o retorno do BNDES às suas verdadeiras funções: qualificação de mão-de-obra, turismo, construção civil, micro, pequenas e médias empresas e outras;

             A4) Diminuir expressivamente a taxa de juros, colocando-a em níveis adequados à realidade internacional;

             

  • B) Recuperar a capacidade nacional de investimentos, com rigorosa seletividade da alocação dos recursos (acréscimo de 10% na formação bruta de capital fixo), mais integração de propósitos com a iniciativa privada e reformulação de políticas sociais em vigor;

             B1) Executar política fiscal capaz de propiciar ao setor público condições de aumentar o nível de investimentos para retomada do desenvolvimento (6% do PIB), fazendo com que a receita tributária bruta seja no mínimo 26% do PIB, diminuindo as alíquotas tributárias, combatendo a sonegação fiscal (no mínimo, 100% da arrecadação), diminuindo o grau de informalidade da economia (40% do PIB) e as despesas correntes do governo reduzindo-se para 20%, diminuindo subsídios, incentivos fiscais, transferência de recursos para Estados e Municípios e, principalmente, diminuindo o pagamento de juros da dívida;

             B2) Utilizar reservas financeiras das empresas (cerca de 4% do PIB);

             B3) Obter o reingresso dos recursos adicionais emigrados para o exterior;

             B4) Manter poupanças externas de risco para empreendimentos específicos (reequipamento, reaparelhamento, setores de ponta etc.) em 1% do PIB;

             B5) Tornar o setor público cada vez mais superavitário, mobilizando capital privado para investimentos nos setores básicos da economia.

             

  • C) Implementar Política Cambial, de Comércio Exterior e de Administração da Dívida Externa, destinada a inserir o Brasil na Economia Internacional, de modo favorável aos interesses nacionais:

             C1) Assegurar a expressividade da taxa de câmbio;

             C2) Supervisionar administrativamente o orçamento cambial;

             C3) Acompanhar oficialmente o comércio exterior;

             C4) Fixar o nível de proteção aduaneira à produção interna sem prejuízo da política antiinflacionária;

             C5) Estimular o ingresso de capital de risco estrangeiro no país e o reingresso de capital que tiver saído, em especial com residentes;

             C6) Adotar solução racional para renegociação da dívida externa, com redução do seu montante (cerca de 50%), na realidade retirando parcela substancial não utilizada efetivamente;

             C7) Romper o acordo vigente com o Fundo Monetário Internacional (FMI), altamente lesivo aos interesses nacionais, procurando uma saída que não ofenda a soberania nacional;

             

  • D) Proceder a uma reforma tributária, com redução dos atuais tributos inicialmente para:

             D1) Imposto sobre a Renda e Proventos de qualquer natureza - competência da União, com parte da arrecadação destinada aos Estados e Municípios, em parcelas a serem estabelecidas;

             D2) Imposto sobre Valor Agregado - atribuição dos Estados, com parcelas da receita encaminhadas à União e aos Municípios, em percentuais a serem estabelecidos;

             D3) Imposto Predial, Territorial Urbano e Rural - responsabilidade dos Municípios, com parte da arrecadação destinada à União e aos Estados;

             D4) Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira - mantido em caráter de teste, para análise de série histórica consistente, de atribuição da União, com percentual de 0,25%, sem exceções, a não ser as previstas na Constituição.

             OBS: 1) As contribuições para a Previdência Social serão mantidas, até que se possa obter uma avaliação real do novo quadro da receita tributária;

                         2) Os impostos regulatórios (sobre Exportação, Importação), também seriam mantidos;

                         3) A filosofia da reforma deveria atender às máximas reconhecidas internacionalmente no tocante à tributação, como, por exemplo, de que quanto maiores as alíquotas, maior será a sonegação, procurando fixar valores percentuais capazes de estimular a ampliação do universo tributário, objetivando propiciar um aumento da arrecadação;

                         4) A idéia de criação de um Imposto Único sobre Transações Financeiras seria mais bem analisada, através dos resultados das séries históricas mostradas ao longo do tempo, para verificar a sua real capacidade de implementação, considerando os óbices existentes (vulto do valor arrecadado, percentuais incidentes sobre cada transação financeira, repartição dos resultados, fiscalização da apuração feita pelo Sistema Financeiro Nacional etc.), tendo em vista principalmente a economia que será capaz de proporcionar tanto aos contribuintes como ao setor público;

                         5) É importante que a idéia-força capaz de presidir ao processo de reformulação tributária seja a de manutenção do equilíbrio do pacto federativo, sem causar a submissão de um ente federativo a outro e sempre considerando a necessidade de fazer com que todos paguem, de modo a que a contribuição de cada um seja menor.


    CRISE CIVILIZATÓRIA, MUDANÇA DE PARADIGMA CULTURAL E PROJETO NACIONAL

    Geraldo Luís Lino

    (Palestra proferida no painel Brasil Soberano e a Expressão Psicossocial, na ADESG-RJ, em 31/07/2000)

             Para mim, é um privilégio poder dirigir-me a uma platéia tão seleta, para trocar idéias sobre um tema de tanta relevância para o nosso futuro como cidadãos de um Estado nacional republicano, que pretendemos ver reconstruído e consolidado, a despeito das abrumadoras perspectivas apontadas pela realidade presente. Por isso, agradeço a direção da ADESG-RJ, nas pessoas do prof. Marcos Coimbra e do almirante Sergio Tasso de Aquino, pela oportunidade, que espero ser proveitosa para todos.

             A crise brasileira, nos diversos aspectos que têm sido discutidos neste fórum, não pode ser dissociada da crise civilizatória que, hoje, assola todo o mundo, em especial no que se refere à mudança de paradigma cultural responsável por ela, que nos remete ao tema do painel de hoje.

             Creio que poucos questionarão a percepção de estarmos envolvidos numa profunda crise da Civilização, uma crise marcada por um processo que podemos qualificar como a "desumanização da Humanidade", com a retirada do ser humano do centro do processo de organização da sociedade e da economia, em favor de entidades abstratas como o "mercado" ou o "meio ambiente", artificialmente dotadas de direito próprio. Para ilustrar essa "desumanização", vejamos alguns exemplos pinçados de manchetes recentes da imprensa brasileira.

             N’O Globo de 24 de junho, podemos ler: "Lavrador é preso por raspar casca de árvore." A notícia se refere à prisão de um lavrador goiano de 55 anos, analfabeto, que foi mantido encarcerado por sete dias pelo terrível e inafiançável crime de ter sido apanhado em flagrante raspando a casca de uma árvore conhecida como almesca, dentro de uma área de preservação ambiental, para fazer um chá para sua mulher, que tem a Doença de Chagas. Aqui, temos uma demonstração do conceito do biocentrismo, tão caro aos radicais do ambientalismo, que pretende rebaixar o ser humano e seus direitos inalienáveis ao progresso e ao bem-estar, derivados de sua condição de constituído à imagem e semelhança do Criador, ao nível dos demais seres vivos. Lamentavelmente, tal distorção, que está no cerne do movimento ambientalista, está fortalecendo a sua posição nas políticas públicas e nas relações internacionais.

             No Jornal do Brasil de 21 de maio, temos esta manchete: "Dinheiro vale mais que bom caráter." Trata-se de uma pesquisa feita entre alunos da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, sobre os valores mais prezados por eles. Entre cerca de 1.000 estudantes que responderam à pesquisa, o dinheiro foi o item mais votado, com quase 400 votos, mais do dobro do segundo colocado, o emprego, e quatro vezes mais que o amor, com apenas 95 votos. O altruísmo recebeu apenas três votos e o patriotismo, apenas um. Os valores materiais em geral receberam quase quatro vezes mais votos que os valores morais. Sendo a PUC-RJ um dos principais centros de formação das elites brasileiras, por aí podemos avaliar o estado de espírito dos nossos futuros líderes.

             Mas, a que para mim é a mais emblemática dos nossos tempos é esta manchete da Folha de S. Paulo de 3 de junho: "Mercados comemoram alta do desemprego" - que se refere ao anúncio que o aumento da taxa de desemprego nos EUA implicaria numa retração ainda maior da economia estadunidense. Com isto, a taxa de inflação se manteria baixa e a Reserva Federal (o banco central privado dos EUA) não precisaria aumentar a sua taxa de juros, prejudicando o consumo e novos investimentos. A retórica do "economês" não esconde a evidência de estarmos diante de uma total inversão do processo econômico, no qual o ser humano e o seu bem-estar e progresso passam a subordinar-se aos caprichos do sistema financeiro, e não o oposto. Afinal, etimologicamente, economia significa "organização da casa" - casa de quem? Evidentemente, do homem.

             Outro exemplo igualmente chocante é o relatório sobre "Desastres Mundiais de 1999", recentemente divulgado pela Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, o qual afirma que a grande maioria das 13 milhões de mortes decorrentes de doenças infecciosas, ocorridas no ano passado, poderiam ter sido evitadas com um investimento de apenas cinco dólares per capita. Ou seja, estamos falando de 65 milhões de dólares, quantia irrisória diante dos dois ou três trilhões de dólares que circulam diariamente nos mercados financeiros especulativos, ou uma reles gorjeta de qualquer um dos múltiplos escândalos financeiros em que o nosso Brasil tem sido pródigo.

             Diante dessas e numerosas outras evidências, com as quais deparamos no nosso cotidiano, dificilmente os historiadores do futuro escaparão à conclusão de que o final do século XX foi marcado por uma das maiores crises da História da Humanidade, uma crise que ameaça mergulhar-nos numa nova idade de trevas, que poderá fazer empalidecer a de meados do século XIV, que resultou na Peste Negra e na eliminação de mais de um terço da população da Europa. A diferença é que, naquela época, a Humanidade não dispunha de conhecimento e meios para, por exemplo, deter uma epidemia de peste bubônica como a da Peste Negra. Hoje, ao contrário, pela primeira vez na História, temos condições materiais de solucionar praticamente todos os grandes problemas que têm acompanhado a Humanidade em sua evolução - a fome, as doenças epidêmicas, a pobreza e a miséria. O próprio Banco Mundial, no seu relatório de 1998 sobre o desenvolvimento mundial, admite que com investimentos anuais da ordem de 100 bilhões de dólares, seria possível erradicar a pobreza e a miséria de todo o planeta. Ora, apenas o Brasil irá gastar este ano dois terços desta quantia com o serviço de sua dívida interna e externa - quer dizer, em lugar de combater a pobreza, aplacamos o apetite voraz da usura financeira.

             Existem também estudos sérios indicando que em menos de uma geração, seria possível proporcionar a cada habitante do planeta, em uma população maior que a atual - que é da ordem de seis bilhões de pessoas -, um padrão de vida pelo menos igual ao de um cidadão estadunidense de meados da década de 60 - que era bem superior ao atual. Se isto não ocorre, não é pela escassez de recursos naturais, humanos ou financeiros, ou por causa da "fragilidade" do meio ambiente, mas da escassez de vontade política entre os poderes hegemônicos e as classes dominantes na maioria dos países do planeta.

             Ainda assim, essa perspectiva otimista era o sentimento que dominava as classes educadas e grande parte das elites dirigentes no período do pós-guerra. Este foi um período de grande otimismo, que alguns autores, como a pesquisadora Carmem Soriano Puig, chamam a "revolução das expectativas crescentes". Este otimismo não se baseava apenas em fatores subjetivos, mas tinha um fundamento real: o período decorrido aproximadamente entre 1950 e 1973 foi o de maior crescimento do PIB per capita mundial em toda a História da Humanidade. Observando-se os dados compilados pelo economista estadunidense Angus Maddison, atualmente na Universidade de Gröningen, na Holanda, considerado uma das maiores autoridades mundiais em estatísticas econômicas históricas, podemos ver que a taxa média anual de crescimento mundial do PIB per capita nesse período foi de 2,9%, mais do triplo dos 0,9% registrados entre 1913 e 1950 - que atravessou duas guerras mundiais e a depressão dos anos 30 - e quase duas vezes e meia os 1,3% registrados desde 1973. Este desempenho foi em grande parte proporcionado pelo bom funcionamento do sistema monetário de Bretton Woods, estabelecido ao final da II Guerra Mundial e que, apesar das suas imperfeições, propiciou uma base estável de referência para a economia mundial, com taxas de câmbio fixas entre as moedas dos diversos países, que eram fixadas em relação ao dólar dos EUA, que, por sua vez, era fixado em relação ao ouro, o que dava um "lastro" físico para as economias, ao contrário da especulação desenfreada que ocorre hoje em dia. Adiante, veremos que o desmantelamento desse sistema foi uma das causas principais da desordem econômica que enfrentamos agora.

             Juntamente com a recuperação econômica da reconstrução do pós-guerra, havia entre a sociedade em geral o que se pode chamar um grande "otimismo tecnológico", ensejado por conquistas da ciência e da tecnologia, como a corrida espacial entre os EUA e a URSS, as perspectivas de utilização pacífica da energia nuclear, a "Revolução Verde" e as conquistas da medicina. Este foi também o período influenciado pelas Décadas de Desenvolvimento das Nações Unidas e pela promulgação da Doutrina Social da Igreja Católica, cujo marco foi a encíclica Populorum Progressio.

             Diante disso, é preciso perguntar: como tudo isso foi revertido? Como regredimos de um crescimento recordista e de um quadro de otimismo para um cenário de depressão, para um quadro geral de um grande pessimismo cultural, em que as perspectivas de um futuro melhor se vêem completamente ofuscadas pela desalentadora perspectiva da luta pela mera sobrevivência, em meio a um cotidiano abrumador? A resposta é: por meio de uma gigantesca operação de "engenharia social", que os seus próprios planejadores chamam uma "mudança de paradigma cultural", artificialmente induzida entre as classes educadas da sociedade de quase todo o mundo a partir de meados da década de 60.

             Antes de falar nessa "mudança de paradigma cultural", quero advertir-lhes que, quando tocamos neste assunto, muitas pessoas - algumas desinformadas, outras céticas e outras mal-intencionadas - costumam desqualificar as constatações dele resultantes como frutos de uma crença numa "teoria conspiratória da História". Bem, isto não é teoria, é a História se desenrolando diante de nós. Embora os historiadores e pesquisadores acadêmicos costumem abordar o assunto com a máxima reserva, com medo do patrulhamento e de parecerem ridículos, o fato é que os grupos hegemônicos, as oligarquias, têm manejado os fios condutores da sociedade desde tempos imemoriais, sem que precisemos acreditar em balelas como a mítica conspiração judaico-maçônica internacional. Mas vejamos um exemplo, referente ao Brasil.

             Observem essa declaração da Sra. Adele S. Simmons, presidenta da Fundação MacArthur, que é a quinta maior fundação oligárquica dos EUA. Como se sabe, cada grande família de "sangue azul" nos EUA tem uma fundação, que serve não apenas para fins de evasão de impostos (o banco Chase Manhattan não é da família Rockefeller, mas da Fundação Rockefeller), mas também para finalidades de "engenharia social", por intermédio do financiamento de organizações e indivíduos, inclusive na academia, que desempenhem atividades relevantes para os seus propósitos hegemônicos. Mas vejamos o que disse dona Adele Simmons, numa entrevista às Páginas Amarelas da revista Veja de 10 de julho de 1995:

             "Há vinte anos, quando a Fundação Ford decidiu investir em um centro de estudos acadêmicos - o CEBRAP -, idealizado na época por um sociólogo chamado Fernando Henrique Cardoso, a situação política brasileira não era particularmente sólida. Foi feita uma aposta em um grupo que, vinte anos atrás, parecia ter o perfil de uma futura liderança. Deu certo."

             Aqui, cabe perguntar: deu certo para quem? Pois vejamos agora o que disse o nosso presidente numa entrevista à Folha de S. Paulo de 13 de outubro de 1996:

             "Indiscutivelmente, o regime está rearticulando o sistema produtivo do Brasil. Portanto, ele está dando possibilidade a que os setores mais avançados do capitalismo tenham prevalência... Nesse sentido, ele é socialmente progressista... Não é das classes médias burocráticas, nem das classes médias que ficaram desligadas desses dois processos - a modernização produtiva e da universalização dos bens sociais. (Por favor, não riam!) Não é dos corporativistas, não é do setor burocrático anterior. Mas também não vou dizer que seja dos excluídos, porque não tem condição de ser. Aspiraria a poder incorporar mais, mas não posso dizer que seja."

             Como vêem, o próprio presidente admite que seu Governo privilegia "os setores mais avançados do capitalismo", que são exatamente aqueles que dona Adelia Simmons representa. Aqui, é preciso dizer que isso não significa que o nosso presidente receba diariamente um fax com instruções sobre a maneira de privilegiar esses setores. A coisa é um pouco mais sutil.

             Talvez, todos já tenham ouvido falar de uma organização chamada Diálogo Interamericano. O Diálogo foi fundado em 1982, depois da Guerra das Malvinas, como um centro de planejamento estratégico e propaganda política da oligarquia anglo-americana para o Hemisfério Ocidental. Ele reúne cerca de 100 personalidades políticas, acadêmicas, da mídia e de outros setores relevantes, de quase todos os países americanos, inclusive do Brasil. Eles se reúnem anualmente, para discutir uma agenda de "interesses comuns" aos países do Hemisfério, que, posteriormente, não por coincidência, se transformam em políticas de Governo nos países dos membros do Diálogo. Entre outras: a política neoliberal de abertura econômica desenfreada; a defesa da legalização do uso das drogas entorpecentes; a politização dos problemas do meio ambiente; e a desestabilização das Forças Armadas ibero-americanas, sob o pretexto da sua subordinação ao poder civil. Entre os membros do Diálogo, encontramos vários personagens que foram ou são chefes de Estado ou candidatos a chefes de Estado. Entre eles, destacamos: Raúl Alfonsín, da Argentina; Julio Sanguinetti, do Uruguai; Gonzalo Sanchez de Lozada, da Bolívia; e o nosso Fernando Henrique Cardoso. Aliás, Fernando Henrique é membro fundador, levado ao Diálogo por Peter Bell, que é diretor do grupo desde a fundação. Não por coincidência, Peter Bell era o representante da Fundação Ford no Brasil quando a Fundação financiou a criação do CEBRAP. Segundo o falecido professor Florestan Fernandes, foram 700.000 dólares - o que, em 1969, era um bocado de dinheiro.

             Entre os membros brasileiros do Diálogo Interamericano, encontramos outras figuras conhecidas, como o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva, que está lá desde 1990, e o Sr. Ciro Gomes, que lá esteve entre 1994 e 1998. Então, temos um quadro interessante no qual, nas últimas eleições presidenciais brasileiras, os três candidatos mais votados eram membros do Diálogo Interamericano. Ou seja, as oligarquias fizeram aqui um jogo triplo, para garantir os seus interesses por todas as pontas. Como vêem, assim caminha a Humanidade.

             Vejamos agora como estão estruturados esses "candidatos a donos do mundo". O filho do presidente dos EUA Franklin Roosevelt, Elliott Roosevelt, que foi oficial da Força Aérea na II Guerra Mundial e acompanhou o pai em quase todas as conferências internacionais de que ele participou durante a guerra, escreveu um livro muito interessante, chamado Como meu pai os via, que existe em português. Nele, ele chamava essa gente de os "inimigos do progresso". É o que são: inimigos do progresso humano, adeptos do oligarquismo, que é uma visão do mundo intrinsecamente egoísta, contrária ao republicanismo dos Estados nacionais soberanos.

             Quem são eles? São um conglomerado de famílias oligárquicas da Europa - principalmente do Reino Unido - e da América do Norte, reunido em torno da liderança da Casa de Windsor, a família real britânica. Entre eles, eles se autodenominam o "Clube das Ilhas", que é uma denominação formal, que não se encontra na lista telefônica de Londres. O nome é uma homenagem ao rei inglês Eduardo VII, filho da rainha Vitória, que reinou entre 1901 e 1910 e em cujo reinado se consolidou a articulação dos dois principais ramos dessa oligarquia internacional, o britânico e o estadunidense.

             Esses grupos oligárquicos atuam por meio de várias instituições de planejamento estratégico e "engenharia social". Mais ou menos hierarquicamente, temos as seguintes:

             1) O Grupo Bilderberg, fundado em 1954, cujos encontros anuais reúnem a nata da nata dessa oligarquia internacional - apenas representantes da Europa e da América do Norte. Para que tenham uma idéia do seu poderio, foi numa reunião do grupo, realizada na Suécia em maio de 1973, que foi decidido o aumento de 300% nos preços internacionais do petróleo, cinco meses antes da Guerra dos Seis Dias, que foi o pretexto oficial para o aumento decretado pelos países membros da OPEP.

             2) O Instituto Real de Assuntos Internacionais de Londres (RIIA) e sua contraparte americana, o Conselho de Relações Exteriores de Nova York (CFR), que representam as oligarquias britânica e norte-americana, ambos fundados no início da década de 20.

             3) A conhecida Comissão Trilateral, fundada em 1973 por iniciativa da família Rockefeller, para atrair para os centros decisórios representantes das elites do Japão, cujo poderio econômico não podia mais ser ignorado pelos planejadores da oligarquia internacional.

             4) Num quarto escalão, temos o Diálogo Interamericano, que discutimos há pouco. Esta é praticamente a única organização desse tipo que tem "cucarachos" latino-americanos entre os seus membros. Já vimos alguns deles.

             5) Outras organizações relevantes são os chamados think-tanks, como a Rand Corporation; o Instituto Hudson, do gordo Herman Kahn - aquele dos "Grandes Lagos Amazônicos"; o Clube de Roma, criado para difundir a ideologia dos "limites ao crescimento"; o Instituto Tavistock de Londres, que é o principal centro de guerra psicológica e "engenharia social" dessa oligarquia; e as fundações, como a Ford, Rockefeller, MacArthur e outras, cujo papel já discutimos.

             Essa oligarquia exerce um controle direto sobre:

             1) O Banco da Inglaterra, o Sistema da Reserva Federal dos EUA, que são os dois principais "bancos centrais independentes" do mundo, e o BIS, o Banco de Compensações Internacionais de Basiléia, considerado o "banco central dos bancos centrais". Vale ressaltar que o Banco da Inglaterra e a Reserva Federal são entidades privadas controladas por consórcios de bancos privados; de "Federal", a Reserva só tem mesmo o nome.

             2) As principais organizações do sistema das Nações Unidas: o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial, a Organização Mundial de Comércio, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento etc. Este controle é exercido em grande medida pela nomeação de pessoal imbuído dos propósitos dessa oligarquia para os postos-chave das organizações, sejam representantes diretos ou prepostos especialmente treinados.

             3) As principais casas bancárias, financeiras e seguradoras da Europa e da América do Norte.

             4) Uma série de escritórios jurídicos selecionados.

             5) Os grandes cartéis de alimentos, matérias-primas e energia.

             6) Os grandes cartéis internacionais de mídia.

             7) Alguns conglomerados industriais selecionados.

             8) E um instrumento importantíssimo: o aparato internacional das ONGs, cujo papel nessa estratégia hegemônica é cada vez maior.

             Finalmente, esses grupos oligárquicos atuam em estreita cooperação com os serviços de inteligência da Inglaterra e dos EUA.

             Como foi que esses grupos efetivaram a "mudança de paradigma cultural"? Basicamente, pela implementação de diretrizes políticas que seguiam três linhas de ação:

             - a reversão da idéia de progresso como uma "vocação natural" da Humanidade;

             - a supressão da idéia do republicanismo, o conceito do Estado nacional como responsável pela promoção do bem-estar e do progresso e de que este objetivo deve ser o cerne da formulação das políticas públicas; e

             - a promoção em grande escala do irracionalismo, do individualismo e do hedonismo.

             Fundamentalmente, as diretrizes elaboradas foram as seguintes:

             1) O desmantelamento do sistema de Bretton Woods, que abriu caminho para o que podemos chamar a "financeirização" da economia mundial. Isto ocorreu a partir de 1971, quando alguns "notáveis" da oligarquia conseguiram convencer o presidente dos EUA Richard Nixon a acabar com a paridade entre o dólar e o ouro, o que acabou com as referências monetárias e o "lastro físico" da economia, abrindo caminho para as "taxas de câmbio flutuantes", a desregulamentação do sistema financeiro e a onda de jogatina financeira especulativa que caracteriza hoje a economia mundial. Para que tenham uma idéia, de cada 100 dólares de transações monetárias em todo o mundo, menos de 50 centavos têm relação com o comércio de bens e serviços que configura a economia real. O resto é pura especulação. Apenas em derivativos financeiros, que são os instrumentos especulativos mais delirantes e surrealistas, existem circulando no mundo mais de 300 trilhões de dólares, quando o PIB combinado de todos os países do mundo mal chega a 40 trilhões de dólares. Algo está errado com essa economia, não acham?

             Essa é a essência da chamada "globalização", a especulação financeira transformada num fim em si própria, praticamente desvinculada da economia real à qual deveria servir o sistema financeiro. É o cassino financeiro global, de que fala o Prêmio Nobel de Economia francês Maurice Allais. É a supremacia deliberada da especulação sobre a produção. Para reverter este processo, será preciso a convocação de uma "nova conferência de Bretton Woods", como propõe o economista Lyndon LaRouche, apoiado por um número cada vez maior de personalidades internacionais, com a reformulação do atual sistema financeiro e monetário mundial e a sua colocação a serviço de um projeto de reconstrução econômica em escala global, baseado em grandes programas de infra-estrutura, como a Ponte Terrestre Eurasiática, encabeçada pelo Governo da China.

             2) A promoção da "sociedade pós-industrial", a falaciosa idéia da supremacia dos serviços sobre a produção física, o mito da "sociedade da informação", da "Terceira Onda" de Alvin Toffler. Atualmente, essa é a essência da chamada "Nova Economia", caracterizada pelas flutuações loucas do índice da "bolsa eletrônica" Nasdaq, que viraram destaque diário dos nossos telejornais. Observem uma manifestação desse irracionalismo econômico, nesta matéria publicada na revista Carta Capital (15/10/97):

             "O dinheiro cai do céu. Em tempos de incerteza global, investidores e empresários utilizam cada vez mais os préstimos da astrologia financeira."

             Imaginem só, astrologia financeira! Pobres dos profissionais que perdem tempo estudando os múltiplos fatores relevantes para a economia real. E saibam que sandices como essas não se limitam ao Brasil. Em países como a Alemanha, muitas empresas também contratam astrólogos como "consultores".

             Outro exemplo é esta notícia do Jornal do Commercio de 5 de março de 1996, que fala na criação dos "bônus-terremoto" pelo banco Morgan Stanley. "Quem arriscar e comprar um papel com prazo de 10 anos poderá receber o prêmio de volta se, no primeiro período de quatro anos, o terremoto não acontecer." Foram emitidos 2,8 bilhões de dólares dessas coisas. O que é isso? Surrealismo puro! Apostas de cassino! Não tem nada a ver com um processo econômico saudável.

             Esses são sintomas de uma economia que perdeu totalmente o contato com a realidade.

             3) A promoção da "contracultura", baseada na disseminação do uso das drogas entorpecentes, como o LSD, a maconha e, depois, a cocaína, a heroína e, mais recentemente, o crack; na popularização internacional do rock, que era uma variedade musical pouco expressiva nos EUA; e na chamada "revolução sexual". Juntamente com isto, tivemos uma distorção do conceito de família, que passou a significar a união de quaisquer pessoas, independentemente do sexo. Imaginem, a possibilidade de que uma criança tenha "dois pais", ou "duas mães". Não vejam nisto nenhuma manifestação de intolerância contra homossexuais, mas admitir que dois deles ou delas possam constituir uma família normal é uma violação de algo que anda meio fora de moda, chamado lei natural.

             Outra vertente da "contracultura" foi a onda de irracionalismo conhecida como "Nova Era", baseada na exploração do misticismo, principalmente envolvendo religiões orientais.

             4) Um elemento cada vez mais importante desse processo é a politização do malthusianismo e de sua variante mais recente, o ambientalismo, que são talvez os principais responsáveis pela disseminação da percepção equivocada de que os benefícios da civilização industrial não podem ser estendidos a todos os povos e países do planeta, devido à "escassez de recursos naturais" e à "fragilidade" do meio ambiente. O ambientalismo se presta a uma série de propósitos antidesenvolvimentistas, sendo o principal deles incutir nas mentes das pessoas desprevenidas a falsa noção de que o progresso da Civilização deve subordinar-se a critérios de "proteção da natureza" definidos muito mais com base em fatores políticos do que científicos. A grande maioria dos chamados "problemas ambientais" que estão justificando a implementação de uma série de ações antidesenvolvimentistas, inclusive tratados internacionais altamente restritivos dos planos de desenvolvimento da maioria dos países, como o chamado "buraco" na camada de ozônio ou o aquecimento global, são fenômenos naturais que ocorrem há milhões de anos sem qualquer interferência humana.

             Um exemplo é o chamado aquecimento global, que está sendo manipulado para justificar a adoção da chamada Convenção Quadro de Mudanças Climáticas, que prevê a redução das emissões dos gases provenientes da queima de combustíveis fósseis, até 2010, aos níveis vigentes em 1990. Como os combustíveis fósseis representam três quartos da produção mundial de energia, pode-se imaginar o impacto que essa redução causará nos perfis mundiais de consumo energético e desenvolvimento econômico, que depende fundamentalmente da disponibilidade de energia. Pode-se perceber facilmente que o que se pretende é o que o falecido embaixador João Augusto de Araújo Castro chamava o "congelamento do poder mundial", ou seja, o congelamento dos níveis de desenvolvimento do planeta nos níveis atuais, cujas desigualdade e injustiça social dispensam maiores comentários. Evidentemente, isso não tem nada a ver com a realidade científica, pois já houve muitos períodos do passado geológico da Terra, até recente, dentro da fase de existência da espécie humana, em que a temperatura atmosférica foi mais alta que a atual, sem que a indústria humana tivesse qualquer coisa a ver com isto.

             A criação do movimento ambientalista internacional foi um dos mais bem sucedidos resultados desse processo de "engenharia social" das oligarquias transnacionais, que o controla de alto a baixo, por intermédio do aparato internacional das ONGs, que elas próprias financiam e, em muitos casos, criaram.

             5) Nenhuma dessas iniciativas teria sido bem sucedida se não fosse pela instituição de uma série de "reformas educacionais", igualmente planejada por aqueles grupos hegemônicos, que resultou no abandono dos currículos de conteúdo clássico e sua substituição por currículos supostamente "profissionalizantes", principalmente no ensino médio. Essas "reformas" foram inicialmente planejadas no âmbito da OCDE, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, foram adotadas nos EUA e daí se espalharam pelo mundo. O resultado final foram sistemas educacionais que nem formavam cidadãos com uma visão ampla da sociedade e do mundo, e nem preparavam profissionais qualificados. E este problema só tende a se agravar se não houver uma retomada dos currículos clássicos, pois como se pode imaginar que, com as rápidas mudanças da base científico-tecnológica da economia que podemos prever para as próximas décadas, como se espera ser possível formar profissionais para profissões que talvez não existam mais daqui a 10 anos, ou que ainda não existem hoje? Um currículo clássico é a única maneira de preparar cidadãos aptos a se beneficiar de um processo de educação permanente, que parece ser a tendência do futuro próximo.

             Embora, como eu disse, esse erro tenha sido cometido em quase todo o mundo, a adoção acrítica dessas "reformas" no Brasil, com os chamados acordos MEC-USAID, foi um dos maiores erros dos governos militares, cujas conseqüências estamos pagando ainda hoje.

             No ano passado, o Movimento de Solidariedade Ibero-americana publicou um livro chamado A educação clássica para um novo Renascimento, no qual nós propomos um grande debate em torno desses assuntos.

             Aqui, vejamos outra evidência de que não estamos discutindo "teorias conspiratórias". Na verdade, essa gente é tão segura de seus propósitos e de sua impunidade que não costuma ocultar as suas intenções. Vejam o que diz o Dr. Alexander King, fundador do Clube de Roma e um dos principais idealizadores das "reformas educacionais", numa entrevista à revista Executive Intelligence Review de 23 de junho de 1981:

             "O Clube de Roma se originou de um sentimento de que o crescimento pelo crescimento não era uma boa coisa... O que foi discutido foi a questão da inquietação educacional, a questão da necessidade de profundas reformas educacionais para tornar a juventude mais sintonizada com o que estava acontecendo, mais sintonizada com as realidades da sociedade. As discussões levantaram a questão da destruição ambiental, a questão da alienação do indivíduo, rejeição da autoridade e outros temas do gênero. Tudo isso surgiu ao mesmo tempo... Nós inventamos toda a questão das reformas curriculares, tentando ensinar matemática, química etc., de novas maneiras. Nós éramos o único grupo que começou a ver a educação em termos do seu impacto econômico... A grosso modo, nossa política era a de que deveríamos estar pelo menos cinco anos à frente do pensamento dos Estados nacionais. Entretanto, nunca deveríamos parecer estar mais do que dois anos à frente."

             Como vêem, a "conspiração" é aberta, como dizia H.G. Wells.

             6) Finalmente, temos o planejamento e a instituição de uma série de estruturas de um "governo mundial", que esses grupos pretendem colocar no lugar dos Estados nacionais soberanos e suas instituições.

             Entre essas estruturas, destaca-se a iniciativa de criação de uma legislação internacional, em torno de temas de grande impacto psicológico, como o desarmamento e a não-proliferação de armas de destruição em massa, o meio ambiente, a proteção dos "direitos humanos", o combate à corrupção e, mais recentemente, a promoção da "democracia". Todos devem estar cientes, por exemplo, que o ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, às vésperas de deixar o ministério, assinou um convênio com a ONG Transparência Internacional para que ela fiscalize a lisura de licitações públicas do Governo brasileiro e das próximas eleições municipais. Ora, essas são funções precípuas de um Estado nacional soberano, que não tem motivos para transferi-las a uma entidade supranacional, não-eleita e que não representa minimamente os interesses da cidadania brasileira. Além disto, se formos ver quem está por trás dela, encontraremos a mesma máfia que está por trás do ambientalismo: a Transparência é ligada às redes do príncipe Philip e o seu pessoal foi recrutado entre ex-funcionários do Banco Mundial e do FMI. Isto não é "teoria conspiratória".

             Aliás, a introdução das ONGs como agentes políticos, em substituição às instituições do Estado nacional é uma parte fundamental desse processo. Não nos esqueçamos de que o nosso presidente da República costuma chamar as ONGs de "organizações neogovernamentais", em lugar de "não-governamentais". A "convocação" da Transparência se insere neste contexto. O mesmo acontece com a participação ativa do Movimento Viva Rio na elaboração da nova política de segurança do País, a chamada "segurança cidadã", que alegadamente deve substituir a antiga "segurança nacional", considerada um conceito ultrapassado dos governos militares.

             Aqui também se insere a falaciosa sugestão de que o fim da Guerra Fria justificaria um processo amplo de "desmilitarização", de redução dos efetivos das Forças Armadas da maioria dos países, principalmente os subdesenvolvidos. Evidentemente, aí não se incluem as forças da OTAN, que cada vez mais vai assumindo o papel de uma "gendarmeria internacional" automobilizável, que não responde nem mesmo ao Conselho de Segurança da ONU, como vimos na recente guerra contra a Iugoslávia. Ontem, foram a Iugoslávia, o Sudão e o Iraque, que, aliás, continua sendo alvo de contínuos ataques aéreos por parte dos EUA e da Inglaterra. Amanhã, talvez o alvo possamos ser nós, sob um pretexto qualquer - por exemplo, não estarmos protegendo adequadamente a Floresta Amazônica ou minorias indígenas.

             Um mito particularmente pernicioso é o do "fim da História", que, sintomaticamente, foi criado por um funcionário do Departamento de Estado dos EUA, Francis Fukuyama (que, aliás, está ficando rico com ele, pois lhe pagam 20.000 dólares por conferência para propagandear essa idiotice). Trata-se da tese de que a chamada democracia liberal seria o ponto final da evolução histórica da Humanidade. Ora, para que alguém admita isto é preciso ser um completo ignorante em História. A História jamais acabará enquanto seus agentes, os seres humanos, continuarem lutando pelo direito ao bem-estar e ao progresso, e ainda estamos muito longe de proporcionar estes direitos a pelo menos uma maioria significativa da Humanidade. Portanto, estamos muito distantes de qualquer "fim da História".

             Vamos agora para a parte final dessa nossa conversa, que, aliás, é a mais importante, pois trata do que fazer frente a desse quadro tenebroso.

             A maioria das pessoas, quando começa a analisar o atual cenário mundial, desanima da possibilidade de se reverter esse quadro de decomposição civilizatória, pois acha que os "donos do mundo" são muito poderosos para serem enfrentados com sucesso. Esta é uma falsa percepção, pois, por mais poderosos que sejam, eles não podem contrariar as leis universais permanentemente. Isto é o que queria dizer Abraham Lincoln, quando afirmou que "pode-se enganar todos por algum tempo e alguns por todo o tempo, mas não se pode enganar todos por todo o tempo". Assim, a pergunta relevante não é "se" podemos reverter essa crise, mas "como" fazê-lo, ou seja, como reverter a "mudança de paradigma cultural" imposta pelas oligarquias transnacionais. Isto, porque a inevitável derrocada dos inimigos do progresso não implica na vitória automática dos defensores da Civilização; será preciso que estes tenham preparado um plano de ação para colocar em prática na hora certa.

             Os chineses, na sua sabedoria multimilenar, qualificam a idéia de "crise" com uma combinação de dois ideogramas: um significa "risco", e o outro, "oportunidade". Portanto, o que temos que fazer é transformar o risco de uma nova idade de trevas na oportunidade de um novo Renascimento, que possibilite uma retomada das expectativas que foram abandonadas anteriormente.

             Para concretizar essa oportunidade, será imprescindível a emergência de uma nova elite, consciente e determinada a retomar, promover e implementar aqueles princípios civilizatórios abandonados. E quando falo de elite, não me refiro propriamente aos que têm maior poder econômico ou político, ou mesmo influência intelectual. Hoje, mais do que nunca, o cidadão de elite é aquele cujas preocupações e ações transcendem o seu universo pessoal e familiar, e se dispõe a atuar em prol da comunidade e até da Humanidade. Ou seja, nós teremos que formar essa nova elite. Cada um de nós deve tornar-se um apóstolo, ou melhor, um guerrilheiro em defesa daqueles princípios civilizatórios. Digo guerrilheiro, porque os inimigos do progresso dificilmente podem ser enfrentados frente a frente; para isso, geralmente, é preciso empregar manobras de flanco e ações de guerrilha. Reuniões como essa são exemplos de ações como as que necessitamos para criar a necessária conscientização e, quem sabe, também a determinação.

             Talvez, o melhor antídoto para essa derrocada civilizatória que estamos discutindo seja a retomada de um conceito que atualmente anda meio fora de moda, o de um projeto nacional, considerado obsoleto nestes tempos de "globalização". Um projeto nacional é exatamente o que necessitamos para promover e consolidar uma retomada da idéia de progresso e do princípio republicano, e o Brasil é um dos países que tem melhores condições para isto, podendo até mesmo influenciar outros países nesta empreitada.

             Um projeto nacional não é uma excrescência ou um exercício acadêmico, como sugerem alguns "globalistas" deslumbrados. Todos os países do mundo que atingiram um nível significativo de desenvolvimento o fizeram com base em projetos nacionais bem definidos e implementados por suas elites dirigentes.

             E como se estrutura um projeto nacional? Independentemente dos seus detalhes específicos, um projeto nacional se baseia em três diretrizes fundamentais:

             1) Harmonia de interesses entre os setores representativos da sociedade.

             2) Igualdade de oportunidades para que todos possam exercer uma verdadeira cidadania.

             3) Solidariedade para com os retardatários do processo. Este é um ponto crucial, no qual é fatal qualquer concessão a conceitos falaciosos como o de "excluídos", tão citado pelo nosso presidente para justificar a sua falta de compromisso com o combate à pobreza e à miséria no nosso País.

             Nesse esforço em prol da Civilização, vale lembrar que nenhuma contribuição é desimportante. Cada um de nós pode dar uma contribuição relevante, por menor que possa parecer. Eu sempre gosto de recordar uma frase do jurista e escritor inglês Edmund Burke, que dizia que o maior erro foi cometido por aquele que nada fez, pois achava que apenas podia fazer muito pouco. Ninguém pode saber se um de nós poderá aportar a contribuição que irá deflagrar o efeito de "massa crítica" da conscientização necessária.

             Antes de encerrar, quero dizer-lhes que nós do Movimento de Solidariedade Ibero-americana temos estado na linha de frente dessa luta pela Civilização há algum tempo, e os convidamos a juntar-se a nós. Temos várias publicações, como um jornal quinzenal e livros, nos quais apresentamos o contexto estratégico global em suas diversas facetas, além de propostas concretas para a superação dessa crise. Eu os convido a conhecê-las e a ajudar-nos nessa luta.

             Obrigado a todos.


    A SOBERANIA E AS FORÇAS ARMADAS

    O EXÉRCITO

    Gen Bda Hélio Ibiapina Lima


             Este o tema proposto. Na época atual, não creio que seja possível proceder a uma análise de operações do Exército, em benefício da DEFESA DA SOBERANIA, independente das outras duas Forças. Elas estarão, quase sempre, irmanadas e coesas, no plano territorial ou extra-territorial.

             Vejamos, em primeiro lugar, as condições indispensáveis para que o desempenho do Exército seja eficaz:

    1 - Território:
    • Extensão.
    • Ocupação.
    2 - População:
    • Proporcionalidade com relação ao território.
    • Organização política.
    • Instrução.
    • Higidez dos contingentes.
    • Aproveitamento, extensivo e intensivo, de cérebros privilegiados.
    3 - Economia:
    • Abundância de recursos, em nosso território, indispensáveis ao apoio logístico às operações militares em defesa da SOBERANIA.
    • Sistema de pesquisas imprescindível à atualização e desenvolvimento do armamento e equipamentos de combate.
    • Existência de eficaz sistema industrial, em perfeito equilíbrio com as necessidades de DEFESA DA SOBERANIA, com apoio de vigorosa espinha dorsal de empresas nacionais.
    • Abundância de recursos energéticos, de toda sorte, para prover o apoio às indústrias e à movimentação de veículos motorizados.
    • Economia forte, diversificada e com expressivo forte apoio de cidadania.
    • Mercado interno com elevada capacidade de consumo.
    • Comércio exterior forte, diversificado, agressivo e com grande credibilidade internacional.
    4 - Força Terrestre:
    • Equipada, armada e preparada para o combate.
    • Elevada confiança em sua eficiência, na liderança de seus Chefes e na importância de suas missões.
    • Cerrado apoio das Forças Naval e Aérea.
    • Elevado PODER DE DISSUASÃO.
    5 - Relações Exteriores:
    • Profissionais, vigilantes, argutas e agressivas.
    • Elevado e arraigado grau de cidadania e confiabilidade em seus Chefes e líderes.
    6 - Vontade Nacional:
    • Impregnada pela TRADIÇÃO, pelo AMOR à PÁTRIA e VALORES da NAÇÃO.
    • Inquebrantável pela consciência da importância dos OBJETIVOS NACIONAIS PERMANENTES.
    CONSIDERAÇÕES COMPLEMENTARES

             Muitos falam em DEFESA DA SOBERANIA e julgam que o assunto se restringe às FORÇAS ARMADAS, isto é: a armamento, equipamento, efetivos, remuneração, previdência, etc. Outros até pensam que é possível um país manter sua SOBERANIA a despeito do desmantelamento de suas Forças Armadas. Todos estão errados. Para que um país possa defender sua SOBERANIA e se fazer respeitar é necessário possuir Forças Armadas com forte poder de dissuasão. Só assim, o inimigo declarado ou em potencial pensará muito, antes de partir para o ataque.

             Não existirá uma Força Armada que garanta a SOBERANIA, se não contar com o apoio de um território, de extensão compatível, rico em recursos de toda ordem, pois a manutenção de uma Força Armada eficiente exige o empenho de recursos que só são possíveis com uma economia forte e equilibrada. Mas o fator mais importante de uma Força Armada é o homem. Para tanto, é imprescindível uma população numerosa, sadia, inteligente, instruída, estruturada, um sistema político que a mantenha coesa, em torno de seus líderes, promova, desenvolva e exalte a cidadania, o amor e respeito à Pátria, que a mantenha integrada aos Valores Nacionais Permanentes. É fundamental mostrar que existe uma VONTADE NACIONAL, agregada a um forte Poder de Dissuasão. Ai entra o Ministério das Relações Exteriores, que deverá ter ação firme, arguta e agressiva. Não é, pois, problema simples, como pensam até mesmo os nossos dirigentes e, muito menos, para ser discutido, superficialmente e esporadicamente, por quem não entende do assunto. É lógico que se trata de problema da maior seriedade e, para tanto, é imprescindível que a NAÇÃO decida o que deseja, de suas Armadas, qual a sua posição com relação à sua SOBERANIA. A solução, fora de dúvida, está no Congresso e, sem qualquer dúvida, a Assessoria Natural e Legítima é das Forças Armadas e jamais de Organizações Não-Governamentais (ONGs), ideológicas, improvisadas e inspiradas em doutrinas exóticas e interesses escusos, ou de partidos políticos sem programa, sem vinculação, sem estrutura política e, ainda menos, de membros cooptados de tais partidos, aos quais a Nação não deve um mínimo de consideração ou respeito. Em poucas palavras é um assunto a ser tratado por quem de direito, com seriedade, coragem e sem traição.

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

             Em assunto de SOBERANIA e DEFESA, as Forças Armadas e portanto o EXÉRCITO não poderão ser postos no desvio, desconsideradas como conhecedoras do problema.

             Disse o Senador GERALDO MELO, no dia 16.06.2000, pela TV Senado: “Não sou eu, Senador, civil que posso dizer às Forças Armadas o que devemos fazer (em DEFESA NACIONAL). Nisso, os especialistas são eles (membros das Forças Armadas)”.

             Será que o ilustre senador sabe que, em matéria de DEFESA, as Forças Armadas, não são ouvidas! Pensará ele, por desconhecimento, que o General Cardoso tem mais direito de falar, pelas Forças Armadas, que eu? Saberá que, pelas Forças Armadas, hoje, poderão falar o Ministro da Defesa, o Ch EM da Defesa, os Comandantes de Forças ou seus respectivos Chefes de Estados-Maiores?

             Quem são as Forças Armadas no pretenso colegiado que define o Plano de Segurança Pública e Nacional? O Gen Cardoso? Terá ele, por acaso, autoridade para tal desempenho?

             Ouvem-se, com freqüência, autoridades brasileiras afirmando que não há possibilidade, para o Brasil, de enfrentar uma guerra! Quem decidiu que a SOBERANIA não será defendida e que a AMAZÔNIA será entregue sem luta? Quem decidiu que a guerra, para a defesa da AMAZÔNIA, é impossível e que vamos entregá-la sem luta? Quem decidiu que a guerra, no teatro amazônico, poderá ser levada por simples mobilização, quando houver necessidade de prolongar a Política pelo recurso extremo, para seguir a VONTADE NACIONAL e sermos SOBERANOS e lutar, pela MANUTENÇÃO de nossa SOBERANIA na selva AMAZÔNICA? Quem definiu de que lado estará o índio se, por incúria, nossas autoridades administrativas permanecerem, como até o presente momento, alheias, omissas e até mesmo hostis, à VONTADE NACIONAL de ocuparmos a FLORESTA, cuidar de defendê-la, tornar os índios cidadãos brasileiros, fazê-los, conosco, defensores da FLORESTA, inimigos dos invasores? Quem definiu que a Força Aérea e o Poder Naval brasileiros, com seus Poderes atuais, permitirão a operação anfíbia de grande envergadura, sem dúvida necessária para defender o território, ao N do rio AMAZONAS, de um inimigo de valor de Divisão de Inf. ou mesmo de uma Brigada modernas, se não cuidarmos de ocupar a FLORESTA? Quem decidiu que o Programa Calha Norte não tem valor, não deve ser continuado, não deve ser incrementado, não deve ser acelerado? Quem decidiu que não há cobiça da AMAZÔNIA por parte dos inimigos tenazes, que há séculos não escondem suas intenções de administrar o vasto território riquíssimo de nosso País, até mesmo afirmando e reafirmando que nossa posse, ali, é irregular, usurpada, não aceitável, pelos povos desenvolvidos?

             Que vemos, senhoras e senhores? Nossas riquezas dilapidadas, nossas posições estratégicas sendo entregues aos estrangeiros, nas mais diversas áreas, muitas delas de fundamental valor estratégico, como a energia (tendendo para 70%), as comunicações (tendendo para 90%), os bancos (com 20% indo a 47% com a privatização do Banespa), nosso comércio exterior sem expansão e sem proteção, a indústria aeronáutica, promissora, também fugindo ao nosso controle, nosso transporte aéreo doméstico e internacional sendo ameaçado! Nossa poderosa indústria siderúrgica fugindo de nossas mãos! Grande parte de nosso subsolo sob administração estrangeira quando, por Lei, nem sequer cidadãos brasileiros podem ser seus proprietários! As Forças Armadas, sob forte pressão, para que assumam funções públicas, no controle: do narcotráfico; dos hordas de sem terras, sem teto, sem emprego, etc; de plantadores de maconha; de entrada de animais doentes pelas fronteiras; etc. Quem tomará, a seu cargo, as missões das Forças Armadas? Onde elas encontrarão os armamentos e equipamentos necessários? Qual seria, então, o nível de treinamento dos Quadros e das Tropas, nessas circunstâncias?

             Que será de nossas Forças Armadas, em face de território com extensão do nosso, com uma população deficientemente alimentada, doente, cansada, mal instruída, desanimada, sem VONTADE? Com os mais inteligentes e sabidos, buscando amparo nos países desenvolvidos?

             Qual o suporte que podem encontrar, em economia, com o nosso estágio atual em que tudo é carência e dificuldade, na administração?

             Qual o Poder de Dissuasão de nossa Força Terrestre? Há alguma importância no Poder de dissuasão? É evidente que sim! É com ele que poderemos evitar a guerra, darmos ao Ministro das Relações Exteriores o Poder de negociação, a garantia do respeito à nossa SOBERANIA, a proteção da vida de nossos soldados e das nossas populações.

             Haverá Poder de Dissuasão, hoje, nas Forças Armadas de países que não possuem petardos atômicos e equipamentos balísticos, acoplados a dispositivos que permitam seu lançamento sobre qualquer objetivo, em qualquer parte do Globo Terrestre a qualquer hora? Quem decidiu, no caso brasileiro, os limites de ação e as possibilidades de se fazer presente no Clube Atômico?

    PALAVRAS FINAIS

             Somos uma Força de mais de 1/2 milhão, na Ativa e na reserva, não incluídos os dependentes. Forças pequeníssima para os 165 milhões de habitantes.

             Confiamos em nossos Chefes e os respeitamos.

             Eles são íntegros, corajosos e competentes.

             As nossas Forças Armadas são eficientes.

             Estamos sempre juntos quando e onde for necessário defender a integridade do Brasil e sua SOBERANIA

             Não buscamos privilégios, mas exigimos respeito.

             Somos especialistas em DEFESA, SOBERANIA e SEGURANÇA

             Nossa colaboração é imprescindível para a SEGURANÇA da Pátria.

             Temos o direito de ser ouvidos!

             Devemos exigir esse direito!

             Ninguém tem o direito de nos discriminar, de nos isolar!


    A FORÇA AÉREA BRASILEIRA

    Brig do Ar Ercio Braga

    SUMÁRIO

    I - CONCEITO BÁSICOS
    II - CONSEQÜÊNCIAS DA DOUTRINA
    III - SIVAM
    IV - MINISTÉRIO DA DEFESA
    V - CONCLUSÃO

    INTRODUÇÃO

             A Missão das Forças Armadas tem seu fundamento básico na manutenção da Soberania Nacional, ou seja, poder decidir sobre o uso ou não de todo seu potencial humano ou material. Para a Força Aérea, sua missão relaciona-se ao Espaço Aéreo Brasileiro, ou seja, o espaço acima do território brasileiro. Poderíamos definir como missão da Força Aérea: ter a capacidade de obter e manter a soberania nacional dentro do espaço aéreo brasileiro. Ou em outras palavras comandar, controlar e coordenar o uso do espaço aéreo nacional atendendo ao interesse nacional e também impedir seu uso quando este fato contrariar tal interesse.

    I - CONCEITOS BÁSICOS

             Desde sua criação, o Ministério da Aeronáutica foi estruturado com base na doutrina de um Poder Aéreo Unificado. Por esta Doutrina, cabia ao Ministério da Aeronáutica comandar, coordenar, planejar e controlar as ações de todos os meios que integrassem o Poder Aéreo. Também como parte da doutrina cabia à Força Aérea a missão de impedir ou destruir qualquer meio aéreo que pusesse em risco a segurança do Território Nacional ou da Nação. Para atender esta doutrina, o Ministério da Aeronáutica foi dividido em cinco áreas de atuação, a saber:

    1 - Força Aérea Brasileira
    2 - Ciência e Tecnologia Aeronáutica
    3 - Infraestrutura Aeronáutica
    4 - Aviação Civil
    5 - Indústria Aeronáutica

             Esta concepção integrava o Ministério da Aeronáutica ao desenvolvimento da Nação, pois preparando-se e preparado para a guerra o Ministério desenvolvia ações, em tempo de paz, que em outros países eram, e ainda hoje são, executadas por outros órgãos de governo. A economia resultante de tal concepção, bem como o sucesso nas diversas áreas, mostrou claramente o acerto de tal concepção. A missão de emprego da força sempre permaneceu ativa e em condições de executar as ações de pronta resposta.

    II - CONSEQÜÊNCIAS DA DOUTRINA

             Em primeiro lugar vamos falar sobre Ciência e Tecnologia. Para se fazer C&T são necessárias:

    1 - ter pessoas com conhecimentos relacionados ao objetivo final;
    2 - a existência de laboratórios onde as pesquisas, relacionadas ao objetivo, possam ser realizadas;
    3 - uma definição clara do objetivo a atingir e seu adequado suporte financeiro.

             Normalmente o objetivo final é a fabricação de um produto ou descoberta de um processo produtivo tais como: um avião de caça, um submarino, um radar, um míssil ou um processo para transformar o óleo de babaçú em combustível de aviação. Definir o objetivo final, ou seja, o que a Organização quer produzir para atender seus interesses, é o mais importante passo e por isso deve ser sempre o primeiro. Para atender a estas necessidades, foi criado, em São José dos Campos, o CTA - Centro Técnico Aeroespacial. A fim de formar uma massa crítica com conhecimento aeronáutico elevado, o Ministério da Aeronáutica criou o ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica que se tornou, desde sua criação, um modelo de Escola e de ensino.

             Para complementar as necessidades da C&T o Ministério criou, também no CTA, os Institutos de Pesquisa onde a massa crítica, formada pelo ITA, podia fazer pesquisa para atingir ao Objetivo colimado.

             Para fechar o ciclo de Ciência e Tecnologia o Ministério, ao final do processo, sempre repassou todo esse acervo de conhecimento para uma Indústria nacional, a fim de que a mesma produzisse, em escala industrial, o produto desenvolvido no CTA, transferindo, desta forma, a tecnologia para a Nação. Foram inúmeros os produtos de sucesso obtidos com essa filosofia: mísseis, radares, rádios de comunicação, motor e turbina a álcool, uso do babaçú como combustível, etc. O ponto alto desta filosofia foi o VLS, Veículo Lançador de Satélites, que já foi lançado da Base de Lançamentos de Alcântara também construída por brasileiros e com Tecnologia Nacional. Tanto o foguete como a Base de Lançamentos formam um ponto de orgulho da Ciência e Tecnologia Nacional. Dos trabalhos corretamente desenvolvidos pelos Institutos de Pesquisa, da reconhecida competência dos Engenheiros formados pelo ITA, foi possível chegar ao objetivo de fabricar um avião, um projeto brasileiro que atendesse nossas necessidades. Surgiu o Bandeirante que mais tarde pressionaria o Governo a criar a EMBRAER. Esta Empresa obteve rapidamente o reconhecimento mundial pela qualidade de seus produtos. Desta forma CTA/ITA atenderam as necessidades da área de Ciência e Tecnologia, e a EMBRAER, a de uma Indústria Aeronáutica. Em ambas as áreas o sucesso é reconhecido mundialmente.

             A terceira área definida pela concepção do Ministério da Aeronáutica foi a de criar e desenvolver uma Infraestrutura Aeronáutica que, dentro de nossa realidade econômica, atendesse as necessidades brasileiras. Pela lógica e pela economia não havia necessidade de criação de dois sistemas para um controle de Tráfego Aéreo, um para aeronaves civis e outro para aeronaves militares.Assim a Diretoria de Rotas, hoje DEPV, controla todas as aeronaves e, juntamente com os DACTA, possui também a capacidade de defesa aérea através da interceptação, utilizando aeronaves de combate da Força Aérea. Foram também criadas as bases compartilhadas onde de um lado da pista encontra-se o Aeroporto e do outro uma Base Aérea. Ainda nesta área, o Ministério criou a INFRAERO, que modernizou os principais aeroportos do país a nível de primeiro mundo, sem descuidar ou abandonar os aeroportos de menor movimento. A qualidade de atendimento e funcionamento de nossos principais aeroportos e a originalidade (única no mundo) do sistema integrado de defesa aérea e de tráfego aéreo demonstram, mais uma vez, o acerto da concepção.

             Na área da Aviação Civil podemos afirmar que o Ministério da Aeronáutica, enquanto representando o governo como órgão concedente, manteve um serviço de transporte aéreo de boa qualidade e eficiente atendimento ao público.Se hoje as Companhias de Aviação estão em dificuldades não perguntem a causa para a Aeronáutica, discutam o assunto com os Órgãos de Governo responsáveis pelas medidas econômicas.

             Infelizmente, devido à não existência de hipóteses de conflito envolvendo o Brasil, a Força Aérea Brasileira foi prejudicada em recursos e não ficou no mesmo nível das demais áreas. A situação crítica em que nossa Força Aérea hoje se encontra deve-se exclusivamente à relação, cada ano, de um orçamento cada vez menor para a Aeronáutica.

    III SIVAM

             Agora vamos falar algo sobre o SIVAM que poderia ser enquadrado na área de Infraestrutura Aeronáutica. O SIVAM, Sistema de Vigilância da Amazônia, teve seus estudos iniciados em 1990. Sua concepção está alicerçada na monitoração ambiental, uso do solo, vigilância e controle de tráfego aéreo, com vistas ao desenvolvimento sustentável da região. De novo reuniram-se as missões de caráter militar com as eminentemente civis que, juntas, propiciam uma economia de meios e de recursos. Todos sabem do enorme potencial que existe na Amazônia e sua proteção é uma questão de sobrevivência nacional.

             O projeto tem órgãos em toda Amazônia, o que representa, sem dúvida, uma ocupação do que é nosso. Previsto para ser concluído em 2002, o projeto irá contribuir para proteção ambiental, controle da ocupação e do uso do solo, vigilância e controle das fronteiras, vigilância e controle de tráfego aéreo, identificação e combate a atividades ilícitas, etc.

             O governo vem mantendo o fluxo financeiro um pouco abaixo do inicialmente previsto, mas esta redução não deve atrasar a conclusão prevista para 2002.

             Um projeto que envolve a aquisição de aeronaves e equipamentos modernos, a construção de sítios por toda a Amazônia, um sensoriamento orbital em convênio com o INPE, uma vigilância ambiental relacionada a queimadas, desmatamentos e enchentes, um sistema de comunicações complexo e completo para toda a região e aquisição de 25 radares para vigilância aérea e meteorologia e que tem um custo total previsto para US$ 1,395 bilhões, valor extremamente inferior aos apresentados nos escândalos financeiros da atualidade.

    IV - MINISTÉRIO DA DEFESA

             Sem entrar no mérito de que o Ministério da Defesa retirou os militares do mais alto nível de decisão do governo, na realidade este Ministério veio para destruir a concepção estabelecida para a criação do Ministério da Aeronáutica. Todos os presentes sabem que a Aviação Civil vai ser controlada pela ANAC, que a INFRAERO e a Base de Lançamentos de Alcântara já estão fora da estrutura do Comando da Aeronáutica e que a EMBRAER, através de artimanhas jurídicas e contábeis, passou para o controle de estrangeiros. Isso demonstra com clareza os reais objetivos da criação deste Ministério. Para completar o sonho destes brasileiros mal-informados, ainda veremos a transferência do ITA para o Ministério da Educação e do CTA para o Ministério da Ciência e Tecnologia. Assim, todas as realizações do Ministério da Aeronáutica em benefício do país poderão transformar-se rapidamente em páginas corridas de nossa história.

    V - CONCLUSÃO

             Quem lucrou com estas transformações e transferências? O que a Nação ganhou com elas? As respostas devem ser dadas pelos brasileiros e patriotas aqui presentes.


    A ADESG PRECISA DO NOSSO APOIO EFETIVO

    V. Alte. (RRm) Sergio Tasso Vásquez de Aquino.

             O Brasil é um grande, rico e abençoado País, "gigante pela própria natureza", com um potencial extraordinário de recursos de toda a ordem, capazes de alavancar o desenvolvimento que faça feliz e realizado o nosso povo, com a garantia da dignidade plena de cada cidadão.

             Os oficiais que participaram da 2a Guerra Mundial, nos campos de batalha e nos céus da Itália e nas vastidões do Atlântico, retornaram ao Brasil com a convicção de que bastava mobilizar e orientar o esforço nacional na direção e no sentido adequados, que os resultados logo se veriam, magníficos.

             Idealizaram, pois, e fundaram a Escola de Altos Estudos, na qual "se estudassem os destinos do Brasil", com vistas a transformar potencial em poder e assegurar Segurança e Desenvolvimento à Nação Brasileira, garantindo-lhe ser senhora dos seus destinos, altiva, respeitada no cenário internacional, justa para todos os seus filhos, soberana e independente. Assim, pois, surgiu a Escola Superior de Guerra - ESG, há mais de 51 anos, formuladora da notável Doutrina humanista, democrática, cristã e brasileira que tem sido o autêntico "Projeto Brasil", tão necessário à realização dos nossos gloriosos destinos e à implantação de justiça, progresso, paz social na nossa Terra.

             Quem freqüentou os Cursos da ESG pode bem avaliar o privilégio que isso representa, tendo certamente ficado cativo e impressionado com a visão de Brasil e de Brasil no mundo obtida, e com o acesso à Doutrina e à Metodologia de Planejamento a ela associada, orientadas para realizar o Grande Projeto Nacional.

             Mas é preciso manter o entusiasmo e difundir a ESG e sua Doutrina para o maior número possível de brasileiros: obras realizam-se com projetos, e estes têm sua origem em idéias. Em tudo, o homem é fundamental, bem como sua adesão a valores, princípios, tradições, compromisso com a Terra, com os Concidadãos e as Instituições Nacionais.

             À Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra - ADESG compete realizar o trabalho multiplicador e difusor, por todos os quadrantes e rincões da Pátria. Bem a propósito, tem, entre seus objetivos, "preservar e projetar os valores morais e espirituais da nacionalidade", "difundir conceitos doutrinários e conjunturais relacionados com a Segurança e o Desenvolvimento Nacionais, observados métodos de trabalho e pesquisas da ESG", além de, naturalmente, "incentivar, cada vez mais, a amizade e a solidariedade entre seus membros".

             A ADESG tem uma importantíssima função, de lutar pelos Objetivos Nacionais, sendo um grande centro de promoção de patriotismo, de ética e de moral, de doação de talentos em proveito do Brasil e dos brasileiros. Para fortalecer-se cada vez mais, porém, precisa da adesão firme e da colaboração efetiva do maior número possível dos egressos dos cursos da ESG ao longo destes 51 últimos anos, de preferência de todos.

             E para viabilizar sua vida administrativa, como toda instituição, necessita de recursos financeiros. Trata-se de sociedade civil, sem fins lucrativos, cujas receitas decorrem dos pagamentos feitos pelos estagiários dos Ciclos de Estudos de Política e Estratégia - CEPEs, realizados por Delegacias e Representações, e das anuidades depositadas pelos efetivamente associados, isto é, contribuintes.

             É sobre isto que lhes venho apelar: ajudem a ADESG a prosseguir em sua senda de serviços ao Brasil!

             Dos cerca de 6.300 possíveis, aqueles todos egressos dos cursos da ESG, estamos reduzidos a cerca de 900 contribuintes! São R$60,00 por semestre, R$ 10,00 por mês... Representam tanto, porém, para nossa luta em defesa do Brasil e dos brasileiros! Daí decorre o pedido que me animo a fazer a todo aquele que foi estagiário da ESG.

             Contribua! Aliste-se entre nós! Freqüente a Nossa Sede, participe das Reuniões de Diretoria, todas as 4as feiras, às 10:00 horas! Venha saber o que pretendemos, o que estamos fazendo! Apóie, mantenha a ADESG "combatendo o bom combate!"

             O Brasil precisa de nós, tudo o que oferecermos à Pátria é pouco! Vamos somar os nossos talentos, multiplicar os nossos esforços e trabalhos!

             Maiores informações poderão ser obtidas na sede da ADESG - Órgão Central: Av. Presidente Antonio Carlos, 375/1201 - Rio de Janeiro - RJ ou pelos tel: (21) 262-6400 - Fax: (21) 220-1351. e-mail: adesg@adesg.org.br.

             Visite nosso site na internet: www.adesg.org.br.

             Para encerrar, mais um convite, desta vez para os egressos dos CEPEs da ADESG. São cerca de 63.000, uma formidável legião que, convenientemente mobilizada, será capaz de grandes feitos, catalisando a grande epopéia de devolução do Brasil ao seu glorioso destino. Você, também, adesguiano, cerre fileiras em torno de sua Delegacia ou Representação. Participe dos seus trabalhos, contribua com sua anuidade!

             O Brasil agradece!


    O PROBLEMA HIDRICO NO MUNDO

    "O Brasil e a Amazônia"

    Dario Mondego
    Presidente da Associação dos Empregados
    de Nível Universitário da CEDAE

            O Planeta

            A Problemática da Escassez Hídrica

            O planeta Terra é coberto por 70% de água, aproximadamente. São cerca de 1.400 milhões de km3 de água. Olhando à distância, como afirmou Armstrong ao chegar à lua, a Terra é azul.
            Entretanto, 97,5% de toda a água do Planeta é salgada. São cerca de 1.365 milhões de km3 de água.
            Para saciar a necessidade do consumo humano, teríamos, em princípio, 2,5 de água doce, o equivalente a 35 milhões de km3 de água. Mas, nesse pequeníssimo percentual, comparado com o todo, há de se considerar que 80% da água doce, cerca de 28 milhões de km3, estão localizados nas calotas polares da Antártida e da Groenlândia. Nos 20% restantes, o equivalente a 7 milhões de km3, temos distribuídos: a umidade do solo e da atmosfera (vapor); reservas subterrâneas profundas de difícil acesso para o uso humano; os rios; nascentes e lagos. Por conseguinte, só é acessível para o consumo humano menos de 0,5% de toda a água doce do Planeta. Pior: nesse percentual, ainda concorrem a irrigação, com 85%; e as indústrias, com 10%, ficando o consumo humano restrito a 5%.
            O ser humano necessita de ingestão diária de dois a três litros de água. O seu corpo compõe-se de, mais ou menos, 70% de líquido que requer reposição freqüente.
            A humanidade dispõe de menos de 7 milhões de km3 de água utilizável para sobrevivência de, aproximadamente, 5 bilhões de pessoas no planeta. Como se vê, o líquido essencial à vida é escasso, com riscos de tornar-se fonte de lucro e poder. Hoje, discute-se a hipótese de que, no próximo milênio, a guerra será pelo domínio das águas.
            Por ser essencial à vida, a água é um bem comum. Logo, não pode ser propriedade de ninguém. É um recurso natural, porém finito e vulnerável. Aliás, nos últimos 50 anos, foi comprovado que está ocorrendo uma redução do recurso da água no Planeta, provavelmente, conseqüência da poluição e constantes agressões humanas aos ecossistemas.
            Comparados os recursos atuais com os dos primórdios da humanidade, nota-se uma redução assustadora.
            Em todo o mundo, apenas a Noruega e o Canadá são mais bem aquinhoados do que o Brasil, do ponto de vista dos recursos hídricos (Os dados não levam em conta a área geográfica). Em quarto lugar, vêm os Estados Unidos, onde a questão, segundo informações que obtivemos, é tão levada a sério que o controle e a proteção dos Recursos Hídricos estão nas mãos do Exército - aliás, o mais bem armado do mundo.

            Comentário

            A Redução dos Recursos Hídricos

             Analisando a situação dos mananciais do Estado do Rio, podemos imaginar, dentro de uma escala, o que ocorre no Planeta, como um todo. No Estado do Rio, assim como no restante do País e do mundo, constatamos um total abandono dos mananciais, onde nascem os rios que formam as grandes bacias hidrográficas, em território fluminense.
            Há agressões aos ecossistemas, com queimadas, desmatamentos, ocupações irregulares com a construção de habitações nas áreas aqüíferas, depósitos de lixo (lixões) às margens dos rios, além da poluição por esgotos, produtos químicos e outros.
            Para explicar o resultado da falta de uma política de proteção dos mananciais, podemos utilizar como exemplo o bairro de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Há alguns anos, muitos pontos nascentes de água, localizados na serra Grajaú - Jacarepaguá desapareceram. Outros como as represas Pau da Fome e de Curicica , têm uma vazão que não dá mais para abastecer, plenamente, como antes, o bairro. Hoje, não fosse a Estação de Tratamento de Água - ETA - do Guandú, que capta água do rio Paraíba do Sul, teríamos no bairro de Jacarepaguá uma situação de abastecimento de água insustentável.
            Por sua vez, as represas de Rio D' Ouro, Xerém, Tinguá, Mantiqueira e São Pedro - situadas nas serras do mesmo nome - que alimentam as adutoras conhecidas como "linhas pretas", também estão com sua vazão bastante reduzida.
            Aliás, todos os municípios e localidades, antes por elas abastecidas, hoje recebem o reforço da Estação de Tratamento de Água do Guandú.

            O Brasil

             O Brasil possui uma das maiores reservas de água doce do mundo - o que eqüivale a 12% de toda a água disponível para o consumo humano no Planeta. Cerca de 80% de toda essa reserva está na Amazônia - onde se encontra a maior bacia fluvial do mundo. Só o volume de água do rio Amazonas representa 16% de toda a água dos rios da Terra. A destacar o fato de que, na Amazônia, vivem somente seis milhões de pessoas. Isso significa que 94% da população brasileira, cerca de 148 milhões de pessoas, dependem dos 20% restantes de toda a água das reservas existentes no Brasil. Vale lembrar que, também, se utilizam desse volume a agricultura (irrigação) e as indústrias.
            Além desse grande volume de água na Amazônia, o País tem, ainda, sob o Nordeste um imenso reservatório inexplorado de águas subterrâneas.
            Mas, apesar dessa abundância, que não abastece os maiores centros urbanos, o governo brasileiro vem gerindo de maneira péssima seus recursos hídricos. Há um desperdício que beira a taxa de 40%. Isto, sem falar que é comum transformar as margens dos rios, lagos e restingas em lixões a céu aberto. A mesma falta de uma política de defesa dos recursos hídricos faz com que os mananciais sejam contaminados por agrotóxicos, metais pesados, petróleo e esgotos domésticos e/ou industriais.

            Megacidades

             O lamentável é que, apesar deste volume de água, o País corre sérios riscos de sofrer uma crise de abastecimento. Crise essa, que já é crônica em parte do Nordeste e de Minas Gerais. Na Região Sudeste, onde encontramos as maiores concentrações urbanas e o surgimento de megacidades, como o Rio de Janeiro e São Paulo, há ameaças de desabastecimento, se não for implantado uma política séria de defesa dos recursos hídricos. Hoje a população da Grande São Paulo á a segunda maior do mundo (cerca de 20 milhões de habitantes). Somente a cidade do México (com 20,2 milhões de habitantes) tem uma população maior. A Região Metropolitana do Rio de Janeiro tem cerca de 11,6 milhões de consumidores.
            O abastecimento da Grande São Paulo depende, basicamente, das bacias do alto Tietê e das represas de Guarapiranga e Billings. Ambas sofrem com a poluição e a ocupação desordenada de suas margens, o que levou as entidades governamentais, ambientalistas e a sociedade civil a se unirem na busca de saídas viáveis para recuperação e proteção desses mananciais. Há projetos de despoluição e de preservação, com financiamentos garantidos pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID - e pelo Banco Mundial BIRD. Esses projetos têm caminhado de forma lenta. Uma das principais dificuldades a resolver é a ocupação irregular, que já abrange cerca de 800 mil pessoas.
            Outro fato polêmico fica por conta da contradição do governo estadual, que seguindo orientação do Governo Federal, quer garantir a preservação dos mananciais para concretizar a privatização do setor energético. Isto quando deveria estar preocupado em defender, com tais projetos, o abastecimento público de água. Em São Paulo, as águas pedem socorro. A continuar a poluição, a Região Metropolitana do Estado terá sérias dificuldades de abastecimento, pois a água dos mananciais do Estado poderão chegar a um nível de intratabilidade tal, que se tornem imprestáveis para o consumo humano.
            Na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, a situação não é diferente. A capital, várias cidades ao seu redor e mesmo às margens do rio Paraíba do Sul dependem basicamente deste manancial para sobreviver. Hoje, no entanto, o Paraíba do Sul é um rio a caminho da morte ! E, como os mananciais de São Paulo, as águas do Paraíba correm também o risco de se tornar em impróprias para o consumo humano.
            E sem o Paraíba do Sul - A Estação de Tratamento de Águas - ETA - do Guandu (a maior do mundo), que abastece a cerca de 10 milhões de pessoas em todo o Estado poderá ser desativada. Isto porque a ETA capta água do rio Guandu, que é um rio artificial, formado pelas águas do Paraíba depois que estas são utilizadas pela Light para a geração de energia elétrica . A ETA do Guandu é responsável pelo abastecimento de 80% da Região Metropolitana do Estado (capital e municípios da Baixada Fluminense).
            Somente na capital do Rio de Janeiro são pouco mais de sete milhões de almas, que não sabem do perigo que as ameaça, se a poluição do Paraíba (principal fonte primária de água potável do Estado) chegar a níveis de intratabilidade. Isto considerando-se que a bacia hidrográfica do paraíba continua a sofrer as conseqüências do despejo de toneladas de esgotos domésticos, resíduos industriais tóxicos, lixo e agrotóxicos, nos trechos paulista e fluminense. Mas, apesar de toda essa carga poluente, o Paraíba do Sul fornece 160 mil litros de água por segundo para o rio Guandu, de onde a CEDAE retira 47 mil litros de água por segundo (cerca de 4 bilhões de litros de água/dia) para abastecer a segunda Região Metropolitana mais importante do País.
            Ou seja, apesar da importância estratégica desta bacia para garantir a sobrevivência do Rio de Janeiro, estranhamente, o Poder Público, seja estadual ou federal, até agora não desenvolveu nenhum sistema de proteção à ela.

            Comentário

            CEDAG/Guandu

             Nos idos anos de 1960, vivíamos no Rio de Janeiro o caos do abastecimento de água. O então governador Carlos Lacerda criou a Cedag, Cia. Estadual de Água do Estado da Guanabara, que viria solucionar aquela crise. Depois da fusão do antigo Estado da Guanabara com o Estado do Rio de Janeiro, a Empresa foi transformada na CEDAE, que hoje presta serviços de Saneamento Básico em praticamente todo o Estado. Foi também no Governo Lacerda que se deu a construção de duas das obras mais importantes da engenharia brasileira - a Estação de Tratamento de Águas do Guandu e o túnel Guandu/Santíssimo/Macacos.
            A água, depois de captada no Rio Guandu (formado pela junção das águas dos rios Ribeirão das Lajes, Piraí e Paraíba do Sul) segue por túneis e canais, por gravidade, até as Elevatórias de água bruta. Dali, é bombeada para a ETA do Guandu. Após o tratamento, uma parte dessa produção é bombeada para o Reservatório de Marapicu, que a distribui para a Baixada Fluminense, Zona Oeste e Zona Norte da cidade do Rio de Janeiro. A outra parte da água produzida na ETA é conduzida por um túnel à Elevatória subterrânea do Lameirão, que fica localizada no bairro de Santíssimo. De lá, a água é bombeada até o topo da serra local e por gravidade, através do túnel canal, até o reservatório dos Macacos, no Jardim Botânico. Este sistema abastece Jacarepaguá, Barra da Tijuca, Zona Norte, Centro, Zona sul, enfim, todo o restante da cidade do Rio de Janeiro.
            A grandiosidade do sistema Guandu é indescritível. Principalmente, o conjunto da elevatória do Lameirão (subterrânea em grande profundidade), e do túnel condutor até o reservatório dos Macacos. A construção do Sistema foi financiada com empréstimos (Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID - e Banco Mundial - BIRD) totalmente pagos pelos usuários, através da tarifa da CEDAE. A contradição é que as mesmas instituições financeiras internacionais que ontem financiaram o sistema, hoje incentivam a sua exploração econômica e financeira.

            As Principais Fontes Poluidoras do Paraíba

             Entre as grandes poluidoras, destacam-se a Indústria Química Resende, a Dupont do Brasil Metalúrgica Barbará e a Usina da Companhia Siderúrgica Nacional - CSN, em Volta Redonda. Sem uma política de proteção às águas, o Paraíba segue por mais de 1.100 Km de extensão, como fonte primária de muitos outros municípios. Entretanto, sem a garantia de sobrevivência do Paraíba do Sul, vamos viver o caos no Estado do Rio de Janeiro.
            É preciso, no entanto, destacar que a ameaça que paira sobre os sistemas de abastecimento de água das Regiões Metropolitanas do Rio de Janeiro e de São Paulo é a mesma que assusta as demais megacidades brasileiras.
            Ou seja, em todo o País, a situação é idêntica. Vivemos um quadro dantesco, preocupante e temível quanto às conseqüências futuras. Daí, a emergência de mobilização para que os Executivos Federal, Estadual e Municipal promulguem dispositivos legais que viabilizem mecanismos de defesa dos recursos hídricos nacionais, livrando-os, inclusive, da exploração irresponsável, que visa ao lucro financeiro. Somente com a implantação de uma política séria, que considere questões como o fim dos desmatamentos, das queimadas, da ocupação irregular das margens dos rios e nascentes, além da punição dos que transgridem essas normas será possível preservar os mananciais nacionais.
            Não se descarta a necessidade urgente de se implantar nos currículos escolares a Educação Sanitária e Ambiental - conscientizaria as pessoas sobre a questão do desperdício, entre outras coisas. É intolerável que a sociedade continue desinformada, desperdiçando água por uso inadequado.
            As pessoas têm que ter consciência da importância da água para a nossa vida e sobre a escassez crescente dos recursos hídricos. Não é mais admissível dizer que se pagamos pelo uso da água, podemos gastar à vontade, podemos desperdiçar. O consumo por desperdício onera o custo operacional e de tratamento da água.
            É preciso entender que o sistema de abastecimento de água funciona como um grande condomínio, onde os usuários são os condôminos que, para receber em casa a água, cotizam-se e pagam o rateio do custo total. As empresas estatais ou os serviços de água e esgotos são administrações condominiais. Os governos estaduais ou municipais são os Síndicos. E quando concordamos com esta colocação, fica claro que ninguém compra água porque "ela não é uma mercadoria", mas sim um bem social, vital e universal.
            Urge essa consciência coletiva, se não, as Leis, Decretos ou Portarias que criam os mecanismos de proteção aos mananciais terão pouca eficácia. Desde as agressões aos ecossistemas, rios, bacias e outras, até a malha fina de distribuição e no domicílio, não há como fiscalizar plenamente para punir o infrator.

            A Legislação Brasileira

            - Decreto 24.643, de 10/07/34 - Código das Águas
            - Decreto-Lei 852, de 11/11/38 - Mantém o código de águas (Decreto-Lei 24.643/34)
            - Lei 5.318, de 26/09/67 - Política Nacional de saneamento/Cria o Conselho Nacional de saneamento - previu o Planasa no Art. 5º
            - Decreto 76.389, de 03/10/75 - Medidas de prevenção da poluição industrial no meio ambiente - Constituição Federal de 1988, artº 21, inciso XIX.

             O governo brasileiro, afinal, no ano de 1997, sancionou a Lei 9.433/97 - Lei dos Recursos Hídricos. Entretanto, até a presente data não a regulamentou.
            Encontram-se em fase da discussão dois Projetos de Lei que o governo deverá encaminhar ao Congresso Nacional, no mês de agosto, próximo:
            - PL que dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Águas - ANA - entidade federal incumbida do controle e da gestão do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;
            - PL que dispõe sobre a gestão administrativa e a organização institucional do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
            No Estado do Rio de Janeiro, a ALERJ já aprovou e o governador sancionou a Lei nº 479-A/95, que institui a Política Estadual de Recursos Hídricos; regulamenta a Constituição Estadual em seu Artº 261, parágrafo 1º, inciso VII.
            Aguarda-se, também, a regulamentação da Lei de Crimes Ambientais e a Lei de Recursos Hídricos, no âmbito federal.
            Com esse conjunto de legislações, aplicadas harmonicamente, teremos uma melhoria sensível na proteção e recuperação de nossos recursos hídricos. Por enquanto, continuamos sem os mecanismos indispensáveis. Entretanto, como já alertamos, há de se incluir o comportamento humano para o uso adequado da água. Até a presente data, tínhamos legislações ligadas ao saneamento básico, ao meio ambiente e à preservação da poluição. Especificamente ligados à água, só o Decreto-Lei que o manteve. Entretanto, já estão ultrapassados no tempo e no espaço, inclusive contrariando a Constituição de 1998 em alguns aspectos.

            As Contradições

            Embora o Presidente da República tenha sancionado, há dois anos, a Lei Federal de Recursos Hídricos (9.433/97) que cria uma política nacional para o Setor, esta ainda não foi regulamentada. E, aí, nos surge uma dúvida. Se o Governo Federal tomou, de fato, a iniciativa, de recuperar, proteger e gerenciar os recursos hídricos brasileiros, às portas da virada do século e do Milênio, por que ainda não regulamentou esta Lei? Com a sua regulamentação, muitos males poderiam ser prevenidos, mas sem ela continuaremos a assistir muitos abusos e práticas criminosas, que colocam em riscos os mananciais nacionais.
            Não há explicação para tanta demora. Sabe-se, no entanto, que o conjunto de legislação que se encontra aguardando regulamentação ou sanção está "em compasso de espera", devido a forte ligação que têm com projetos de privatização do setor energético e do saneamento básico. Ambos têm a água como meio de geração de energia elétrica e de abastecimento de água potável.
            Já vimos o quanto é estratégica a questão da água. Quer pela necessidade humana indispensável, quer pela escassez, quer pelo monopólio que representa.
            Teme-se, no entanto, que a política de globalização traga em si uma grande distorção, transformando a água em uma mercadoria para auferir lucro financeiro.
            O governo alega a impossibilidade de investir R$ 40 bilhões no setor de Saneamento Básico, daí insistir na necessidade da privatização. Mas, quando assim raciocina, esquece que para cada real gasto em Saneamento, economiza-se, pelo menos outros três reais, na área de saúde.
            Outra questão que precisa ser levantada é que esse volume de investimentos é necessário primordialmente nas regiões interioranas do País. Lá, as carências dos serviços de Saneamento são grandes e é onde ocorre a maior incidência de doenças de veiculação hídrica. Primordialmente, é também necessário a proteção e recuperação das bacias hidrográficas brasileiras.
            Aliás, estranhamente, apesar de alegar a necessidade de investimentos no Setor, o projeto do Governo Federal não define que a privatização do saneamento deve ocorrer onde esses investimentos são fundamentais, ou seja, no interior do País.. Pelo contrário, a ordem é privatizar as Regiões Metropolitanas, onde operam empresas públicas , como a CEDAE, e onde os grandes investimentos não são tão essenciais.
            Nessas regiões, já existe uma capacidade instalada, seja pelos sistemas de produção de água, seja pela malha distribuidora.
            Na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, por exemplo, praticamente toda a população recebe água tratada da CEDAE. A cobertura é de quase 100%, à exceção de algumas áreas, ocupadas de forma irregular ou que têm problemas de falta de infra-estrutura urbana (como as favelas, a Baixada Fluminense, a Zona Oeste e Barra/Recreio/Jacarepaguá) que têm alguma dificuldade de abastecimento. Se a CEDAE tivesse autonomia administrativa e financeira, esses problemas isolados seriam resolvidos a curto e a médio prazo.
            O setor de esgotamento sanitário é o que ainda carece de maiores investimentos no Estado. Mas, esse, também, não interessa tanto à iniciativa privada. É, na verdade, incluído como contrapeso no "filet mignon" da privatização dos serviços de abastecimento de água.
            Ao propor a privatização das empresas estaduais de saneamento, o Governo Federal cegou-se quanto ao aspecto humano. E o social foi colocado à reboque do econômico, sendo que a avaliação de resultados das estatais visa somente aos excedentes econômico-financeiros.
            Em junho deste ano, o governo começou a colocar em prática o seu modelo de privatização do Saneamento Básico, cumprindo seu compromisso firmado, no item 27, da Carta de Intenções ao FMI.
            Para ficar esclarecido, a síntese do que ficou acordado com o FMI é que o Governo Federal, através da Caixa Econômica Federal - CEF, compraria em um primeiro momento ações de todas as Companhias Estaduais. E a privatização seria feita em nível nacional, depois do repasse do controle de cada uma dessas companhias para a União. Estados e Municípios receberiam uma parte do dinheiro do repasse, com a condição de aplicá-lo na solução de seus problemas previdenciários. A outra parte seria para lastrear os fundos de pensão dos Estados e Municípios.
            A proposta prevê ainda que a aplicação deste novo modelo de gestão ocorrerá paralelo à discussão da solução legal sobre o poder concedente, além de acordos prévios entre Estados e Municípios.
            Pelo acordo com o FMI, o governo FHC vai entregar o monopólio do Saneamento, certamente ao capital estrangeiro, tendo em vista que o valor é altíssimo para um concorrente brasileiro (cerca de R$ 40 bilhões). A grande contradição é que, embora alegue não ter recursos para investir no Saneamento Básico, o Governo Federal coloca à disposição do setor privado R$ 40 bilhões - ofertados pelo BNDES - para desmontá-lo, com danos ao Patrimônio Público Nacional. Quer dizer, o mesmo valor necessário para investir no Setor e melhorar as condições de vida de milhões de brasileiros é que o BNDES tem para entregar à iniciativa privada.

            Comentário

            Segurança Nacional

             Depois dessa análise, fica difícil aceitar o posicionamento dos governos estaduais, municipais e federal, que insistem na privatização do abastecimento de água - serviço essencial de natureza pública. A simples alegação de que não dispõem de recursos financeiros ofende a inteligência da sociedade brasileira.
            No passado recente, a água era tida como estratégica. Quando em momentos de indícios de sublevação da ordem, as represas e os reservatórios de água eram ocupados pelo Exército, para protegê-los de possíveis ações criminosas de vândalos fanáticos ou loucos, que pudessem colocar em risco o abastecimento público.
            O que mudou? Era descabível aquela preocupação? Não me parece. Continuo entendendo que a questão é de segurança nacional. Essa minha visão corrobora em muito com a minha reação à privatização, independente dos outros fatos, aqui narrados.
            Causa-me um sentimento de insegurança imaginar a entrega desse serviço público essencial de natureza social à iniciativa privada. Esse monopólio poderá ser entregue à exploração de consórcios internacionais, franceses, ingleses, etc., que com certeza, não vão ter a preocupação de preservar os mananciais - que são a garantia de sobrevivência das gerações futuras brasileiras. É verdade, esses recursos tendem a se tornar escassos, até mesmo em um País privilegiado, como o Brasil. Portanto, não devem ser submetidos à exploração econômica na busca especulativa do lucro. De tais recursos hídricos, são dependentes cerca de 160 milhões de brasileiros. E quando os governantes - federal, estaduais e municipais - assumem a postura de venda dessas concessões, na verdade, estão praticando nada mais do que a corretagem de um bem que é vital à sobrevivência humana.
            É momento de conscientização, de desestimular o consumo desnecessário. Consumo este, que pode vir a ser estimulado com a privatização, a fim de garantir o faturamento de empresas nacionais e multinacionais, que querem transformar em negócio o Saneamento Básico no Brasil para satisfazer sua especulação do lucro.
            Nos EUA, berço do mundo capitalista, somente em torno de 20% dos recursos hídricos são explorados pela iniciativa privada. Lá, é o Exército que controla e fiscaliza esses recursos escassos.

            Privatização: em Busca de Recursos Financeiros

             O governo brasileiro considera nas suas estatísticas os números de desassistência no saneamento básico do interior dos estados, o que eleva, em ordem de grandeza, a suposta cifra de R$ 40 bilhões, estimada como déficit sanitário existente naquelas regiões abandonadas.
            Entretanto, o seu projeto de privatização, incluído no acordo de renegociação da dívida externa brasileira com o Fundo Monetário Internacional - FMI (memorando de intenções do Governo Federal, item 25 do documento) não contempla os municípios do interior, uma vez que está voltado para as Regiões Metropolitanas.
            A Região Nordeste, castigada há anos pela seca, por exemplo, pelas propostas do Governo Federal, continuará com os problemas crônicos de sempre de falta de água, ou seja, de seca mesmo. Provavelmente, lá não há para a iniciativa privada expectativa de lucro a curto ou médio prazo. E a longo prazo, essa expectativa pode ser duvidosa. Logo, ao mundo do negócio privado, não interessa. Mas, as estatísticas dessas Regiões são usadas para justificar o projeto de privatização do Setor de Saneamento.
            As Regiões Metropolitanas são mais atraentes, em face do poder aquisitivo da sociedade usuária e, também, porque os investimentos necessários são mínimos.
            Na metrópole, a cobertura plena do abastecimento de água ainda não se deu, em parte, devido ao êxodo rural que faz com que haja uma velocidade muito grande no aumento populacional, principalmente em áreas sem infra-estrutura. Aliás, por isso, não é só o fornecimento de água que está irregular. Há, também, carência de diversos outros serviços essenciais. O IBGE, recentemente, divulgou que a população das favelas no Rio de Janeiro cresceu cinco vezes mais que a da área urbana.
            A implantação de sistemas de esgotamento sanitário têm sido postergados. Na verdade, a construção desses sistemas não rendem frutos eleitorais. É comum ouvir dizer que obra enterrada não ganha eleição. No Rio de Janeiro, essa mentalidade vem mudando, devido aos acidentes recentes ocorridos com o Emissário Submarino de Ipanema, que trouxeram à discussão todos os riscos de contaminação dos esgotos. Soma-se à questão do emissário, o problema provocado pelas valas negras a céu aberto, na Zona Oeste, nos municípios da Baixada e no interior do Estado.
            A falta de sensibilidade ou interesses outros aguçados colocam em risco o saneamento básico no interior do Estado. Isto, se forem concretizadas as intenções de privatizá-lo, aqui, na Região Metropolitana, ainda que de forma fatiada, isto é, por município.
            A CEDAE arrecada em cada município e junta em uma conta global. Há municípios em que o valor arrecadado é inferior ao custo operacional do sistema de abastecimento local.
            Da mesma forma, a CEDAE mantém com a conta global todos os pagamentos das despesas dos municípios conveniados, não discriminando este ou aquele nem tão pouco o aspecto econômico dos seus munícipes. Todos são assistidos igualmente, com vistas às suas prioridades. O homem é a meta. Todo superávit, se houver, é reaplicado.
            Essa prática, tem sido contestada pelos Prefeitos das cidades onde a arrecadação é expressiva. Querem que a arrecadação do município seja aplicada nele mesmo. Visão egoísta, imediatista e insensível. Imaginemos se a arrecadação no município do Rio de Janeiro, responsável por 70% do faturamento global da CEDAE fosse aplicada somente na capital. Os municípios vizinhos, de menor poder econômico, passariam a ter uma assistência prejudicada, correndo-se o risco do ressurgimento de doenças de veiculação hídrica, em face da queda da qualidade da eficácia, da eficiência e da cessação da universalização dessa assistência.
            É preciso entender que não existe ilha de salubridade. Os doentes infectados por doenças de veiculação hídrica, nesses municípios vizinhos, têm o livre trânsito garantido pela Constituição e, certamente, poderiam contaminar os seus irmãos viventes no paraíso vizinho, onde há uma assistência "VIP".
            A privatização do Saneamento Básico na Região Metropolitana, como deseja o Governo Federal, ou de forma fatiada, como querem alguns prefeitos, determinará a redução ou o quase desaparecimento dos recursos do subsídio cruzado. Muitos municípios com situação econômica comprometida não terão condições de bancar o custo desse serviço essencial. Como ficaria a saúde pública da sua população?
            A atual política do Governo Federal impede que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES e a Caixa Econômica Federal - CEF - financiem esses serviços públicos no Brasil. Entretanto, disponibiliza recursos financeiros para os mesmos serviços, se forem privatizados. Esse jogo provoca o sucateamento das empresas estatais e dá ao governo a justificativa, que ele precisa, para privatizar.
            Outro aspecto muito explorado pelo Governo Federal é o econômico. Só visa os excedentes financeiros, como se estivesse falando de uma empresa privada, que apura o lucro e não o superávit.
            O governo quer que as estatais tenham o mesmo perfil econômico, só que os fins, entre elas, são antagônicos. Quer dizer, a iniciativa privada usa o social para atingir o econômico, a estatal, ao contrário, usa o econômico para atingir o social. As estatais convivem em sua atividade diária com fatos imprevisíveis, muitos deles, de ordem social. Os seus custos dependem do resultado operacional final. Isso sem falar nos projetos políticos, que geralmente, vêm revestidos de prioridade, tendo ou não recursos disponíveis. Como pensar, neste caso, em excedentes financeiros?

            As controvérsias da privatização do Saneamento

             A Constituição do Brasil, no seu Artº 26, inciso I, inclui como bens dos estados as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito. O Artº 30, inciso V, também da Constituição Federal, considera como competência municipal os serviços públicos de interesse local. A distribuição da água e a coleta dos esgotos vêm sendo consideradas serviços de interesse local. É um bem natural, que satisfaz a necessidade humana vital. E o esgoto representa risco para saúde humana e para o Meio Ambiente. Depreende-se, então, que não devem ser considerados de interesse exclusivo local municipal, pois tais necessidades humanas de ingestão de água potável e a dejeção são componentes do Saneamento Básico e Ambiental que, como tal, situa-se em todo o território nacional. Portanto,, é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios o Saneamento Básico, nos termos do artigo 23, inciso IX da Constituição Federal.
            Entretanto, há uma disputa pelo Poder concedente entre prefeitos e governadores movidos pelo puro interesse econômico ignorando as raízes profundas do social, a saúde pública e o Meio Ambiente. A meta deles é privatizar a concessão de tais atividades de Saneamento Básico e Ambiental, principalmente nas Regiões Metropolitanas, onde há mais atrativo ao capital especulativo.
            Para se entender melhor, utilizemos o exemplo do que está ocorrendo no Estado do Rio de Janeiro, onde na Região Metropolitana prefeitos e governador se contestam. O Governo Estadual, conforme texto constitucional, tem a água integrada aos bens estaduais. Através da CEDAE, ele construiu os sistemas integrados do Guandu e de Imunana-Laranjal. Tais sistemas abastecem os Municípios da Região Metropolitana.
            Como os recursos hídricos são limitados e sujeitos ao aumento da escassez, cabe ao Governo Estadual balancear a distribuição da água, evitando os abusos com desperdício e o tratamento diferenciado entre os Municípios, atendendo, obviamente, com maior volume, àquele que apresenta a densidade populacional crescente, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Este raciocínio baseia-se, no Artº 25, parágrafo 3º da Constituição Federal, que define a competência do Estado para mediante Lei Complementar, instituir Regiões Metropolitanas, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.
            O Governo Estadual, através da CEDAE, tem assinado convênios com muitos municípios, inclusive na Região Metropolitana, onde todos assinaram o citado convênio de concessão, a fim de que a CEDAE, fizesse a distribuição da água.
            Com o modismo trazido pelo neoliberalismo, globalizando economias, incluindo a privatização, também, dos serviços essenciais, o Estado, na gestão do ex-governador Marcello Alencar, sancionou a Lei do Programa Estadual de Desestatização - PED - e nela incluiu a CEDAE, que mais tarde, devido a uma decisão da Assembléia Legislativa do Estado - ALERJ - foi retirada do Programa. Estimulado pelo Governo Federal, Marcello Alencar pretendia vender os ativos da Companhia, isto é, as ações com direito a voto, que totalizavam 99,9%. Um por cento restante é de propriedade dos empregados, forma, através da qual, a Empresa tornou-se uma sociedade de economia mista.
            Geraram-se os litígios. Inconformados, alguns municípios foram ao Supremo Tribunal Federal - STF - que, até hoje, não julgou o mérito da questão. Paralelamente, o Governo Federal, através do então Senador José Serra, apresentou o projeto de Lei (PLS 226) no qual defende que o poder concedente é dos Estados nas Regiões Metropolitanas. O relator desse PLS no Senado Josaphá Marinho apresentou um substitutivo que define para as Regiões Metropolitanas o poder compartilhado entre Estado e Município. Tal PLS foi por unanimidade, aprovado na Comissão de Constituição e Justiça. Hoje, aguarda leitura no Plenário do Senado, estando ainda fora de pauta.
            Terminada a gestão de Marcello Alencar, ficou para traz essa questão, ainda não resolvida até hoje.
            Insistem alguns municípios em querer se isolar, não para retomarem a gestão municipal de tais serviços de água e esgotos, mas sim, para privatizarem a concessão, rompendo com a gestão pública, executada através da CEDAE.
            Aqui no Estado do Rio, destacam-se o Rio de Janeiro, Niterói, Nova Iguaçú, São João do Meriti, Nilópolis e Belford Roxo, todos integrantes da Região Metropolitana, que é a área de interesse do capital internacional, que a quer, integralmente, e não fatiada como tentam os Prefeitos.
            O Governador, atual, Anthony Garotinho, assumiu o governo com o firme propósito de não privatizar a CEDAE. Mas, hoje, oscila em face da pressão dos prefeitos e do Governo Federal. Entretanto, o posicionamento dos prefeitos não tem sido aceito pela ALERJ, que aprovou a criação de uma frente parlamentar "em defesa da CEDAE pública".
            Por sua vez, o Governo Federal, como prometera ao FMI, no item 27 da Carta de Intenções, já começou a colocar em prática o seu modelo. A Empresa Baiana de Saneamento - EMBASA - a similar da CEDAE na Bahia, foi a eleita para inaugurá-lo.
            Em síntese: Quer o Governo Federal que o poder concedente seja do Estado. Seria mais fácil a privatização da Região Metropolitana, que é o "filet mignon" que interessa ao capital especulativo internacional.
            A CEDAE estava avaliada em R$ 5 bilhões, quando o ex-governador Marcello quis vendê-la. A SABESP, em São Paulo, com a sua atual performance, está avaliada muito acima desse valor. O somatório do valor das 23 empresas estaduais não chega aos R$ 40 bilhões, que hoje o governo não dispõe para o Saneamento Básico e, com certeza, não ficará muito longe de tal valor, negado pelo Governo Federal para atender à sociedade, no âmbito do Saneamento Básico. Apesar dessa contradição, o governo insiste em querer submeter o Setor à exploração econômica liderada pelas empresas francesas Lyonaise d' Eaux e Generale D'Eaux ou pela inglesa Times Whater - especulativa do lucro, sem outra alternativa, por se tratar de monopólio natural, ao qual somos todos cativos.
            Tendo em vista a competência estadual constitucional para proteger os mananciais e o Meio Ambiente (definido no artigo 24, inciso VI da Constituição Federal e no artigo 73, incisos VI, IX e XI; e no artigo 74, inciso VI, ambos da Constituição Estadual) a crescente escassez dos recursos hídricos; o aumento de poluição nos rios e bacias, nas praias e baías; a existência de sistemas integrados de abastecimento de água, com quantidade e qualidade adequada bem como de esgotamento sanitário, cabe aos governos estaduais a gestão pública intransferível, quer para os municípios, quer para a iniciativa privada, dos serviços do Saneamento Básico e Ambiental, para viabilizar um atendimento das necessidades humanas com equidade. Consequentemente, devem os municípios compartilhar com o Estado nessa gestão, compelidos pelo contexto nele envolvidos e em face do que dispõe o citado artigo 23, inciso IX da Constituição Estadual e também os artigos 73, inciso VI e IX e seus parágrafos da Constituição Estadual.
            Sabe-se que há também uma disputa entre empresas nacionais e internacionais. Estas últimas com mais poder de capital para pressionar o Governo Federal, através do FMI, BIRD e BID para aquisição dos ativos da CEDAE em leilão e da outorga total na Região Metropolitana. Esses consórcios internacionais não incluem como área de seu interesse o interior do Estado, em face da real menor rentabilidade.
            As empresas nacionais impossibilitadas de competir fomentam o fatiamento. Isto é, fazer "lobby" junto aos prefeitos para que esses se intitulem o poder concedente, interpretando, dessa forma, o artigo 30, inciso V da Constituição Federal.

            A Globalização

             O mundo capitalista passou a sofrer os efeitos "bumerangue" da globalização. A invasão mútua de mercado gerou uma "autofagia". E para se sustentar diante do risco iminente da concordata ou da falência, o capital optou por algumas mega-fusões. Surgiram, nesse contexto, os "franchising", formando potências econômicas também como proteção contra "a quebradeira".
            Mas, como os riscos continuam acentuados, o capital descobriu os serviços públicos essenciais monopolistas nos países em desenvolvimento da América Latina. O objetivo deste capital é assumir a gestão desses serviços, enquanto a crise atual do capitalismo persiste. Com esta estratégia, o capital consegue conquistar um novo espaço de exploração e auto-defesa.
            A globalização e a progressiva abertura dos mercados vêm ameaçando a gestão pública do abastecimento de água. Hoje, implementam a lógica integradora privada. Com fácil acesso a estudos de mercado sobre o abastecimento global de água, as grandes empresas internacionais do Setor têm como característica comum a política de evitar riscos. Claramente, preferem os projetos que envolvam apenas a gestão dos sistemas integrados de água. As maiores empresas desse ramo são as francesas e inglesas. Elas optam pela operação, em detrimento do financiamento da construção ou da aquisição de posições acionistas. Para elas, operar é mais seguro do que investir em ativos. Essas empresas praticam, também, a política de verticalização do setor, isto é, recorrem às suas firmas de projeto, consultoria, construção e fornecimento de equipamentos e materiais. Com isso, o mercado interno sofre um impacto negativo. Além disso, se houver restrições na fixação no preço de venda da água, elas aumentam a margem de lucro no preço final do produto.
            Pergunta-se: onde o governo está vendo os R$ 40 bilhões de reais de que necessita para o saneamento, com esse perfil dos consórcios internacionais?
            Aqueles consórcios querem o lucro fácil. É explorar e explorar, finalmente, sucatear. Após 25 anos de outorga, o Sr. FHC, certamente, não estará vivo para ver a sua obra final.

            Lucro e Poder

             Para avaliar a importância da Empresa Pública de Saneamento, temos que a CEDAE cobra em torno de R$ 6,00 por 15 mil litros d'água, nas comunidades de baixa renda e cerca de R$ 26,00 pela mesma quantidade, aos usuários com maior poder aquisitivo. Em um ano, aproximadamente, essa diferença (que subsidia a classe mais pobre) chega a R$ 200 milhões. Justifica-se, em razão do aspecto social, pois a água é indispensável ao consumo humano, independente de cor, credo ou classe social. Não há visão mercantilista do lucro.
            Fazendo-se um exercício matemático, pode-se mostrar a diferença entre o social e o econômico, quando se compara a água mineral que é mercantilizada, com a água potável produzida e distribuída pelo governo. Vejamos:

            Governo(CEDAE)

            15.000 litros = R$ 26,00
            1 litro = +/- 4 copos
            15.000 litros = 60.000 copos
            60.000 copos = R$ 26,00

            Água Mineral

            Copo = R$ 0,50
            60.000 copos x R$ 0,50 = R$ 30.000,00
            52 copos = R$ 26,00

             Cinqüenta e dois copos de água mineral estão para a iniciativa privada, assim como 60 mil copos de água potável estão para o governo. Em ambas as situações, o custo é de R$ 26,00.
            É claro que os custos de produção são inigualáveis, já que o governo tem que produzir água de qualidade, aduzi-la e distribuí-la, através de um grande sistema integrado.
            A partir desta contestação, surge uma indagação: Nós usuários (cativos e contribuintes) desse grande monopólio condominal (sem fim lucrativo), podemos acreditar que a iniciativa privada, gerindo as empresas de Saneamento, priorizaria as questões sociais e a saúde pública?
            Claro que não! As regras econômico-financeiras do mundo privado, que garantem a sobrevivência desse tipo de empreendimento, exigem o cumprimento de metas para atingir um lucro crescente. E lucro econômico-financeiro não combina com lucro social.
            Temos que no Setor de abastecimento de água, não há concorrência. É um monopólio natural. Portanto, entregá-lo à iniciativa privada é uma temeridade. Acrescente-se, a discussão dos problemas: o consumo certo e indispensável; o estímulo ao aumento deste consumo e a submissão a que todos ficaríamos a um empresário ou a um consórcio privado. Teríamos um poder independente dentro do Poder Público. Falar de Agências Reguladoras, deixa-nos desconfiados, tendo em vista o fraco desempenho da ANEEL e outras.

            Conjecturas

             Os recursos hídricos são escassos no mundo. Dentro dessa escassez, diferente do Oriente Médio e do norte da África, onde há uma desproporcionalidade entre população e disponibilidade hídrica, no Brasil, temos uma das maiores reservas de água doce do mundo para o consumo humano, o equivalente a 12%.
            Provavelmente, nesta questão reside a cobiça dos que especulam com a água. Nosso país, dado o seu potencial hídrico, é filão apetitoso para quem deseja drenar lucro explorando o consumo da água.
            Sabemos que os consórcios internacionais têm exatamente esse perfil, ou seja, querem a exploração do lucro fácil. Não é difícil de se imaginar que o seu "marketing" será para consumir e consumir. A forma não importa. Pode desperdiçar, porque a água será mercadoria logo comprada. Quem não tiver recursos ou melhor poder aquisitivo não poderá comprar a água. E aí? Com a provável orgia de consumo, praticada para auferir o lucro, como ficam as nossas reservas, que têm limites e são fontes esgotáveis?
            O próprio governo, no texto de sua legislação, que aguarda regulamentação, dá ênfase ao pagamento do uso e da exploração dos recursos hídricos, sem diferenciar o uso industrial do consumo humano, sendo este atendido através de empresas públicas. Esses custos, somados ao preço da água a ser vendida pela iniciativa privada, se o setor for privatizado, vão, com certeza, onerar a sociedade. Quais seriam os parâmetros de volume a serem explorados ? Neste caso, é preciso chamar a atenção para o risco que pode representar a exploração econômica dos mananciais.
            Por outro lado, é provável que a privatização do Setor seja feita em bloco. Depreende-se, então, que o capital internacional terá o monopólio das águas (na superfície e subterrâneas) do extremo norte ao extremo Sul. Não é tradição do Brasil a boa fiscalização. Pior, o poder econômico será sufocante, aliado ao FMI, a quem o Brasil se submete toda vez que precisa resolver as mínimas questões.
            O Brasil e os países da América Latina, devido ao seu endividamento externo, são dependentes do capital internacional. Os consórcios interessados em explorar o abastecimento de água no Brasil representam esse capital. São poderosos e serão os senhores das águas. Quando todas as fontes se esgotarem (se esgotarem!), aqueles impérios terão condições para pagar os altos custos das técnicas de tirar o sal da água do mar, para torná-la potável ou, então, rebocar "icebergs" das calotas polares para o abastecimento nos países que puderem pagar, à semelhança do petróleo que vem em barris. Será que nesse cenário virtual, teríamos como saciar a nossa sede, ou morreríamos sedentos na América Latina. Para exemplificar, hoje, o que poderia ser entendido como um quadro virtual já é real. O Canadá já exporta água para o Oriente Médio. Cobra, pelo barril de água o triplo do preço de um barril de petróleo.

            Conclusão

             A globalização, que é o escudo desses consórcios internacionais, que vão aos países pobres ou subdesenvolvidos explorar, economicamente, o bem comum essencial à vida - a água - um autêntico monopólio cativo, só ampliou, no mundo, as desigualdades sociais. Segundo o Relatório da ONU, " a primazia dos mercados concentra poder e riqueza em um grupo seleto". O fenômeno, se é que podemos assim considerá-lo, deu prioridade a aumento de lucros, mas os avanços não foram igualmente distribuídos entre os povos. É nesse estilo que estaremos, em breve, sendo explorados, economicamente, para saciarmos a nossa sede e enriquecê-los.
            Sentiremos saudades, se tal acontecer, do tempo em que, com todas as mazelas dos sistemas públicos de abastecimento, éramos felizes. Isto, até que um dia um cidadão, nosso compatriota, resolveu incluir nas negociações com o FMI, os nossos recursos hídricos que, certamente, logo foram aceitos porque a nossa escassez ocupa uma prateleira de oferta acima da prateleira da escassez deles. O Relatório da ONU sobre Desenvolvimento Humano deste ano afirma que "aproximadamente, 1,3 bilhão de pessoas no mundo não tem acesso a água potável". Só não ficou claro, se por ausência desse recurso hídrico ou por falta de recursos financeiros para adquiri-la e saciar a sede. Pergunta-se: por quê os poderosos consórcios dos países ricos não vão socorrê-las?
            Agora, difícil é acreditar no discurso do Sr. FHC de que os consórcios viriam, aqui, investir recursos para solucionar as carências brasileiras de abastecimento!


    ESCOLA DE CIVISMO

    Edson Schettine de Aguiar

             Hoje, a política da Força Terrestre é "abra as portas do seu quartel" e por isso, todas as questões que envolvem a Comunicação Social são de interesse direto do Gabinete do Comandante do Exército, General Gleuber Vieira, que, em reiteradas manifestações, enfatiza a sua importância.

             Na verdade, o Exército Brasileiro há muitos anos vem se preocupando com a Comunicação Social, tanto que mantém um curso no Centro de Estudos de Pessoal (Forte Duque de Caxias), com professores altamente qualificados, preparando quadros para as suas missões de melhor integração com a comunidade.

             Realmente, o trabalho do professor José Gaspar Nunes Gouveia, com participação de oficiais do Estado Maior do Exército, já afirmava, em 1967:

    • O Exército precisa do apoio do público para que possa cumprir a missão que lhe cabe.
    • O povo tem o direito de saber tudo, compreendido dentro dos justos limites da segurança nacional;
    • A eficiência máxima do Exército só é alcançada quando conta com a devoção integral dos seus componentes.

             As mudanças no sistema de ensino da nossa juventude prejudicaram o aprendizado sobre os heróis da Pátria e, ainda, sobre as missões das Forças Armadas.

             E como dizia Aristóteles: "Não se ama aquilo que não se conhece".

             Apesar de 82% população dar credibilidade ao Exército e às demais Forças (IBOPE - março/00), há ainda dificuldades a serem vencidas pelas Relações Públicas no seio da opinião pública: apatia em relação aos assuntos militares; sentimento de economia sobre os gastos operacionais; desconhecimento da população, dos assuntos ligados ao Exército e, particularmente, ação social cívica e moral praticada pelos seus integrantes; desinteresse dos políticos pelas Forças Armadas e a idéia falsa de que o Exército poderá entrar em ação, da noite para o dia, tornando desnecessária a cansativa demora e a dispendiosa preparação prévia.

             Convidado pelo General de Exército Alcedir Pereira Lopes, Comandante Militar da Amazônia, proferi recentemente a palestra inaugural do "Simpósio Regional de Comunicação Social do CMA/2000", em Manaus, sobre "Relações Públicas e o Exército".

             A tônica do Seminário foi de integração, pois ao lado das considerações sobre as "Operações Psicológicas no Exército", pelo Major Wallace, assistimos a conferências magistrais, tais como a do Professor Walmir Albuquerque Barbosa, Reitor da Universidade do Amazonas, sobre "A mídia e a Sociedade Brasileira". O Coronel Harada mostrou a importância do Tema "A Internet e a Intranet na Comunicação Social do Exército"; a 1ª Tenente Márcia Albuquerque, profissional de Relações Públicas, analisou, com propriedade, o "Plano de Comunicação Social do Exército"; e Vera Waissman, da Fundação Getúlio Vargas, com o tema "Marketing Institucional", concluiu o Simpósio. Parabéns ao Exército, ao General Alcedir, Comandante do CMA e ao General Cesário, Chefe do Ccomsex, pois o nível de integração entre civis e militares, tanto conferencistas, como assistentes, foi excepcional.

             Cem inscritos entre civis e militares, sendo que alguns destes últimos provenientes das regiões mais longínquas do Brasil, pois são os guardiões das nossas fronteiras com os países irmãos.

             Conhecendo o trabalho do Centro de Comunicação Social do Exército, que há cerca de vinte anos vem desenvolvendo um elogiável esforço no sentido de divulgar as realizações da Força Terrestre, infelizmente desconhecidas pela mídia e grande parte da população brasileira, senti-me gratificado pelo nível de interesse que encontrei, tanto em oficiais e sargentos, como , também, entre os civis: professores, pesquisadores e estudantes.

             No Simpósio, lembrei a figura do Pacificador - Duque de Caxias - com a sua pregação do entendimento e reconciliação entre os irmãos, usando as armas da tolerância após as refregas fratricidas em nosso país. Enfatizei a importância da palavra básica das Relações Públicas - a compreensão. Complementei com o preâmbulo da Constituição de 1988 que afirma estar a sociedade brasileira comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

             Paralelamente e antes de minhas considerações já havia tomado ciência da qualificação de nossas tropas, adestradas e preparadas, especialmente, nas unidades de Infantaria (das Armas a rainha...) de Selva para desenvolver e defender, adequada e inteligentemente, a vasta região correspondente à metade no nosso País.

             Oportuna foi a realização do Simpósio, pois este é o momento para se mostrar ao grande público a importância do Exército ser forte, capaz, operacional e confiável. Não só em função de movimentos revolucionários em países limítrofes, na Região Amazônica, como nas reais ou, apenas, infundadas informações de incursões em território brasileiro. Entendo também que, atendidas as regras de segurança, é necessário mostrar a atuação do Exército, ou melhor, das Forças Armadas na Amazônia e a sua importância, não só na preservação de nossa soberania, mas também na assistência às comunidades. Na realidade, naquela região o Exército Brasileiro bem justifica a sua Idéia - força: "Braço Forte, Mão Amiga". A Força Terrestre vem atuando, há muitos anos, fundamentalmente, nos pelotões de fronteiras no resguardo das comunidades amazônicas. Não só no campo militar mas, essencialmente, na solidariedade e assistência a pessoas que vivem à míngua de recursos e isoladas na selva. O Exército, em tais comunidades, é a própria vida.

             É necessário mostrar cada vez mais que a Comunicação Social é instrumento gerador de motivação, fator multiplicador do poder de combate e incentivadora da coesão, além de grande ferramenta facilitadora da ação de comando. O Exército tem o dever de mostrar a opinião pública que é uma grande escola de civismo. É o que a juventude brasileira está precisando.


    ENGENHARIA DE VALORES

    Tercio Pacitti

             No mês passado, a Academia Nacional de Engenharia comemorou dez anos de existência realizando o 1º Encontro Nacional de Engenharia. Notei um consenso geral entre os participantes. Foi de que, acima de toda tecnologia atual e emergente, existe um outro tema de altíssima prioridade, que engloba também outros setores da vida nacional. Seria a implantação de uma engenharia de valores, neste país.

             Em outras palavras, todo avanço desenvolvimentista da sociedade, em especial o da ciência e tecnologia, deve vir acompanhado, com alta prioridade, por uma educação séria, de qualidade, bem orientada, não cartorial, sem slogans, partidários e com uma forte dose de valores comportamentais.

             Em última chamamos, no nosso jargão, uma engenharia de valores. Afinal, somos engenheiros! E tudo isso por quê? Por causa do paradoxo "quanto mais avanço tecnológico mais problema"; "quanto mais recursos, menos soluções para nossas dificuldades".

             Os líderes, os políticos, os profissionais e os indivíduos que compõem uma Nação, deveriam ter padrões de valores comportamentais consentidos, da mesma maneira que a informática exige imperativamente padrões (standards), para poder existir a portabilidade, a conectividade, a produtividade e os protocolos de comunicação comuns a todas as plataformas diferenciadas do sistema informático. Caso contrário a sociedade, assim como o sistema de informática, tornar-se-ia um caos. Não funcionaria.

             Sem padrões comportamentais consentidos, as pessoas se isolam, não interagem, não se comunicam, o coração endurece e a ética do sistema é superada pelos interesses imediatos.

             Todo grande projeto nacional ou privado deve ser acompanhado de um sério sistema educacional como parte integrante de uma engenharia de valores. Caso contrário, por mais inteligente ou bem concebido que seja o projeto, não terá grandes possibilidades de ser aplicado ou bem executado. Fica só no papel.

             Sinas de mentalidade atrasada são: a corrupção, o nepotismo, a irresponsabilidade, a impunidade, os crimes hediondos, a falsidade, a violência, a criminalidade, a frouxidão, o corporativismo egoístico, o imediatismo econômico, o consumismo, o enriquecimento ilícito, o desrespeito pela realidade do contexto social, o "levar vantagem" em tudo, a vaidade, o exibicionismo, em suma, a falta de seriedade na busca dos objetivos pessoais e nacionais.

             E parece que grande maioria de nossa sociedade está anestesiada com todo o presente contexto, em especial a dita elite nacional, nada fazendo para implantar mudanças comportamentais. Não sou exceção.

             Incluo-me também como um produto da sociedade que aí está.

             E de quem é culpa? De uma herança educacional e cultural de valores colonialista que recebemos, salvo raras exceções, isto é, uma mentalidade atrasada cheia de erros, distorções, desvios comportamentais que recebemos em nível de escola, família, religião e outras instituições. Não é suficiente mudar os dirigentes e as pessoas, pois a mentalidade continua a mesma.

             O desnível educacional, cultural, a enorme discrepância da distribuição de renda, o desemprego, a falta de oportunidades condignas são apenas conseqüências desta mentalidade atrasada, colonialista. A população alienada boa e cordial, porém ainda não se livrou desta chaga. A pequena elite esclarecida, e beneficiária desta situação, pouco faz para erradica-la, pois não abre mão de seus privilégios.

             Posto isto, o que fazer? Como se livrar desta mentalidade atrasada e distorcida e criar-se uma nova mentalidade para o nosso país?

             Não existe, na minha opinião, uma solução democrática a curto prazo. Á forca, ou por regime autoritário, ninguém mais deseja. Por força de novas leis não funciona, pois na hora de aplicá-las os valores herdados distorcem a aplicação.A lei sempre deixa brechas, buracos por onde os ratos podem passar.

             Que futuro estamos deixando para nossos filhos e netos? Que cada família pense bem nesta ultima questão. O que fazer?

             Em minha opinião, só existe uma tentativa a longo prazo, como foi dito: uma educação séria. Entretanto, também todos nós podemos gritar, incentivar, criar, conclamar pais e avós, ou uma outra maneira que não consigo visualizar agora, e apelo ao leitor, para despertar a implantação de uma engenharia de valores, principalmente nas escolas básicas, na família, na Igreja, temas que todos os homens de bem e sensatos conhecem: noções do dever, consciência, amor à pátria, honradez, integridade, cooperativismo, civilidade, constância, poupança, bom investimento, heroísmo, responsabilidade individual, filantrópica, "estar bem com a vida e com Deus", "homens que não se vendem" e ensinar que devemos contribuir para a sociedade, mesmo não colhendo os frutos antes de embarcarmos na espaçonave do além. Os referidos temas poderiam ser estudados, conscientizados na família, na escola, e nas instituições beneméritas. Os nossos sucessores farão melhor para este país o que hoje não conseguimos fazer, pois não fomos devidamente preparados para isso.

             Em se tratando de educação acompanhada da sociedade para o desenvolvimento econômico nacional, modernamente citam-se muito os novos tigres asiáticos. Permitam-me apenas citar um artigo tigre do século XV. Lembro-me o ressurgimento da oprimida e atrasada. Escócia, dominada pelo império inglês, quando John Knox bradou e implantou "uma escola para cada paróquia".Desta maneira a Escócia tornou-se mais respeitada e soberana.Esta possivelmente foi uma atitude parcial para não ser engolida pela "globalização" total da época, se assim podemos chamar.

             A história também mostra que uma nação, ou império, se desestrutura quando a base ética de seus dirigentes degenera. O povo, quando não bem-educado, imita os maus exemplos.E podemos ir um pouco mais longe.Estes temas encontram-se no livro de Provérbios, no Sermão da Montanha e nos Dez Mandamentos, contidos na Bíblia desde muitos séculos atrás.

    TERCIO PACITTI é ex reitor do ITA.


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